Cândida Cristina: Uma carta aos agressores de mulheres no Brasil

Assustadoramente, os números apontam que o Brasil é o quinto país em morte de mulheres em todo mundo. Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, a cada 8 horas uma mulher é morta, simplesmente pela condição do gênero ou pelo ápice da violência doméstica já instalada no âmbito familiar ou na relação íntima de afeto.

Por Cândida Cristina Coelho Ferreira Magalhães*

Machismo

Porém, os números ainda não alcançam a verdadeiro mapeamento, haja vista que o crime de violência doméstica é extremamente subnotificado por inúmeras razões. Logo, a condição de violência é ainda mais grave e latente.

Indubitavelmente, os fatos e as estatísticas demonstram que ser mulher é viver em riscos constantes, um estado de guerra ao qual nos sentimos ameaçadas a todo tempo, somos consideradas objetos, constantemente assediadas, violentadas e violadas até nas garantias mínimas, inclusive, mortas pela condição do nosso gênero. Definitivamente, ser mulher dá um frio na alma e um medo valente de transpor tudo que nos aprisiona.

Escrever uma carta com destinatário certo, Agressores e Feminicidas de mulheres, é um sentimento atemporal, esperançoso e revolucionário que chega e faz a alma falar em nome delas:

Meu nome é Mulher, sou brasileira, guerreira, sonhadora, inteligente, determinada, sem idade ou classe social definida. Sou autora da minha própria história e com ela sigo fazendo com total legitimidade nas minhas escolhas.

Apesar de morar no país tão violento contra as mulheres, meu corajoso manifesto chega ao “pé do ouvido” dos agressores de mulheres e minha voz ecoa em alto e bom som:

Venho por meio dessa carta contar que vocês são frutos da sociedade patriarcal e mero reprodutores de um machismo estrutural, desigual e excludente, com profundo reflexo na sua masculinidade. São roubados do melhor presente da vida… A arte de serem apenas sensíveis! Desses que choram, abraçam e respeitam mulheres, crianças e homens.

O sistema enganou vocês, senhores agressores, ao induzirem que seriam “donos das mulheres” e sob todas exerceriam o fraco poder do machismo, pois a falsa sensação de domínio não se mantém no tempo e tampouco serve-lhes de defesa, pois mulheres sabem voar.

Saibam que a violência contra as mulheres não é uma forma de controle e sim um crime tipificado pela Lei Maria da Penha desde 2006. Todas as formas de violência descritas no corpo da Lei podem até lembrar o passado, mas não são toleradas com nenhuma normalidade, pois todos os tipos de violências – física, moral, patrimonial, sexual e psicológica – são violações de direitos humanos.

Portanto, agressores de mulheres, parem de visitar os jardins imaginando que as flores serão aliadas da sua forma de dominação, pois alternância de agressões e flores é um mero reforço do ciclo da violência. Aprendam com os homens o velho ditado: “Em mulher não se agride nem mesmo com uma flor”. Exijo o respeito das minhas decisões. O ”não” de uma mulher é o limite do basta até aqui, simples assim!

Não se engane a respeito do amor. Esse sentimento não mata por ciúmes nem aprisiona o coração. Muitos dizem, como se fosse refrão de música: “Se não for minha, não será de mais ninguém. Matarei por amor”. A ideia de posse sobre nós, mulheres, é a tênue sensação de pertencimento perpétuo e objetificação dos nossos corpos. Não há delitos passionais nem romantização da morte de mulheres.

Desde 2015, o nome desse crime é Feminicídio, ocupa o rol dos hediondos com pena de até 30 anos de prisão. Portanto, amor é vida e respeito…

Importante ressaltar-lhes que, já há algum tempo, deixamos as tranças de rapunzel, abandonamos os sapatinhos de cristal e não mais aceitamos sermos despertadas do sono profundo por beijo roubado. A desconstrução da imagem de um príncipe encantador deu lugar a liberdade e aos sonhos.

Logo, não se trata de um pedido de socorro, mas uma exigência que os direitos humanos das mulheres sejam inatingíveis e preservados. Que se permitam uma profunda reflexão e uma ruptura com as velhas construções para o nascimento de um homem apenas humano.

Basta de violência! A vida nos pertence…


* Cândida Cristina Coelho Ferreira Magalhães é advogada e consultora jurídica