Da deputada federal Perpétua Almeida (PCdoB-AC) para Manuela d'Ávila

Em texto no Facebook, a deputada comunista acreana relembra a trajetória de convivência com Manuela na militância e no parlamento.

Manuela d´Ávila

Por que lutamos?

Leia o livro da Manu! Parte desses motivos estão lá…

A Manu costuma dizer para nós, que fomos deputadas com ela, “meninas, juntas, no parlamento, vocês me ensinaram que nós, mulheres, podemos ser quem nós quisermos”.

Mal sabe a Manu que, nós outras, as mais velhas, Jô Moraes, Jandira Feghali, Vanessa Grazziotin, Luciana Santos, Alice Portugal e eu, aprendemos muito com ela, a mais jovem. Eu, em especial, aprendi muuuuuito mais.

Manu não sabe, mas desde que sua Laura nasceu e eu a vi percorrer o Brasil e o mundo com aquela menininha no braço, algo dentro de mim ganhou eco. À medida que Laura crescia e aumentava uns quilinhos, eu ia tirando alguns outros quilinhos de “peso das minhas costas”. Aliás, era um peso quase que insuportável, uma culpa eterna, dessas que só mãe tem, porque eu me culpava, já que vivia levando Maíra para as reuniões do partido, para as greves, manifestações… Tem uma foto linda nossa, no impeachment do Collor, em cima de um caminhão, cara pintada – minha mãe viu, levou pra casa, emoldurou e botou na parede dela. Procuro por essa foto até hoje.

Ah, eu me culpava porque gostava de ouvir música ao vivo, MPB. Daí Edvaldo e eu levávamos Maíra para o bar (os amigos brincavam que quando Maíra crescesse ia andar com um colchão pra deitar onde chegasse). Isso porque eu levava um travesseiro, colocava a capa mais linda que tinha, chegava no bar, pedia duas cadeiras a mais, organizava a caminha da nossa “indiazinha”, deitava-a cuidadosamente para não acordar e ali ela ficava até irmos pra casa. Mas, voltando a minha culpa, ela existia também porque eu tinha colocado minha filha cedo demais na creche, ela não tinha nem um ano.

O fato é que eu tinha dois empregos (naquela época podia acumular contratos diferentes. Hoje não pode mais). Eu já era servidora da Educação, trabalhava à tarde e tinha passado também no concurso do Banacre para trabalhar pela manhã. Nem sempre se arruma a “pessoa certa” para confiar a ela nossos filhos, se é que pra nós, mães, existe essa pessoa.

Tem mais, eu me culpava quando não podia levar Maíra nas viagens quando presidi o Sindicato dos Bancários. As eternas perguntas: será que está tudo bem com ela? Dormiu? Comeu? Fez a tarefa? Será que abandonei minha filha? E por aí iam as dores emocionais, as culpas que, como diz Manu no livro, “isso não é casual, não é uma escolha. É uma imposição”. Imposição da sociedade machista que tudo joga nas costas das mulheres: as responsabilidades, as dores, as culpas eternas…

Mas aprendi contigo, Manu, que está tudo bem levar os filhos para onde precisar levar, que minha filha estava mais segura comigo, sob meu olhar, sob meus cuidados, pois o “meu cuidar” é amor incondicional. Aprendi também, Manu, que está tudo bem por não ter conseguido levá-la nas viagens, deixando-a com outra pessoa.

Preciso te confessar, Manu, que um dia, depois de ver você em cima de um palanque, linda, voz firme, microfone numa mão e Laura na outra, fui para frente do espelho e disse para essa eterna mãe que pulsa dentro de mim: sim, sim, sim, está tudo bem, eu fiz o melhor que pude, eu dei o melhor de mim. A filha que eu coloquei no mundo é a mulher mais extraordinária que eu conheço! A minha menina “tornou-se mulher”, como dizia Simone de Beauvoir. A Maíra é uma profissional admirável. E vejo Laura crescendo assim, nas suas fases, tornando-se mulher.

E já deixo claro aqui para o Pablo, o nosso Pablito, não ficar enciumado, que ele também tornou-se homem, um homem incrível!! Até hoje lembro de Jô Moraes lá no nosso apê, entre uma taça de vinho e outra, conversando com ele, orientando-o, explicando sobre como nunca ser machista. E ele aprendeu, viu, Jô?

Manu, acredite, muitas outras mulheres como eu, olhando pra ti, tão jovem mãe mas ao mesmo tempo com tanta desenvoltura no exercício da maternidade, devem ter sentido a mesma sensação boa que eu senti.

Ah, Manu, eu também nunca tinha pensado no fato de que “feminismo é o contrário da solidão”. De que “feminismo é uma jornada de amor…”. “Porque feminismo é a ideia amorosa de que é possível construir um mundo onde homens e mulheres sejam pessoas. Com igualdades sociais, políticas e econômicas”. Li no teu livro, aprendi mais essa contigo. E achei extraordinário!

Mais uma para ficar registrado para aquelas que não sabem se são feministas ou não, que não sabem se querem ou não ser: há bem pouco tempo eu também não sabia e cheguei a afirmar em rodas de conversas: “eu não sou feminista, eu sou feminina”. Ah, quer saber? Eu acho que sou tudo isso aí e muito mais: feminina, feminista. E tenho consciência que as experiências da vida vão nos transformando e nos fazendo rever e atualizar certos entendimentos.

Uma certeza eu já tenho: quero todos os dias ser menos machista e ser mais amor, mais solidária, mais companheira. Quero ignorar menos o jeito de cada mulher viver a sua vida porque quero que na minha vida haja mais sororidade.

Perpétua Almeida
DeputadaFederal
PCdoB-AC