Ex-ministro, advogado do PCdoB no STF, pede acato ao Estado de Direito

O ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardoso, que dividiu com o advogado Fábio Tofic, a defesa do PCdoB na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 54 em julgamento nesta quinta-feira (17), no Supremo Tribunal Federal (STF), contra a prisão após a condenação em segunda instância, lembrou aos ministros da Corte que o país vive no Estado Democrático de Direito e como tal deve ser respeitado.

Por Iram Alfaia

Plenário STF - Rosinei Coutinho/STF

Pelo avançado da hora, o presidente do STF, Dias Toffoli, encerrou a sessão pouco depois das 18h e convocou nova para a próxima quarta-feira (23) quando usarão a palavra mais amici curiae (terceiros interessados) e os representantes da Procuradoria Geral da República (PGR) e Advocacia Geral da União (AGU).

Na sessão falaram o ministro relator Marco Aurélio Mello, os advogados dos autores das três ADCs e alguns amici curiae.

Além da ADC 54 do PCdoB, O STF examina as ADCs 43 e 44 do Patriota e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), respectivamente.

Os partidos e a entidade querem que o STF reconheça a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP) pelo qual “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. O dispositivo está “umbilicalmente ligado ao artigo 5º inciso LVII da Constituição.

Caso as ações sejam acatadas pelos ministros, um dos beneficiados pode ser o ex-presidente Lula, preso político condenado em segundo grau no processo do Tríplex, do Guarujá (SP).

Defesa

“Senhores estamos no Estado de Direito e como tal vamos respeitá-lo”, enfatizou José Cardoso, para quem não há outra interpretação para o que está escrito como trânsito julgado. “Podemos gostar ou não gostar da Constituição, mas é como está escrito e devemos esse respeito a Constituição que juramos defender”, disse o ex-ministro.

Ele defendeu que esse dispositivo garante o Estado Democrático de Direito. “A expressão não foi colocada por acaso (…) foi para garantir a dignidade da pessoa humana e liberdade”, disse. Lembrou que o trânsito julgado é a garantia do direito até quando o STF não puder se pronunciar.

José Cardoso também se dirigiu aos ministros declaradamente contra as ADCs. Ele refutou os argumentos segundo os quais a manutenção do entendimento colabora com o fim da violência, ilicitude e impunidade.

“Com cinco anos de experiência como ministro, sei que o principal problema da violência está no sistema prisional. O crime é comandado de lá. Não temos unidade que permita a mínima recuperação. É entrar lá e sair destruído”, disse.

Para os que acreditam que haverá soltura de presos em massa, caso sejam deferidas as ADCs, o ex-ministro diz que o sistema tem como resposta a prisão preventiva. “Se as pessoas apresentam risco predam preventivamente”.

No seu entendimento não é acabando com direitos e trancafiando as pessoas que o problema será resolvido. “Estamos falando de vida destruídas, quem tiver dúvida visitem os presídios”, afirmou.

Fábio Tofic disse não ser verdade que os demais países admitem prisão após segunda instância. Citou os casos de Portugal e Itália onde as constituições estabelecem prisões somente após o trânsito julgado.

Segundo ele, a presunção da inocência até o trânsito julgado foi uma resposta ao período pós-guerra e ao trauma vivido nos regimes totalitários. “Era preciso constitucionalizar o processo penal”, lembrou.

Relatório

Antes de começar a leitura do relatório sobre as três ADCs, o ministro relator Marco Aurélio Mello, ironizou os boatos de que ele passou mal. “Ao fim, ressuscitado. Hoje pela manhã, me disseram que estaria num hospital, entubado e que já teriam chamado o padre para a extrema-unção”, disse ele.

No relatório, o ministro fez um resumo do histórico dos processos desde quando chegaram a Corte. Também fez questão de falar sobre a liminar que concedeu derrubando em todo o país a prisão após condenação em segunda instância.

Nesse ponto, ele criticou o ministro Dias Toffoli por ocasião da derrubada dela cinco horas depois. “O presidente é coordenador e não superior hierárquico dos colegas de plenário”, disse.

“É inconcebível visão totalitária e autoritária no Supremo. Os integrantes ombreiam, apenas têm acima o colegiado. O presidente é coordenador e não superior hierárquico dos pares. Coordena, simplesmente coordena, os trabalhos do colegiado. Fora isso é desconhecer a ordem jurídica, a Constituição Federal, as leis e o regimento interno, enfraquecendo a instituição, afastando a legitimidade das decisões que profira. Tempos estranhos em que verificada até mesmo a autofagia. Aonde vamos parar”, criticou.

No final, entidades dos defensores públicos do Rio de Janeiro e São Paulo chamaram a atenção para o fato de que a prisão após condenação em segunda instância fere garantias fundamentais e “têm o condão de aumentar o encarceramento das pessoas mais pobres”.