PS tem vitória expressiva em Portugal; PCP faz balanço

O primeiro-ministro António Costa e seu Partido Socialista (PS) conseguiram uma vitória expressiva nas eleições realizadas neste domingo em Portugal, aumentando a sua presença no Parlamento para um número próximo da maioria absoluta.

Portugal

O resultado significa que o PS pode precisar apenas de mais um partido para formar uma coligação de governo, tendo a opção de desfazer a união informal entre as siglas de esquerda conhecida como “Geringonça”, que governou o país nos últimos quatro anos. As informações são do jornal El País.

Em seu discurso de vitória, Costa sinalizou disposição para negociar a manutenção da coalizão, com um PS mais forte. Ele afirmou que sua responsabilidade ao buscar formar uma coalizão é conseguir “estabilidade no horizonte da legislatura” e assegurar condições de governar ao longo de quatro anos. “Essa eleição mostrou que os portugueses gostaram da ‘Geringonça’ e desejam a continuidade da atual solução política, agora com um PS mais forte”, afirmou, entre risos. “Vamos ver se é possível, porque o PCP (Partido Comunista Português) já disse que o quadro é diferente, e o Bloco (de Esquerda, outro partido) também. Vamos ver.”

A participação do PS deve aumentar de 86 para 106 deputados, número próximo da maioria de 116 representantes, no Parlamento de 230 assentos. Com isto, o partido não mais necessitará dos votos de dois partidos — o Bloco de Esquerda (BE) e o Partido Comunista Português (PCP) — tendo mais opções de aliança para alcançar uma maioria.

O resultado à 1h da manhã local, com 4 assentos por definir, indicava 36,65% dos votos e 106 assentos para o PS; 27,9% e 77 deputados para o Partido Social Democrata (PSD), de centro-direita; 9,67% e 19 cadeiras para o BE; 6,46% e 12 eleitos para a aliança entre o PCP e os Verdes, chamada Coligação Democrática Unitária (CDU); 4,25% e 5 parlamentares para o centro- direitista Centro Democrático Social (CDS); e 3,28% e 4 nomes para o Pessoas-Animais-Natureza (PAN), sigla ecológica de centro-esquerda.

Os partidos de esquerda somados não conseguiram ter mais de dois terços dos assentos no Parlamento, necessários para mudanças constitucionais. Em teoria, o PS poderá escolher entre o BE e o CDU para governar.
O PCP exigiu o aumento dos gastos do governo, incluindo iniciativas como um aumento salarial geral de € 90 por mês, um aumento do salário-mínimo dos atuais € 600 para € 900 durante o próximo mandato e a anulação da reforma trabalhista imposta pela troika (BCE, Comissão Europeia e FMI) ao governo do PSD em seu mandato de 2011 a 2015.

Já o BE listou quatro prioridades a negociar, após o resultado: acabar com os cortes da troika que ainda existem na legislação laboral; garantir um serviço de saúde totalmente público; proteger serviços públicos, inclusive com a promessa de não privatização do sistema de correios; e recuperar o investimento público, sobretudo nas áreas de habitação, transportes e emergência climática.

A presidente do BE, Catarina Martins, deixou aberta “uma solução de estabilidade”, com o atendimento destas condições e uma aliança estável, ou então “a realização de negociações ano a ano” com o PS. Disse ainda que o BE estará disposto a negociar “caso a caso”. Questionada se estaria disposta a fazer um acordo com o PS sem anuência do PCP, ela afirmou que “é prematuro colocar essa questão”.

A abstenção foi estimada em 45,57%, o maior índice já registrado em eleições legislativas, superando os 43% de 2015. O resultado provocou mudanças nos partidos. Após o centro-direitista CDS passar a quinta força política do país, sua presidente, Assunção Cristas, anunciou que deixará o posto.
Os sociais-democratas do PSD saíram-se melhor do que o esperado, provavelmente por conquistarem votos do CDS. O resultado acima das expectativas fez seu presidente, Rui Rio, dizer que o resultado do partido é “praticamente idêntico ao que foi em 2015” e que ele demonstrou ser a única força de oposição no país.

Três outros novos e pequenos partidos, de forte expressão em redes sociais, devem conquistar entre um ou dois assentos cada — a Iniciativa Liberal, a “esquerda antifascista” Livres, que elegeu a primeira deputada negra da história de Portugal, e o Chega, de extrema direita e de inspiração bolsonarista. Os partidos também tiveram mais de 50 mil votos e terão acesso a verbas públicas em suas próximas campanhas.
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O PCP divulgou um pronunciamento do presidente do partido Jerónimo Souza e esta nota:




Sobre as eleições legislativas de 6 de Outubro de 2019

1. Os resultados conhecidos traduzem, ainda que com alterações de posicionamento e expressão eleitoral entre as forças políticas com representação na Assembleia da República, um quadro parlamentar com uma relação de forças semelhante ao de 2015.

Mas esse facto não ilude que a esta actual arrumação de forças no plano institucional corresponda uma conjuntura política distinta da de 2015.

Ficou claro nestes anos que foram importantes os passos dados na defesa, reposição e conquista de direitos, no seguimento da interrupção da acção de um governo e de uma política de desastre nacional com a decisão então tomada pelo PCP e o PEV de contribuir para uma solução institucional que fizesse corresponder à derrota imposta no plano social e eleitoral ao governo PSD/CDS a sua derrota política, fazendo gorar planos para prosseguir e intensificar a ofensiva que os PEC e o Pacto de Agressão haviam inscrito como orientação para o futuro da vida do País e do povo português.

Mas ficou igualmente claro que as medidas negativas que se evitaram e os avanços verificados, não são suficientes para a resposta necessária aos problemas nacionais e à concretização dum Portugal desenvolvido e soberano.

A situação do País e a sua evolução nos últimos anos, sem desvalorizar a luta por novos avanços e para os tornar realidade coloca hoje, com mais força, a necessidade de abrir caminho a uma política que rompa com opções essenciais da política de direita que, apesar de condicionados pela composição parlamentar da legislatura que agora termina, o PS não abandonou e em aspectos estruturais prosseguiu.

O que a resposta plena aos problemas do País reclama é que se rompa com os interesses do grande capital colocando a valorização do trabalho e dos trabalhadores como objectivo central e se rompa com a submissão ao Euro e às imposições da União Europeia afirmando o direito do País a um desenvolvimento soberano.

O que hoje se coloca como inadiável é a inscrição de uma política alternativa, patriótica e de esquerda, que um governo do PS não está em condições de assegurar.

O que se impõe é andar para a frente, não permitir que o que se alcançou e conquistou em direitos e rendimentos volte para trás, que não se dêem novos passos de retrocesso quer na legislação laboral, quer no sistema eleitoral, quer nas chamadas “reformas” estruturais que PS e PSD partilham em diversas áreas.

Nada obsta, a que como aconteceu ao longo de décadas e de sucessivas legislaturas, o Presidente da República, ouvidos os partidos, indigite o primeiro-ministro, se forme governo e este entre em funções.

Será em função das opções do PS, dos instrumentos orçamentais que apresentar e do conteúdo do que legislar que a CDU determinará, como sempre, o seu posicionamento, vinculado aos compromissos que assumiu com os trabalhadores e o povo, decidido a dar combate a todas as medidas negativas, a todos os retrocessos que o PS queira impor.

Assim como continuará a tomar a iniciativa e a intervir para fazer aprovar medidas que valorizem a vida e os direitos dos trabalhadores e do povo e a contribuir para a aprovação de medidas que significam avanço.

Correspondendo aos compromissos que assumimos com os trabalhadores e o povo, inscreveremos como objectivos imediatos a luta pelo aumento geral dos salários e do salário mínimo nacional para 850 euros, pelo aumento geral e real do valor das pensões de reforma, pela garantia de creche gratuita para todas as crianças até aos três anos, pelo direito à habitação com garantias dos arrendatários e construção de habitação pública, pelo reforço de verbas dirigidas ao reforço do transporte público, pelo reforço do investimento em falta no SNS e nos serviços públicos, por 1% para a cultura, pela garantia da protecção da natureza, do meio ambiente e do equilíbrio ecológico.

2. O resultado obtido pela CDU – traduzido numa redução da sua expressão eleitoral e do número de deputados eleitos – constitui um factor negativo para o futuro próximo da vida do País.

Não se pode, entretanto, ignorar que este resultado é obtido no quadro político e ideológico que já havia estado presente nas eleições para o Parlamento Europeu e que se traduziu na expressão eleitoral então verificada.

O resultado da CDU é inseparável de uma intensa e prolongada operação de que foi alvo, sustentada na mentira, na difamação e na promoção de preconceitos, que não se limitou apenas a apoucar e denegrir a CDU, como favoreceu metodicamente outras forças políticas, e amplificou elementos de distorção e mistificação do papel e da acção do PCP e do PEV na fase da vida política nacional da última legislatura.

Só a dimensão da campanha eleitoral construída com o empenhamento militante dos activistas da CDU, só o patente reconhecimento da sua acção e a confiança depositada em quem não trai compromissos, só a profunda ligação e enraizamento que as forças da CDU têm junto dos trabalhadores e do povo permitiram, na actual conjuntura, resistir à erosão eleitoral até patamares que alguns haviam inscrito como inevitáveis e vencer a poderosa campanha desencadeada pelos centros do capital monopolista e dos instrumentos ao seu serviço.

Com este resultado da CDU os interesses dos trabalhadores e do povo saem enfraquecidos, e as perspectivas de defesa e conquista de avanços de direitos e rendimentos alcançados pela intervenção decisiva da CDU saem diminuídas.

A CDU cá estará, como sempre esteve, honrando os compromissos com os trabalhadores e o povo, dando força à sua luta, contando com a mobilização de todos, mesmo os que não tendo compreendido que o que era verdadeiramente decisivo nestas eleições era reforçar a CDU, mais cedo que tarde compreenderão que é com esta força que contam.

A CDU e as forças que a compõem, cá estão e estarão para fazer frente aos projectos de intensificação de exploração, para com os trabalhadores e o povo defender direitos, para com a sua intervenção e luta combater retrocessos e contribuir para uma vida melhor.

Será, como sempre, a luta dos trabalhadores e do povo que será chamada a impedir retrocessos e a contribuir para avançar.

3. Nestas eleições sublinha-se a perda significativa registada por PSD e CDS, que se acrescenta à derrota que já tinham sofrido nas eleições de 2015, em si mesma inseparável da reafirmada condenação das responsabilidades recentes na política de retrocesso social e declínio económico que impuseram ao País, não significa por si que os projectos associados à política de direita, e à agenda que lhe está associada, esteja derrotada.

Como a CDU sempre sublinhou e preveniu, o caminho de avanço em direitos e de combate a retrocessos exigia não apenas a recusa de uma maioria absoluta ao PS mas também, e tão decisiva como esta condição, o reforço da CDU e do peso dos deputados por si eleitos.

4. A CDU saúda os muitos milhares de portugueses que com o seu voto deram uma contribuição decisiva para a acção de esclarecimento e mobilização para o voto na CDU.

A todos quantos deram o passo de transformar o seu apoio e reconhecimento pelo percurso de seriedade e coerência da CDU em expressão de voto, designadamente a todos os que o fizeram pela primeira vez, a todos eles reafirmamos o nosso compromisso de sempre de honrar a palavra dada, de intervir em defesa dos trabalhadores e do povo, dos seus direitos e aspirações.

Todos podem contar com a CDU para estar ao seu lado na defesa dos seus interesses e para com eles construir uma vida melhor.

A CDU saúda os milhares de activistas que, lado a lado com os candidatos, ergueram a campanha de esclarecimento e mobilização que contribuiu para a construção do resultado da CDU. Uma campanha que constituiu um factor de elevação da consciência dos trabalhadores e do povo para enfrentar as muitas lutas que assegurarão que não se ande para trás, para resistir às tentativas de novas ofensivas contra direitos e para prosseguir a luta pela construção de uma alternativa política, patriótica e de esquerda, que garanta um Portugal com futuro.