Especialistas dizem que que violência aumentará no Equador

A truculência do presidente equatoriano, Lenín Moreno, com seu estado de exceção no Equador pegou de surpresa grande parte da população equatoriana.

Equador

Para analistas ouvidos pelo jornal O Globo, a resposta agressiva aos protestos e à paralisação do setor de transportes pode agravar ainda mais a tensão social causada com a adoção de medidas de austeridade, dentre elas, o fim do subsidio à gasolina.

Nesta sexta-feira, Moreno chamou os organizadores de golpistas, polarizando ainda mais a situação. “A tendência é que isso se agrave, afetando inclusive a legitimidade do governo, que assim mostra que não quer negociar com a sociedade”, avalia Fábio Borges, professor da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila). “Muitas vezes o governo central se descola demasiadamente da população e tenta, à força, implementar políticas de ajustes sem negociar com os grupos sociais. É péssimo para a democracia e para o desenvolvimento do país.”

Até agora, pequenos grupos estudantis e parte do movimento indígena já começaram a aderir às paralisações, segundo o jornalista equatoriano Luis Vivanco, do La Posta. Nesta sexta-feira, no entanto, as manifestações baixaram de intensidade e militares conseguiram controlar parte das principais vias. Para Vivanco, a declaração de um estado de exceção serviu para que o governo ganhasse tempo.

“É uma ferramenta utilizada para ter mais respaldo jurídico para usar as Forças Armadas e controlar as vias. Podemos discutir se era necessária neste momento ou não, já que o país não está em grande comoção. Mas a declaração de um estado de exceção deu ao governo uma ferramenta mais rápida de ação”, afirma.

Menos visibilidade

Um professor do Instituto de Altos Estudos Nacionais do Equador, que preferiu não se identificar, segundo O Globo, acredita que a resposta de Moreno nos próximos dias será crucial. “Neste momento, o governo está polarizando demais o tema, radicalizando a resposta, o que pode levar a um efeito contrário. Ou seja, satanizando os dirigentes da paralisação e aumentando a repressão, Moreno pode acabar causando mais protestos”, afirma. “Por outro lado, se conseguir gerenciar a crise, baixar as tensões e negociar, poderá resolver a questão em poucos dias.”

Ao acusar os organizadores da paralisação de golpistas, Moreno indiretamente associou os manifestantes a apoiadores do ex-presidente Rafael Correa. Mas as reformas anunciadas por ele não desagradam apenas ao setor de transportes — até agora a fase mais visível da crise.

Além do fim dos subsídios, o pacote de “reformas” fiscais e trabalhistas afeta também setores mais formais da economia, como o funcionalismo público e, em médio prazo, pode levar à contração do mercado, com menos ingressos e salários mais baixos, afirmam os analistas, segundo O Globo.

“Em seu discurso, o governo põe a questão de transportes como a principal, mas há interesses de outros grupos envolvidos no pacote de reformas, como estudantes universitários e funcionários públicos”, explica o professor do Instituto de Altos Estudos Nacionais do Equador. “Se posta em prática a outra parte do pacote, com menos visibilidade, ela vai influenciar a capacidade de compra em médio prazo, e os negócios tendem a diminuir. Por isso, vários setores urbanos tendem a se mobilizar.”

Apoio da mídia

Os especialistas também não acreditam que um golpe de Estado esteja, de fato em curso. Mesmo que uma pequena parte dos manifestantes queiram sua saída, Moreno tem, atualmente, grande respaldo dos meios de comunicação, privados e estatais, além dos grandes setores empresariais do país.

No Equador, o uso do estado de exceção foi relativamente comum durante as décadas de 1990 e no início do ano 2000. À época, protestos de rua derrubaram três presidentes durante o caos econômico anterior ao governo de Rafael Correa (2007-2014). Nesse período, a economia equatoriana cresceu a uma média de 4%.

Agora, as medidas adotadas por Moreno consolidam uma série de “reformas” neoliberais econômicas — muitas a mando do FMI — que vêm sendo feitas pelo governo desde que Moreno assumiu o poder, em 2017.

“Vale lembrar ainda que não é uma crise exclusiva do Equador na região. É preciso chamar os grupos sociais para negociar e renegociar os acordos com investidores internacionais. Tratamentos de choque rápidos como esses podem não só desestabilizar a sociedade, mas a economia como um todo, gerando pressões inflacionárias incalculáveis em todos os setores”, diz Borges.