Quem é Ricardo Salles, o ministro devastador

O processo de destruição da Amazônia, que atingiu seu ápice durante esta semana com o aumento exponencial das queimadas, e que vem chamando a atenção de todo o mundo, assusta, mas não deveria surpreender. 

Por Ivan Longo*

Ricardo Salles (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

O presidente Jair Bolsonaro, que se elegeu prometendo acabar com áreas de preservação ambiental, nomeou para o ministério que cuida da área uma espécie de antiambientalista.

Ricardo Salles, que já foi filiado ao DEM e ao PSDB, tendo sido secretário do Meio Ambiente do governo de Geraldo Alckmin (PSDB), em São Paulo, e secretário pessoal do próprio tucano, tem um histórico que descredenciaria qualquer pessoa para assumir o Ministério do Meio Ambiente do país que possui a maior floresta tropical do mundo. Não na “nova era” de Bolsonaro.

Renegado pelo próprio partido, o Novo, pelo qual foi candidato a deputado federal na última eleição, e alvo de um pedido de impeachment da Rede, Salles tem tentado, assim como Bolsonaro, se esquivar da responsabilidade pelo aumento de 278% do desmatamento na Amazônia em julho de 2019 e pelas crescentes queimadas na região desde que assumiu o ministério, mas seu perfil faz jus à “tragédia anunciada” que o mundo todo volta os olhos agora.

Saiba o porquê.

Pregou o assassinato de sem-terras e pessoas de esquerda

Durante sua campanha para deputado federal em 2018, pelo partido Novo, Ricardo Salles sugeria o assassinato de sem-terras e de pessoas de esquerda de maneira explícita.

Seu “santinho” de campanha prometia “segurança no campo”, em um claro apoio aos latifundiários, usando a imagem de uma munição de revólver como solução.

Condenado por fraude ambiental

No final do ano passado, o ministro do Meio Ambiente foi condenado em primeira instância por – pasmem – fraude ambiental. A acusação do Ministério Público é que Salles, enquanto secretário do Meio Ambiente de Alckmin, fraudou mapas de um decreto para beneficiar empresas que atuam na várzea do Rio Tietê. Ainda cabe recurso.

Investigado por enriquecimento ilícito

Em julho deste ano, o Ministério Público de São Paulo abriu um inquérito para investigar suposto enriquecimento ilícito de Salles.

De acordo com o MP, o ministro teve um enriquecimento atípico entre 2012 e 2017. Em 2012, quando foi candidato a vereador pelo PSDB, ele declarou à Justiça Eleitoral R$ 1,4 milhão em bens. Na última eleição, quando foi candidato a deputado federal pelo Novo, declarou R$ 8,8 milhões, um estranho aumento de 335%.

Mentiu no currículo

Em artigo de defesa das privatizações publicado na Folha de S. Paulo em 2012, o então desconhecido Ricardo Salles colocou em sua mini-biografia, ao final do texto, que era mestre em direito público pela Universidade de Yale, nos Estados Unidos. O título, no entanto, não passa de uma mentira.

Ao site de The Intercept Brasil, a universidade desmentiu o atual ministro. A mentira, no entanto, antes de vir à tona, foi reproduzida na maior parte das entrevistas e aparições públicas que Salles fez desde que o artigo da Folha em que aparece com o título de mestre foi publicado.

Com a repercussão de que havia mentido, Salles se justificou dizendo que a menção à Universidade de Yale em seu currículo teria sido um erro de sua assessoria.

Desmontou o Conama

Em maio deste ano, já como ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, promoveu uma verdadeira destruição do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama): cortou 77% dos conselheiros do órgão e o reformulou de acordo com seus interesses.

Antes composto por 96 integrantes – entre entidades públicas e ONGs –, o Conama passou a ter 22 conselheiros, e o governo federal passou a ser o protagonista do órgão.

Para entidades e especialistas, trata-se de um desmonte na área de preservação ambiental.

Perseguição e demissão do presidente do ICMBio

Em abril, durante uma reunião com ruralistas, Salles fez ameaças explícitas contra funcionários do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Ele disse que processaria os agentes por não terem ido ao encontro. O problema é que o evento era em um sábado, fora do horário de expediente, e os servidores sequer haviam sido convidados. A ameaça foi filmada.

Com a investida de Salles contra o ICMBio, poucos dias depois, o presidente do órgão, Adalberto Eberhard, pediu demissão do órgão.

Quer rever unidades de conservação

Em maio deste ano, reportagem do jornal Estadão apontou que Salles pretende rever as 334 unidades de conservação que existem atualmente no Brasil.

Em entrevista, o ministro disse que quase 190 unidades de conservação teriam sido criadas pelos governos petistas “sem nenhum tipo de critério técnico”. A consequência, afirmou Salles, é que hoje elas “acumulam passivos de indenização e conflitos fundiários”. “Vamos acabar com isso”, disse.

Gerou a demissão do diretor do Inpe e quebrou o Fundo Amazônia

Diante da divulgação dos dados que mostram que o desmatamento na Amazônia havia crescido 278% em julho de 2019, em comparação ao mesmo período de 2018, Salles, em consonância com o presidente, articulou a demissão do diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe), Ricardo Galvão. O governo afirma que os dados são mentirosos.

A demissão de Galvão e a postura de Salles frente ao Ministério do Meio Ambiente fez com que a Alemanha e a Noruega decidissem suspender o repasse de R$ 288 milhões para o Fundo Amazônia destinados a projetos de preservação ambiental.

Quer privatizar monitoramento do desmatamento na Amazônia

Antes da demissão do diretor do Inpe, incomodado com os números sobre desmatamento, Salles informou que pretende privatizar o monitoramento da Amazônia, até então feito pelo Inpe, que é um órgão reconhecido internacionalmente.

A ideia do ministro seria trocar o monitoramento de desmatamento do Inpe pelo da empresa paulista de geoprocessamento Santiago & Cintra, que neste ano já esteve ao menos duas vezes no ministério para tratar do assunto.

Tentou processar a Fórum e perdeu

Em junho, Tribunal de Justiça (TJ) manteve decisão da juíza Daniela Dejuste de Paula, titular da 30ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo, em primeira instância, e deu ganho de causa à Revista Fórum em ação judicial movida por Salles.

“Basicamente, ele alegou que esses veículos teriam divulgado matérias inverídicas e difamatórias a respeito dele. Mas, na verdade, são reportagens que tratavam da atuação dele na época em que era secretário do Meio Ambiente do estado de São Paulo, na gestão de Geraldo Alckmin (PSDB)”, explica Gabriel Borges, advogado que representou a Fórum, ao lado de André Rota Sena, ambos do escritório Santo, Borges, Sena Sociedade de Advogados.