Ângela Guimarães: Quando uma mulher negra é censurada, todas somos

Escrevo estas mal traçadas linhas para expressar minha irrestrita solidariedade e sororidade à Professora Doutora Georgina Gonçalves, carinhosamente conhecida na UFRB e em toda a Bahia como Gina.

Por Ângela Guimarães*

campanha dos estudantes

Gina, é graduada em Serviço Social pela Universidade Católica do Salvador (1992), tem mestrado em Educação pela Universidade Federal da Bahia (2001) e doutorado em Sciences de l’Éducation – Université de Paris VIII (2006). Professora Associada I da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, dirigiu o Centro de Artes, Humanidades e Letras. É consultora da Fundação de Amparo à Pesquisa ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Estado do Maranhão e membro da Rede Internacional de Pesquisa sobre Avaliação pelo Estudante – Réseau International de Recherche sur l’Évaluation de l’Enseignement par les Étudiants. Professora do Programa de Pós – Graduação de Estudos Interdisciplinares sobre Universidade, EISU da Universidade Federal da Bahia. Tem experiência na área de Serviço Social, com ênfase em Serviço Social, atuando principalmente nos seguintes temas: ensino superior, ações afirmativas, serviço social, políticas sociais e vida universitária. Foi Vice-Reitora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, mandato 2015-2019, e no pleito eleitoral de 2019 foi a REITORA ELEITA com 80% dos votos da comunidade universitária, aclamada e confirma pelo Conselho Universitário da UFRB e simplesmente INTERDITADA E IMPEDIDA de assumir pelo governo nazifascista, racista, misógino e Lgbtfóbico de Bolsonaro.

Ufaaaaa!! Diante deste vultuoso currículo acadêmico, de todo seu contributo e dedicação à consolidação e expansão da UFRB e sabendo que mulheres negras docentes da Pós Graduação no Brasil são apenas 3% do conjunto dos docentes de universidades, dá pra achar que além de aviltar a autonomia universitária e os princípios democráticos de respeito à decisão do processo eleitoral, esta INTERDIÇÃO E IMPEDIMENTO de Gina a assumir o MAIS ALTO POSTO de direção desta universidade não teve motivação racista, sexista e Lgbtfóbica????

Infelizmente, esta tem sido a lógica do atual governo. Agredir, vilipendiar, desrespeitar e tentar silenciar mulheres, negras e negros, indígenas, quilombolas, a classe trabalhadora, religiosas/os de matriz africana, ativistas dos direitos humanos, lutadoras/es das inúmeras causas sociais. Atacar e violar a democracia, desrespeitar as decisões soberanas do povo, unir Congresso, mídia, Forças Armadas, Milícias e sistema de “Justiça” para atacar e revogar direitos historicamente conquistados. O povo é considerado inimigo deste governo e como inimigo tem sido tratado. Sob Bolsonaro e sua quadrilha estamos perdendo direitos e vivenciando a demolição da democracia mais rápido que a velocidade da luz!

Seja por meio de declarações bombásticas – porém meticulosamente planejadas – , seja por meio de ataques à conquistas muito caras ao nosso povo como os direitos trabalhistas e sociais, a previdência pública e solidária, as políticas e os programas sociais, a educação pública, a ciência, pesquisa e tecnologia, a cultura, o conhecimento de forma generalizada, temos vivenciado o embate da luz contra as trevas, da civilização contra a barbárie, da democracia contra o autoritarismo e o arbítrio!

Neste contexto, do ponto de vista do Bolsonarismo seria absolutamente inadmissível empossar uma mulher negra no mais alto posto de uma Universidade pública Federal! Lugar este antes apenas ocupado por duas mulheres negras, a Profa Dra Nilma Lino Gomes, ex-Ministra da Seppir, na Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab) em 2013 e agora recentemente na Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), a Profa Dra Joana Angélica Guimarães. Isso em 211 anos de universidade pública no Brasil!!!

Lamentavelmente esta não é uma experiência única e exclusiva de Gina. Toda mulher negra coleciona inúmeras interdições, imedimentos e silenciamentos diários e cotidianos. Mas como bem nos ensinou Maya Angelou, “ainda assim, nós nos levantamos!”. Na escola, no mundo do trabalho, na militância social e partidária, nos relacionamentos “afetivos”, na mídia e muitos mais. Eles acontecem desde a nossa infância até os últimos dias de nossas vidas, por um sistema racista e patriarcal, numa sociedade de classes, que nos retêm nos estratos socioeconômicos mais baixos, que impõe inúmeras barreiras concretas e simbólicas à nossa ascensão, que nos estigmatiza cotidianamente, nos pretere em relações afetivas, desconsidera a nossa produção cultural, religiosa e intelectual e ao menor sinal de um avanço de uma mulher negra em direção a algum posto de comando ou decisão reúne o que há de pior dos seus substratos e nos ataca, nos achincalha, desrespeita, tenta intimidar e nos fazer recuar. Mas nós dizemos em alto e bom som: racistas, machistas não passarão!

Por isso quero saudar a iniciativa da APUB e da UFBA em prestar simbólica e muito emocionada homenagem à nossa Reitora ontem (8/8), pois é assim que a chamaremos pelos próximos quatro anos, Georgina Gonçalves. Naquela Reitoria repleta de defensoras e defensores da democracia, do Brasil, do nosso povo e das políticas afirmativas soubemos dar as mãos de verdade e concretizar a máxima de que diante das mãos certas: ninguém solta a mão de ninguém!