Reitora da UnB defende mobilização contra corte de verbas da educação

Em entrevista ao site da União Nacional dos Estudantes (UNE), a reitora da Universidade de Brasília, a professora Márcia Abrahão Moura falou sobre a situação da universidade mediante os atuais cortes realizados pelo governo Bolsonaro. Para ela, as mobilizações contra os cortes de verbas são "importantíssimas".

Márcia Abrahão Moura - Foto: Divulgação

Estar no comando de uma universidade federal em tempos tão sombrios não é tarefa fácil. Cortes e desqualificação por parte do governo fazem com que as direções de instituições tão importantes para o país passem por maus bocados. É assim na Universidade de Brasília (UnB) que vai receber mais de 10 mil estudantes entre os dias 10 e 14 de Julho para o 57º Congresso da UNE e pautar alternativas de luta para as dificuldades do setor educacional brasileiro. > Confira aqui a programação completa.

À frente de uma das universidades mais importantes do país a reitora Márcia Abrahão Moura, primeira mulher a exercer o cargo na instituição idealizada por Darcy Riberio e Anísio Teixeira, destaca que o único caminho é a reversão dos cortes anunciados pelo governo. Por ali, R$38 milhões em verbas foram congelados.

‘’Não há mais o que cortar. O único caminho é a reversão do bloqueio orçamentário’’, ressalta.

Confira entrevista na íntegra:

A UnB teve 30% de sua verba bloqueada pelo MEC, ação que posteriormente foi suspensa pela Justiça Federal. Como a universidade é impactada por essas incertezas quanto ao orçamento? Algum serviço foi paralisado?

Foi suspensa por apenas algumas horas. Ainda no mesmo dia, a AGU entrou com um recurso e a liminar que suspendia o bloqueio foi derrubada. A UnB tem R$ 48,5 milhões bloqueados, o que equivale a cerca de 31% do nosso orçamento discricionário na Fonte Tesouro.

Lidar com essa situação tem sido muito difícil. Não há como apontar projetos ou iniciativas específicas prejudicadas, uma vez que o orçamento não é alocado por áreas de conhecimento ou por cursos. Os espaços acadêmicos, como salas de aula e a própria Biblioteca Central, são compartilhados por toda comunidade, em atividades na graduação, na pós, em pesquisa e extensão. No caso da Biblioteca, atendemos todo o DF e Entorno.

O maior problema é que, com o bloqueio, os recursos ficam indisponíveis no sistema. Já não conseguimos, por exemplo, indicar dotação orçamentária para a renovação de contratos de prestação de serviços que venham a se encerrar nas próximas semanas. Também poderá haver comprometimento do pagamento de contas básicas, como água e luz, no próximo semestre. Isso paralisa a nossa gestão e prejudica o andamento das atividades-meio.

Qual é a postura da UnB diante dos cortes? Houve algum tipo de modificação no dia a dia da universidade para suavizar os impactos da redução de verbas?

Quando assumimos a Reitoria, no final de 2016, nos deparamos com uma grave situação de desequilíbrio orçamentário. Os recursos foram reduzidos em 45%, mas os contratos continuavam muito caros. Fizemos, então, um grande esforço para ajustar as contas e também para utilizar os recursos de maneira mais inteligente – por exemplo: estamos instalando placas solares fotovoltaicas em todos os campi, com a expectativa de sermos mais sustentáveis e, ao mesmo tempo, reduzir o valor de nossas faturas de energia.

Assim, em colaboração com toda comunidade, conseguimos fechar 2018 e entrar em 2019 de maneira equilibrada. Depois de todo esse caminho percorrido, não há mais como pedir sacrifícios a nossos estudantes, professores e técnicos. Não há mais o que cortar. O único caminho é a reversão do bloqueio orçamentário. Temos atuado fortemente, na gestão da Universidade e com a Andifes, em parceria com deputados, senadores e OAB, para sensibilizar o MEC e o governo quanto à urgente necessidade de desbloquear os recursos.

O anúncio dos cortes veio acompanhado de uma narrativa de ataque e desqualificação das ciências, principalmente na área de humanas, como filosofia e sociologia. Como enxerga esse comportamento do governo?

Acredito que isso é resultado de um profundo desconhecimento sobre o papel das universidades, de um modo geral, para o desenvolvimento do país. Não há como uma nação crescer, inclusive economicamente, sem um investimento sólido e perene em saúde, educação, ciência e tecnologia.

Temos tentado, em gestões junto ao MEC e a parlamentares de diversas legendas, conscientizar sobre a atuação da Universidade. Sempre levamos, além dos dados orçamentários, informações sobre nossos indicadores acadêmicos e exemplos concretos do impacto que temos na sociedade. Infelizmente, o atual governo parece pouco interessado nisso e sempre nos confronta com a afirmação de que o atual modelo de universidade está falido. As universidades públicas são um bem de toda sociedade brasileira. Executam atividades de ensino, pesquisa e extensão em forte interação com a comunidade e, portanto, são parceiras naturais de qualquer governo para melhoria de indicadores sociais e econômicos. É uma pena que esse potencial não seja percebido. E não há como preterir uma área do conhecimento. Todas são importantes para o desenvolvimento das pessoas e da sociedade em geral.

No último mês de maio, milhares de estudantes tomaram as ruas do país em defesa da universidade. Quão fundamental é a participação dos estudantes nesta luta contra os cortes? Qual recado a senhora daria a eles?

Os estudantes, assim como as entidades que representam docentes e técnicos, desempenham papel fundamental na defesa a educação pública e inclusiva. As mobilizações que têm início nos movimentos são importantíssimas, porque complementam o trabalho que fazemos na Administração, de diálogo com o MEC, parlamentares e outros representantes da sociedade civil.

Eu diria aos estudantes que sigam abraçando a UnB, que nos ajudem a mostrar, cada vez mais, o que a Universidade realiza. Os estudantes são o coração de nossa instituição, as pessoas que renovam, a cada semestre, nossas esperanças de um futuro melhor.