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Revisão: uma reflexão da poesia cubana sobre nosso “lugar no mundo” 

Lina de Feria nasceu em Santiago de Cuba em 1945. Poeta e ensaísta, é considerada uma das mais destacadas vozes femininas da poesia cubana contemporânea. Recebeu inúmeros prêmios internacionais. Entre suas obras, merecem destaque A mansalva de los años (1990), El ojo milenário (1995) e Rituales del inocente (1996).

Revisão

O crítico Arturo Arango diz que sua obra pode ser interpretada como capaz de representar “a dialética entre o indivíduo e a história, a forma agônica, vital, como nós cubanos aprendemos a compreender, a assumir a viver e a fazer a história”.

Nesta edição do Prosa, Poesia e Arte, publicamos uma tradução inédita de Revisão, poema de Lina de Feria retirado da coletânea La beleza de lo entendible (2016), que faz parte de um conjunto de textos intitulado “Las nuevas soledades”. Neles, a poeta enfoca, sob diversos pontos de vista, uma situação de solidão lírica que gera reflexão acerca do seu próprio lugar no mundo.

Confira abaixo a versão em português de Revisão, especialmente traduzido pelo poeta Alexandre Pilati, professor de Literatura da Universidade Brasília (UNB) e colaborador do Prosa, Poesia e Arte.

Revisão
(Lina de Feria)

Faltam-me o tédio dos dias
a sucessão de eclipses
em que olhei os diferentes astros e o céu.
Agora o estupor de um sonho
diminui a pesada carga de minha sombra
e na imberbe manhã
os pássaros não retornam
            ao lugar costumeiro.
E a luz de viver
ilumina o prato de louça
onde recebo meu almoço.
A terra abriga
            muitos esfomeados
e nesta hora
penso neles:
a solidão é o mar
dos afogados
ou o que dá no mesmo
o mar sem penhascos
           e sem margens.