Luciana Santos: saída para o impasse do Brasil deve ser política

Realizada nesta semana, a reunião da Comissão Política Nacional do Partido Comunista o Brasil (PCdoB) debateu o quadro político pelo qual o Brasil. A reunião também marcou o congraçamento da incorporação do Partido Pátria Livre (PPL) ao PCdoB, após a decisão unânime do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

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Para a presidenta nacional do PCdoB, Luciana Santos, o ambiente político sob o qual se realizou a reunião é marcado por fortes tensões, um cenário em que a instabilidade continua, o que leva o país a caminhar para um impasse. De personalidade intempestiva, instável emocionalmente e com mania conspirativa, segundo ela, Bolsonaro mistura uma espécie de messianismo com uma agenda moralista e armamentista, recheada com um nacionalismo vazio. Faz de seu círculo familiar o núcleo central do governo, avalia.

De acordo com Luciana Santos, há uma ausência absoluta de uma agenda e de um programa de governo para o Brasil. “É um governo que não está preocupado com os reais problemas e desafios pelos quais atravessa o país. Não há uma única ação dirigida a enfrentar a retomada do crescimento econômico”, disse ela. A atitude errática de Bolsonaro — ora agressivo, ora conciliador — e sua veia autoritária que se expressa, entre outras formas, com a crítica à política e às instituições, ampliou o seu desgaste com os agentes políticos, prosseguiu.

A presidenta do PCdoB considerou também que parcelas das elites que o elegeram por ojeriza ao Partido dos Trabalhadores (PT) e por interesses na implementação de uma agenda ultraliberal dão sinas de cansaço diante de tanta balbúrdia, como é constatado pela pesquisa entre atores econômicos realizada pela XP que indica que a avaliação do governo entre os investidores foi de 86% de ótimo e bom em janeiro para 14% neste mês. Ou seja: uma queda de 70%. “Bolsonaro, há apenas cinco meses de governo, é o principal fator de instabilidade política e econômica”, afirmou.

Ortodoxia financeira

Para Luciana Santos, Bolsonaro e seu superministro da Economia Paulo Guedes fracassaram ao enfrentar os desafios econômicos do país. Chegaram ao poder com projeções de crescimento da economia de 2,4%, no mínimo, e apenas cinco meses depois já se confirma um quadro de recessão, disse ela. “Não são somente os fatores externos, como as tensões entre Estados Unidos e China ou a crise na Argentina, que dificultam a retomada da atividade econômica. O problema é estrutural”, analisou.

A indústria continua em crise profunda, afetando o setor de serviços, lembrou Luciana Santos. “Os investimentos privados não se materializam. O crédito público tem sofrido forte contração em decorrência da mudança na política de juros do BNDES. O consumo tenta se recuperar, mas não decola, pois com a perda do poder de compra dos salários e o desemprego batendo a casa dos 13,2 milhões de pessoas — além das 4,9 milhões de pessoas desalentadas, que desistiram de procurar postos de trabalho — tornam a situação econômica muito frágil”, avaliou.

No desespero, segundo a presidenta do PCdoB, o governo busca improvisar com medidas como a liberação de R$ 20 a 30 bilhões do FGTS. E já fala até em flexibilizar o teto de gastos. Ela chamou a atenção para o fato de que esta é a segunda “equipe dos sonhos” do mercado financeiro, que tenta impor uma agenda ultraliberal. O fato é que a agenda da ortodoxia financeira e da austeridade que vem sendo implementada desde o governo Michel Temer — como o teto dos gastos públicos e a “reforma” trabalhista — somente gerou mais desemprego, comprovando uma vez mais que é nociva aos interesses do Brasil, destacou.

Sono do presidente

Luciana Santos enfatizou que os impactos econômicos e sociais são imensos. Trazem desalento e mais cedo que tarde irão se expressar politicamente, avaliou. “Diante deste quadro, o governo toca uma música de uma nota só: a ‘reforma’ da Previdência Social. Em essência, a única ação concreta do governo em seus cinco meses, que pelo seu caráter nocivo aos mais vulneráveis vem sofrendo forte resistência. A atuação das forças de oposição, em coordenação com as forças do centro, tem permitido vitorias pontuais nesse tema”, lembrou.

Para a presidenta do PCdoB, a capacidade de Bolsonaro para liderar as próprias ações é quase nula. Ele mal conseguiu aprovar a Medida Provisória que reestrutura os ministérios, disse ela. “Não há base de sustentação do governo no Congresso e o que se vê é uma disputa acirrada entre parlamentares do PSL por espaços. Enquanto as ruas clamam por respostas aos problemas educacionais, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, responde com vídeos para tentar constranger professores e estudantes”, criticou.

Luciana Santos disse também que os polos de sustentação ao governo vivem momentos de choque e contradição entre si. “Cresce o descontentamento e a decepção dos militares com o clã Bolsonaro. Mesmo na frágil base de apoio do bolsonarismo no parlamento há demonstrações de divisão. “O mesmo pode ser visto nas manifestações realizadas no último dia 26 de maio”, disse ela. “Como o próprio presidente já confessou, o avanço das investigações do Ministério Público do Rio de Janeiro sobre seu filho, o senador Flávio Bolsonaro — que envolve de transações financeiras não esclarecidas a vínculos com grupos milicianos —, tiram o sono do presidente”, considerou.

Tática do PCdoB

Diante deste quadro, destacou Luciana Santos, Bolsonaro atua para manter mobilizada sua base, fazendo a todo instante sinalizações para este campo. “As manifestações do dia 26 foram relevantes, não devem ser menosprezadas. Permitiram a ele, mesmo que temporariamente, a retomada da iniciativa política, ao propor um pacto entre os Poderes, ideia que foi desmascarada pelas entrevistas do presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Segundo ele, um pacto de princípios pode existir, mas não o de uma agenda política e ideológica como esse”, afirmou.

Como consequência de um governo que envelhece precocemente, avaliou Luciana Santos, os polos políticos começam a analisar saídas para a crise. De acordo com ela, no horizonte imediato não é possível ver por onde construir saídas para este quadro, mas as crescentes contradições abrem espaços para, com amplitude e sagacidade, uma recomposição forças para abrir novos caminhos para o Brasil. “Se por um lado há uma convergência grande entre as forças de centro e centro direita em torno da agenda econômica do governo, principalmente sobre a ‘reforma’ da Previdência, por outro crescem as reações políticas contra as investidas autoritárias e medidas de ataques a direitos”, disse ela.

Segundo a presidenta do PCdoB, essas reações ocorrem entre as forças políticas e na sociedade, como foi visto nos encontros de ex-ministros da educação, ex-ministros de direitos humanos, ex-ministros da justiça — movimentos embrionários de uma ampla frente pela democracia e direitos. “É sobre estas tensões e contradições que temos atuado, disse Luciana Santos. “O núcleo central da tática do PCdoB continua o mesmo: resistência, amplitude e sagacidade. A resistência tem sido feita nas ruas e no parlamento. A sagacidade está principalmente em conseguir explorar contradições entre as forças que poderiam aderir ao governo Bolsonaro. A defesa da democracia continua sendo a bandeira com maior capacidade aglutinadora”, complementou.

Povo na rua

Para Luciana Santos, o PCdoB tem condições de contribuir para a construção de saídas. O desafio está em recompor forças, conformar um verdadeiro pacto em defesa da democracia, reaglutinar forças em defesa de um projeto nacional de desenvolvimento, enfatizou. “Neste sentido, o momento é de restabelecer pontes, abrir diálogos com outros campos políticos. É de grande significado os movimentos que o governador Flávio Dino vem realizando, como as visitas a figuras do mundo político, como o ex-Ministro Nelson Jobim e aos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso FHC e Luiz Inácio Lula da Silva, avaliou.

As manifestações dos dias 15 e 30 de maio se somam à greve geral programada para 14 de junho, lembrou Luciana Santos. Elas se colocam dentro de um ciclo de crescentes mobilizações do povo na luta por seus direitos, afirmou, complementando que os protestos estudantis têm mobilizado grandes massas e recolocado a União Nacional dos Estudantes (UNE) e União Brasileira de Estudantes Secundaristas (Ubes) no centro do embate político.

“É tarefa nossa neste momento é reforçar o empenho e o engajamento, mobilizando todas as forças para contribuir com a vitória da greve geral de 14 de junho. A greve geral deve se revestir de um caráter amplo: popular, democrático e patriótico”, destacou. Luciana Santos disse que a paralização defende, ao mesmo tempo, os direitos dos trabalhadores — da aposentadoria ao emprego — e os fundamentos da nação, duramente ameaçados pelo governo Bolsonaro. “É hora de resistência e de demonstrar repúdio à agenda que está destruindo o Brasil e a sua gente. É a hora do povo na rua”, concluiu.

Da redação