Elias é imortal

 

Elias é imortal

De repente partiu Elias. Assim, numa manhã de quarta, de um mês de maio, que costuma ser de flores e de verde. Chegou no grupo a mensagem de seu irmão querido, seu par Evaldo Lima,e  veio a devastadora notícia, a inacreditável notícia: amigos, comunico o falecimento de meu irmão Elias Ferreira. Como assim? Não, não, não!! Evaldo não diz isso, não pode ser verdade! E era sim, era verdade, vindo da alma machucada e para sempre doída de nosso irmão Evaldo Lima.

Eu imagino, Evaldo, como foi escrever isso, imagino seus dedos trêmulos, seu coração confuso da mais profunda dor. Comunicar o que deveria ser o nunca anunciado, porque não deveria nunca ter acontecido. Porque ele era do tipo que não combinava com a morte. Elias não era mortal. Era flor com braços de acalanto. Era olhar de esperança. Era o acolhimento e o afeto. O simples e o inquieto. Amigo.

Eu fiquei pensando enquanto chorava: aquele coração imenso não cabia mais dentro do corpo. Tinha que sair voando pelo céu azul, para chegar em mais pessoas. Um coração tão cheio de amor precisa de mais espaço, precisa nutrir o universo, precisa de terra e mar. Precisa correr como correm os rios.
 
E a gente não entende, não aceita. Essa dor ruim, esse café amargo, esses olhos inchados, nossos corpos parados olhando sem olhar, sentindo o sentir demais, o absurdo. 
 
E vieram, amigo Evaldo, de todos os cantos desse Brasil, lamentos de dor, do inacreditável, da saudade, de tantas histórias, todas boas e felizes.
 
Vc teve a melhor pessoa do mundo por 53 anos. Olha que presente esse da vida. Nasceu irmão de Elias. E depois a gente foi também roubando teu irmão. Porque ele foi virando nosso irmão. Era um conquistador, esse Elias. Sorriso mais lindo nunca vi. Alegria mais linda nunca vi. Em momentos de tensão, em especial eleições, era o cuidado, a atenção com a atividade e a amplitude nas decisões. E nós, camaradas do mesmo partido, desse partido que ele amava e construía com maos de cuidado, zelo, afinco e convicção. Honrou com sua luta todos os nossos heróis. Honrou com sua luta os guerrilheiros do Araguaia, João Amazonas, Carlos Danielli, Elza Monerat. Honrou a UJS, nossa linda juventude. Honrou a luta dos excluídos. Foi vermelho, foice e martelo. Força e delicadeza. Braços erguidos, fiel ao povo e ao país.
 
Um dia desses perdido, um mês de novembro, o encontrei tomando cerveja no meio da tarde na praia de Iracema. Eu sentei ali para uma conversa rápida. Tomamos todas as cervejas, rimos todos os risos e a noite chegou e nem percebi. Era isso que ele fazia. Seduzia o tempo.
 
E agora essa dor? E agora o que fazer? Sem a doce, alegre, vibrante e forte presença de Elias? A resposta é seguir. Segue, Evaldo. Segue Elza, segue Raquel, sigamos amigos. Sigamos por ele. Sigamos com ele. E no meio do dia, a gente pode fechar um pouquinho os olhos e lembrar dos olhos dele. E sorrir um sorriso afetuoso e pensar: como é bom lembrar de Elias. É como ouvir uma música linda, um poema lindo, um dia florido. É a magia dos inesquecíveis. Dos que vieram para espalhar amor. Esses são imortais. Elias é imortal. Ele não morreu. Tá aqui, no voar do passarinho. Nos filhos, irmãos, amigos, no partido. Na alegria e na ternura. Elias é o afeto dos imortais.
 
Voa nas nuvens, querido amigo e de lá nos abraça com teu amor imenso.
 
Memória
 
Amar o perdido
deixa confundido
este coração.
 
Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.
 
As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão
 
Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão.
 
Drummond