No Dia Mundial da Educação, é preciso que se lute por ela

Bolsonaro é um incendiário que queima não apenas livros, mas todo um país.

Por Táscia Souza*

Livros queimados

Poderia ser uma distopia, uma daquelas em que se proíbem e se queimam livros para se suprimir o pensamento crítico. Mas não é. Ao tuitar, nesta sexta-feira (26) — praticamente às vésperas do Dia Mundial da Educação, celebrado no domingo, 28 de abril —, o presidente Jair Bolsonaro, infelizmente, não pareceu estar tentando ser uma espécie de novo Ray Bradbury, autor de Fahrenheit 451. Pelo contrário, para crítica literária, a postagem provavelmente estaria muito aquém, em termos narrativos, do exigida para um microconto, quiçá para um romance de ficção científica:

“O Ministro da Educação @abrahamWeinT estuda descentralizar investimento em faculdades de filosofia e sociologia (humanas). Alunos já matriculados não serão afetados. O objetivo é focar em áreas que gerem retorno imediato ao contribuinte, como: veterinária, engenharia e medicina”,

seguido de:

“A função do governo é respeitar o dinheiro do contribuinte, ensinando para os jovens a leitura, escrita e a fazer conta e depois um ofício que gere renda para a pessoa e bem-estar para a família, que melhore a sociedade em sua volta.”

Tivesse Bolsonaro um desejo secreto de ser ficcionista — o que talvez até tenha, considerando sua afeição pelas fake news —, quem sabe até poderia ser perdoado por alguns. Na Verdade, nem isso, porque o problema é o abuso que faz da origem da palavra ficção, no sentido etimológico de “dar feição a”, de “fabricar”. A feição que dá ao Brasil tem sido mais tenebrosa a cada dia, assim como a fabricação de retrocessos tem sido alarmante.

As declarações de Bolsonaro não são apenas um ataque às humanidades, mas um atestado de ignorância — para não dizer perversidade — de todo um grupo que insiste que “ciência” se constrói apartada do pensamento. Ou a matemática, a física ou a biologia, por exemplo, não devem à filosofia seu desenvolvimento ao longo da história?

O dia 28 de abril foi adotado como Dia Mundial da Educação em 2000, quando mais de 160 países, dentre os quais o Brasil, discutiram e aprovaram, no Senegal, um pacto internacional para as políticas educacionais, considerando a “educação enquanto um direito humano fundamental” e “chave para um desenvolvimento sustentável”. Mas essa educação — essa que deveríamos celebrar no domingo — está sob bombardeio desde o primeiro dia do atual governo, e mesmo antes, alvo que foi das ameaças de suas promessas de campanha. Ataques que incluem os corte de recursos, a militarização de escolas, a destruição do Plano Nacional de Educação (PNE), a perseguição ao magistério e sua criminalização, o impedimento à reflexão crítica e ao combate às diversas formas de discriminação (aliás, vale destacar que a censura à promoção do respeito à diversidade que tem sido praticada nas escolas atingiu até peça publicitária), a tentativa de permitir o ensino domiciliar, a entrega da educação nas mãos dos privatistas.

Bolsonaro é um incendiário que queima não apenas livros, mas todo um país. No Dia Mundial da Educação é preciso que, por aqui, lutemos para salvá-la. Para que os ideais que defendemos, de uma educação pública, gratuita, democrática, crítica, inclusiva e de qualidade socialmente referenciada, não sejam transformados em cinzas.