A demagocia de Bolsonaro com o Bolsa Família

Em artigo no jornal Folha de S. Paulo, Rodrigo Zeidan — Professor da New York University Shangai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ —, intitulado “Governo erra até ao tentar acertar”, afirma: Quer fazer populismo com dinheiro público? Que faça direito.

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Ele parte do exemplo do anuncio da criação do 13º salário para o Bolsa Família em faz o contraponto com a proposta de revogação do aumento real do salário mínimo. “Bolsa Família é um valor pequeno (no máximo, em pouquíssimos casos, R$ 378 por família). O programa não é bom somente porque dá dinheiro para quem mais precisa, mas também, e principalmente, porque reduz a incerteza em relação à evolução da renda familiar”, escreve.

“Ser pobre não é só receber pouco, mas também não saber quanto vai receber nos próximos meses. A diminuição da volatilidade da renda importa porque todas as famílias, pobres e ricas, têm dificuldade de planejar o seu futuro”, firma.

“Em termos técnicos, dizemos que os brasileiros fazem desconto hiperbólico da sua renda e gastos futuros. Ou seja, damos muito mais valor ao presente e ao futuro próximo do que o futuro distante. É por isso que aceitamos pagar juros absurdos, parcelamos as compras — precisamos do produto agora! — e poupamos pouco para o futuro. Como não vamos mudar da noite para o dia, é muito mais importante para uma pessoa pobre saber que sua renda mensal vai ser um pouco mais alta e previsível do que ter um benefício que só virá no fim do ano. Teria sido muito melhor aumentar o benefício mensal”, diagnostica.

O objetivo do governo, segundo ele, é obter apoio político dos mais pobres, o que é parte do jogo, mas isso poderia ter sido feito mais eficientemente. “Quer fazer populismo com dinheiro público? Que faça direito. Se o governo é ineficiente na transferência aos mais pobres, na hora de arrancar dinheiro dos que mais precisam não falta competência”, afirma.

Segundo Rodrigo Zeidan, a proposta de revogação do aumento do salário mínimo é uma tentativa de impedir o crescimento da renda dos trabalhadores mais pobres com a desculpa de que isso seria necessário para equilibrar as contas públicas e diminuiria desemprego e informalização. “Balela. É verdade que um aumento muito grande do salário mínimo poderia causar maior desemprego. Mas não é esse o caso da política de aumento real do salário mínimo. Ela faz com que o mínimo suba em termos reais no percentual do crescimento passado do PIB”, equaciona.

Ele lembra que “desde o seminal trabalho de Alan Krueger — grande economista que, infelizmente, se matou há poucas semanas — e colegas, sabemos que um aumento pequeno, mas real, do salário mínimo não causa desemprego”.

“A política atual do mínimo tem pouco impacto sobre o mercado de trabalho, mas é importante em termos de distribuição de renda. Há algum efeito sobre as contas públicas, mas, assim como no caso do Bolsa Família, essa é a influência que queremos —o papel do governo é diminuir a absurda desigualdade de renda do Brasil. Não é preciso atacar o bolso dos mais pobres para fechar o rombo das contas públicas”, conclui.