PCdoB: 97 anos em defesa da democracia, dos direitos e do Brasil

"O PCdoB tem uma história de luta incansável pelos direitos do povo mais pobre, dos trabalhadores, a defesa intransigente da democracia e de um desenvolvimento livre, independente e soberano do Brasil".

Por Dalton Macambira*

Fundadores do PCdoB em 1922

No início do século XX o mundo passava por grandes transformações. O sistema capitalista, sobretudo as grandes potências, em busca de mercados para expandir a venda de suas mercadorias, fruto da Revolução Industrial, e na busca por lucros cada vez maiores, no plano interno elevava ao máximo a exploração dos trabalhadores e, no plano externo, acelerava o acirramento das tensões diplomáticas que, uma vez fracassadas, conduziram à eclosão da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), catástrofe nunca antes vista na história da humanidade.

Nesse contexto, de fragilidade dos principais países envolvidos no conflito e da luta dos trabalhadores por melhores condições de vida e trabalho, eclodiram movimentos revolucionários por toda parte, cujo destaque é o advento da Revolução Russa de 1917, cuja vitória influenciará de forma decisiva no surgimento de Partidos Comunistas em todo o mundo, inclusive no Brasil.

Nessa época em que o desenvolvimento industrial ainda era bastante insipiente, em função da tardia medida que levou ao fim da escravidão (1888) e a conservadora transição da Monarquia para a República (1889), que havia reforçado oligarquias regionais e um poder central dominado pelas elites paulista (café) e mineira (gado), o jovem movimento operário sofria forte influência do anarquismo, incapaz de conduzir a luta dos trabalhadores para um patamar superior, mesmo após as importantes greves de 1917, não aceitava a criação de um partido político e reduzia a luta ao plano econômico, isto é, a pauta era basicamente pelo aumento salarial e por melhores condições de trabalho.

Foi nessa conjuntura, e em um ambiente de absoluta clandestinidade, que no dia 25 de março de 1922, há quase 100 anos, portanto, que foi fundado o Partido Comunista do Brasil (PCB), o primeiro partido de trabalhadores da história do país. Eventos de organizações políticas diversas, reunindo 73 lideranças operárias dos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Pernambuco, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, elegeram 09 delegados para o Congresso de fundação do PCB, em Niterói: Astrojildo Pereira (jornalista), Cristiano Cordeiro (advogado), Joaquim Barbosa (alfaiate), Manuel Cendón (alfaiate), João da Costa Pimenta (gráfico), Luís Pérez (vassoureiro), Hemogêneo Fernandes da Silva (eletricista), Abílio Nequete (barbeiro) e José Elias da Silva (pedreiro).

O PCB nasce como uma organização muito pequena e com ideias bastante radicais, partindo do princípio que capital e trabalho são inconciliáveis, defendia a revolução como única via de transformação da sociedade, inspirado no que ocorreu na Rússia em 1917 e na enorme agitação política e cultural da década de 1920 no país, como a Semana de Arte Moderna, a Revolta do 18 do Forte de Copacabana, o Tenentismo e a Coluna Prestes. Esse radicalismo levou o Partido a se ausentar da chamada “Revolução de 30”, processo que conduziu ao fim da República Velha, por entender, de forma equivocada, que aquela luta era entre a aristocracia rural oligárquica e a burguesia industrial urbana.

Na verdade, o movimento armado de 1930 abriu caminho para o desenvolvimento do Brasil, sua industrialização e urbanização, permitindo o crescimento e o fortalecimento da classe operária, cujas lutas levaram a importantes conquistas trabalhistas e previdenciárias, como a lei do salário mínimo, direito a férias e a aposentadoria, regulamentação da jornada de trabalho e ao repouso semanal remunerado, entre outros, além da universalização do direito de voto, inclusive o da mulher.

Na década de 1930 o Partido Comunista do Brasil (PCB) participou da construção da Aliança Nacional Libertadora (ANL), uma frente ampla que reunia a esquerda, democratas e progressistas, militares, operários e intelectuais, movimento caracterizado pela luta anti-imperialista, antifascista, em defesa da democracia, da soberania nacional e pela paz, em função das ameaças de mais uma guerra mundial. Os comunistas estiveram na linha de frente contra o golpe que instaurou a ditadura do Estado Novo (1937-1945), que atingiu os principais quadros do Partido, muitos dos quais foram mortos, torturados e presos, como o seu principal líder, Luís Carlos Prestes.

Com o final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), mais catastrófica do que a primeira, a derrota do nazi-fascismo e a redemocratização do país, o PCB foi legalizado, chegando a lançar candidato a presidente da República, Iêdo Fiuza, que obteve 10% dos votos do país. Os comunistas também elegeram uma bancada para a Assembleia Nacional Constituinte (1946), elegendo 14 deputados e um senador, Luís Carlos Prestes (Rio de Janeiro – DF). A bancada de deputados comunistas era formada por operários, lideranças populares e sindicais, médicos e escritores, quais sejam: Carlos Marighela (Bahia); Agostinho de Oliveira, Alcedo Coutinho e Gregório Bezerra (Pernambuco); Batista Neto, João Amazonas e Maurício Grabois (RJ – DF); Alcides Sabença e Claudino Silva (Rio de Janeiro); Caires de Brito, Jorge Amado, José Maria Crispim e Osvaldo Pacheco (São Paulo); e Abílio Fernandes (Rio Grande do Sul).

A redemocratização no Brasil (1945 – 1964) enfrentaria várias limitações em função do caráter conservador do parlamento brasileiro e do governo Dutra e seu alinhamento subserviente aos interesses norte-americanos, bem como o clima de Guerra Fria que polarizou as relações internacionais entre os EUA e a União Soviética (1945 – 1989). Esse ambiente levou a cassação do registro do PCB e dos mandatos de toda a bancada comunista no Congresso Nacional e o Partido foi novamente para a clandestinidade.

No plano mundial, a expansão e a consolidação do bloco socialista e a vitória da revolução na China (1949) contrastava e ao mesmo tempo reforçava o processo que levou à ilegalidade do PCB no Brasil. A divisão do movimento comunista internacional após a morte de Stálin (1956), líder comunista que derrotou Hitler e transformou a URSS em potência, capaz de rivalizar com os EUA nos planos econômico e militar, também provocou um racha no PCB. Em 1962, uma parte do Partido, sob a liderança de Prestes, manteve a sigla (PCB) de fundação do Partido, e alterou o nome para Partido Comunista Brasileiro, enquanto que outra ala, sob o comando de João Amazonas, mudou a sigla partidária para PCdoB, mas manteve o nome Partido Comunista do Brasil, de 1922.

Com o golpe militar de primeiro de abril de 1964, depois de mais de 40 anos como a principal referência dos trabalhadores brasileiros, os comunistas são incansavelmente perseguidos e têm suas principais lideranças brutalmente assassinadas, presas e torturadas. Com a repressão atingindo principalmente as cidades, o PCdoB buscou se organizar no campo. A descoberta desse movimento daria origem a Guerrilha do Araguaia (1967 – 1974). Mesmo após a anistia (1979), e tendo uma participação importante na luta pela redemocratização, como as Diretas Já (1984 – 1985), não tiveram o direito de atuar na legalidade, o que somente ocorreria plenamente após a aprovação da Constituição de 1988.

O período de democracia mais duradouro da história do Brasil (1985 – 2016) coincide também com o tempo de atuação legal do PCdoB. Após ter participação destacada na luta pelo impeachment de Collor e estar na linha de frente contra a política neoliberal de FHC, os comunistas participaram dos governos democráticos e populares de Lula e Dilma (2003 – 2016) e atuaram firmemente nos movimentos populares contra o golpe de 2016 e contra a prisão ilegal e sem provas da principal liderança popular da história do Brasil.

No Piauí, o PCdoB participou de forma decisiva do movimento que derrotou a oligarquia, nas décadas de 1980 e 1990, atuando em frente ampla com outros segmentos políticos e da sociedade, tendo destacada participação no movimento popular e sindical. No plano institucional, participou de diversos governos, contribuindo para a democratização da sociedade e na formulação de políticas públicas que visam à redução das desigualdades sociais e o alargamento dos horizontes da cidadania.

A marca do PCdoB nessa sua história quase centenária tem sido a luta incansável pelos direitos do povo mais pobre, dos trabalhadores, a defesa intransigente da democracia e de um desenvolvimento livre, independente e soberano do Brasil.