Fenaj se solidariza com Juca Kfouri, ameaçado por bolsonarista

A Federação Nacional dos Jornalistas emitiu nota de solidariedade ao jornalista Juca Kfouri. Ele foi alvo de ameaças e agressões verbais promovidas por um ex-militar bolsonarista de nome José Emílio Joly Júnior. A Fenaj diz, na nota, que "apoia totalmente o jornalista e pretende se somar à iniciativa (judicial contra o agressor) como parte diretamente interessada, pois há uma escalada de agressões e ameaças a jornalistas em rede social em todo o Brasil"

kfouri joly

O jornalista Juca Kfouri entrou no último dia 14/01 com representação no Ministério Público de São Paulo contra o corretor de imóveis José Emílio Joly Junior. Kfouri notificou o procurador de Justiça Paulo Marco Ferreira Lima, chefe do Núcleo de Combate a Crimes Cibernéticos do MP, ameaças e comentários feitos por Joly Junior em seu blog, no portal UOL.

Nos comentários (reproduzidos abaixo), Joly Junior faz ameaças do tipo "Juca nalha. Um dia vou cruzar na sua frente e te encher de porrada na cara! Velho gaga. Pederasta inútil. Pedófilo (…) Se cuida palhaço!"

O corretor, que atua em Curitiba, afirma ser ex-militar, apoiador de Jair Bolsonaro e faz menção a "famosos helicópteros dos tempos áureos da ditadura". Segundo o jornalista, o "valentão" autor das ameaças e comentários ofensivos usava o apelido de "JConselheiro" e o e-mail da mulher dele.

"Aprendi que cão que ladra não morde", disse Juca Kfouri à RBA, lembrando que convive com ameaças desde os tempos de diretor de Redação de Placar, no início dos anos 1980, quando a revista, especializada em esportes, com ênfase em futebol, denunciou a máfia da loteria esportiva. "Ameaça é o que não falta. Mas o que me indignou nesse caso foi a referência aos helicópteros. Ter medo faz parte, o que não pode é deixar de enfrentar o medo."

O jornalista assinala, em seu blog: "Joly Júnior terá de explicar não só suas covardes ameaças como, principalmente, o que sabe sobre helicópteros que jogavam pessoas no mar durante a ditadura. Como alguém que diz ter sido do Pelotão de Operações Especiais do Exército Brasileiro, ele terá participado de alguma dessas operações?".

Antes de acionar o MP Kfouri denunciou o corretor de Curitiba em delegacia especializada. "Informado que suas ameaças foram denunciadas à Delegacia de Crimes Informáticos, desapareceu, como todo valentão."

O procurador Ferreira Lima diz, segundo Kfouri, que é preciso que "as pessoas entendam que não se pode fazer tudo o que se deseja" nas mídias sociais. "Você pode me criticar e discordar do meu trabalho, mas isso é muito diferente de me ameaçar e me insultar perante várias outras pessoas."

O corretor chegou a pedir desculpas. "O blog recebeu um frágil pedido de desculpas do autor das ameaças e da revelação, evidentemente insuficientes para que as investigações não sejam levadas adiante", afirmou Kfouri.

Por entender que a ameaça a Kfouri faz parte de um movimento mais amplo, a Fenaj emitiu sua nota de solidariedade ao jornalista afirmando que "há uma escalada de agressões e ameaças a jornalistas em rede social em todo o Brasil, e é preciso enfrentá-la para preservar o livre exercício do jornalismo e a própria liberdade de imprensa."

Confira, abaixo, a íntegra da nota da Fenaj:

A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) expressa seu apoio ao jornalista Juca Kfouri e seu repúdio às inaceitáveis agressões praticadas por meio de mensagens em rede social por José Emílio Joly Júnior. Em sua coluna na internet e em jornal, Juca Kfouri aborda principalmente temas esportivos, mas com frequência trata também de temas políticos, inclusive para dar toda a dimensão das questões que envolvem o esporte brasileiro e mundial.

Críticas legítimas do jornalista ao governo Bolsonaro e ao grupo que o cerca provocaram, por parte de Joly Júnior, uma saraivada de mensagens com agressões e ameaças – que ultrapassaram o limite do debate democrático e entraram no terreno criminal.

Ao atacar Juca Kfoury, Joly Júnior usou termos como: “Lembre-se que a Ditadura está no poder e os porões serão reabertos para ‘extinguir’ lixos como você, Juca. Cuidado!”; “Como ex-militar, eu adoraria uma missão para executar imbecis iguais a vocês do UOL e outros lixos”; “Acho que o seu nome já está na lista dos famosos helicópteros dos tempos áureos da Ditadura, onde sobrevoavam por mares distantes! Atenção senhores passageiros para voo panorâmico em alto mar, tomem seus assentos, boa viagem e até nunca mais!!!!”; “Juca.nalha. Sou ex-militar (Pelopes – Pelotão de Operações Especiais), e consigo achar qualquer animal, nem que seja no inferno”.

Frente ao teor criminoso das mensagens, Juca Kfouri corretamente acionou o Núcleo de Combate a Crimes Cibernéticos do Ministério Público de São Paulo, e o agressor terá de responder judicialmente por seus atos. A Fenaj apoia totalmente o jornalista e pretende se somar à iniciativa como parte diretamente interessada, pois há uma escalada de agressões e ameaças a jornalistas em rede social em todo o Brasil, e é preciso enfrentá-la para preservar o livre exercício do jornalismo e a própria liberdade de imprensa.

As mensagens de Joly Júnior, por seu teor, suscitam ainda outra questão: como se sabe, os crimes de tortura e morte praticadas por agentes da ditadura militar de 1964 permanecem até hoje não apurados, e portanto impunes, e são crimes imprescritíveis, cuja impunidade prossegue como uma chaga aberta. Nos somamos à demanda do jornalista Juca Kfouri para que a Justiça exija de Joly Júnior que explique o que sabe do uso de helicópteros para assassinar opositores e desaparecer com seus corpos durante o regime militar, como forma de avançar no conhecimento público desta página obscura de nossa história.