Cinturão e Rota: oportunidade histórica para intercâmbio sino-lusófono

 "A iniciativa chinesa do Cinturão e Rota é uma oportunidade histórica para a cooperação econômica e comercial entre a China e os países de língua portuguesa, especialmente para as nações em desenvolvimento", disse José Medeiros da Silva, professor da Universidade de Estudos Internacionais de Zhejiang, em Hangzhou, leste da China.

Por Liu Guobin e Rafael Lima, da Xinhua

China cooperação Cinturão e Rota

"Esse intercâmbio, se bem construído, será mutualmente benéfico e abrirá oportunidades novas para diversos países darem um novo salto de desenvolvimento", explicou o professor brasileiro radicado na China.

A Iniciativa do Cinturão e Rota foi proposta pela China em 2013 e abrange o Cinturão Econômico da Rota da Seda e a Rota da Seda Marítima do Século 21. Até o final de 2018, mais de 100 países e organizações internacionais haviam assinado documentos de cooperação com a China sob o escopo do Cinturão e Rota, o que estendeu o alcance da Iniciativa do continente euroasiático e África até às regiões mais distantes como a América Latina e o Sul do Pacífico.

Através do Cinturão e Rota, as relações econômicas e comerciais entre a China e os países de língua portuguesa têm sido intensificadas. Em 2017, o valor total das exportações e importações entre a China e os países lusófonos ultrapassou os US$ 117,5 bilhões. Nos primeiros nove meses de 2018, o volume comercial entre as duas partes chegou a US$ 108,93 bilhões, um aumento anual de 21,22%. Mas segundo dados da Administração Geral das Alfândegas da China, em 2002 esse valor era de apenas US$ 6 bilhões.

Entre janeiro e setembro do ano passado, as importações chinesas desde os países de língua portuguesa foi de US$ 77,39 bilhões, um crescimento anual de 21,78%, enquanto as exportações chinesas para o mundo lusófono ficou em US$ 31,54 bilhões, alta de 19,88% em termos anuais.

Segundo um levantamento feito pela Associação Brasileira de Empresas Chinesas, no ano passado mais de 300 companhias do país asiático investiram um total de US$ 40 bilhões no Brasil. Essas empresas contrataram mais de 20 mil pessoas.

Para Evandro Menezes de Carvalho, diretor do Centro Brasil-China da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e professor de Direito Internacional da Universidade Federal Fluminense, a iniciativa já é uma realidade no Brasil e no seu entorno regional.

"Não se trata de promessa. Os investimentos chineses já estão na América do Sul, já estão no Brasil. A ideia é promover as relações comerciais a partir da construção de estradas, ferrovias, ampliação das malhas aéreas e da via marítima. Isso tem um sentido concreto. Essa infraestrutura e integração do comércio terão como consequência a promoção de um maior contato dos povos", explicou o professor brasileiro à Xinhua.

Por oito anos consecutivos, a China tem sido o maior parceiro comercial do Brasil. Segundo o Ministério do Comércio da China, o comércio de mercadorias entre os dois países chegou a US$ 74,8 bilhões em 2017. E o futuro desse mercado poderá ser ainda mais promissor. Entre janeiro e setembro de 2018, o valar do comércio China-Brasil foi de US$ 81,75 bilhões, um aumento anual de 22,60%. Durante o período, as importações chinesas desde o Brasil chegaram a US$ 56,29 bilhões, uma alta anual de 23%, enquanto as exportações do país asiático para o Brasil foram de US$ 25,46 bilhões, um crescimento de 21,80%.

"O caminho do desenvolvimento chinês é centrado no princípio da cooperação. É um caminho civilizacional muito particular, que precisa de olhares apropriados para ser interpretado adequadamente. A China procura fortalecer seus vínculos de amizade com os demais países com base, principalmente, em um relacionamento econômico mutuamente benéfico. A ascensão econômica da China abre, inclusive, uma nova janela de oportunidade para o fortalecimento da soberania de muitos países em desenvolvimento, especialmente países de médio porte, como é o caso do Brasil. Porém, cabe saber aproveitá-la", explicou o professor José Medeiros.

O Brasil foi o país convidado de honra da Exposição Internacional de Importação da China (CIIE, em inglês), realizada em novembro de 2018. Ao todo, 87 empresas brasileiras de diversos setores, como alimentos e bebidas, comércio e serviços, acessórios e bens de consumo e equipamentos médicos, participaram do evento juntamente com uma comitiva de empresários e representantes do governo brasileiro organizada pela Agência Brasileira de Promoção de Exportação e Investimentos (Apex-Brasil).

Segundo Márcia Nejaim, diretora de Negócios da Apex-Brasil, no futuro cerca de 500 empresas brasileiras deverão entrar na China por meio de plataformas de comércio eletrônico.

No setor de investimento, as aplicações chinesas no mundo lusófono totalizaram mais de US$50 bilhões, sendo a China um dos maiores investidores estrangeiros também em Portugal e Moçambique. Empresas do país asiático cooperam com empresas lusófonas através de novas formas de cooperação em setores como eletricidade e seguros.

Para o embaixador de Portugal em Beijing, José Augusto Duarte, a China é um grande investidor e esses investimentos têm contribuído para criar novas vagas de trabalho e dado uma contribuição muito importante para a economia de Portugal. Segundo ele, antes a China era um país muito importante para Portugal do ponto de vista da história, mas desde 2011, tornou-se também importante sob uma perspectiva econômica, passando a ser um dos principais investidores no país europeu.

"Refiro-me a uma série de empresas estatais e privadas chinesas que têm investido e feito suas opções estratégicas em Portugal, em setores tão diferentes como a saúde, energia, o sistema bancário, o sistema de seguros, água e tratamento de água", indicou o embaixador. O diplomata acrescentou que estes investimentos aproximam os dois países e "criam novas parcerias, novos interesses conjuntos". "Nós sentimos que juntos temos mais a ganhar do que separados", completou.

Durante a Cúpula de Beijing do Fórum de Cooperação China-África (FOCAC), realizada em setembro de 2018 em Beijing, foi garantida a inclusão da África na Iniciativa do Cinturão e Rota. A inclusão da África nos projetos de cooperação da China, especialmente aqueles ligados ao Cinturão e Rota, já é uma realidade. Exemplos dessa nova realidade africana que fala português são a Ponte Maputo-Katembe, em Moçambique e o Caminho de Ferro de Benguela, em Angola. Simbólico e pragmático foi a participação de São Tomé e Príncipe na Cúpula de Beijing do FOCAC deste ano. Além de São Tomé e Príncipe, estiveram presentes na reunião todos os outros países africanos de língua portuguesa – Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau e Moçambique.

Para José Medeiros, a distância geográfica que separa os países de língua portuguesa da China não é um impedimento. "Quanto mais o Brasil e os países que falam a língua de Camões dialogarem e interagirem com a China, mais nos aproximaremos do denominador comum dessa 'vontade', criando novos caminhos para o reforço da amizade entre nossas civilizações e contribuindo para a construção de um mundo onde as diferenças possam ser celebradas e a paz fortalecida", acrescentou.

Neste sentido, a Iniciativa do Cinturão e Rota ganha destaque ainda maior na cooperação atual entre a China e os países lusófonos. Todos os países lusófonos são litorais ou insulares, e Portugal, Moçambique e Timor Leste ficam ao longo da antiga Rota da Seda Marítima, o que mostra a nova vitalidade que a Iniciativa do Cinturão e Rota pode desempenhar.

A cooperação econômica e comercial entre a China e os países lusófonos está num novo ponto de partida e terá mais avanços no âmbito da iniciativa do Cinturão e Rota. Para ajudar na sua construção e fortalecer o diálogo intercultural, a China sediará em 2019 o 2º Fórum do Cinturão e Rota para Cooperação Internacional. Para os países ao longo do cinturão, especialmente os países em desenvolvimento, o fórum proporcionará um espaço para os países participantes dialogarem em torno de um projeto que proporciona-lhes uma janela histórica de desenvolvimento pacífico e cooperativo. Os países de língua portuguesa podem e devem aproveitar a oportunidade.