Relação com Deus é disfarce para abusadores, diz líder de associação

Americano que lidera associação de vítimas de padres acusados de abusos sexuais diz que religiosos como João de Deus têm facilidade para obter confiança de vulneráveis

Tim Lennon - Divulgação

Em entrevista publicada nesta quarta-feira (19) no jornal Folha de S. Paulo, o ativista americano Tim Lennon, 71, comenta o ruidoso caso do médium brasileiro João Teixeira de Faria, 76, o João de Deus, acusado por mais de 400 mulheres de ter cometido abusos sexuais durante atendimentos espirituais que fazia em seu centro na cidade de Abadiânia (GO). O médium nega as acusações.

Aos 12 anos, Lennon, filho de uma tradicional família católica irlandesa, foi molestado e estuprado por um padre da sua paróquia.

Nos anos 1990, ele se juntou à associação norte-americana Survivors Network of Those Abused by Priests – Snap (Rede de Sobreviventes de Abusados por Padres, na sigla em inglês). Foi da diretoria por oito anos e hoje é presidente da rede, que reúne cerca de 25 mil sobreviventes nos Estados Unidos e tem participantes em 60 países.

Fundada em 1988, a Snap é referência mundial em casos de abuso sexual por religiosos. A rede organiza grupos de sobreviventes, pressiona por mudanças nas leis americanas e cobra respostas da Igreja Católica. Um dos membros da Snap, Phil Saviano, é retratado no filme “Spotlight: Segredos Revelados”, que ganhou o Oscar em 2016.

Para o americano, líderes religiosos se aproveitam da sua autoridade para se aproximar dos alvos. “Eles usam a sua posição de poder, como alguém supostamente próximo de Deus, para obter a confiança das vítimas.”

Segundo ele, a fé e o poder que a própria vítima confere ao líder religioso a tornam mais vulnerável. "Uma pessoa que não seja crente, um cético, teria menos chances de cair nessa situação. Quando uma pessoa chega vulnerável, por doença ou questões psicológicas, elas dão ainda mais poder ao líder com a esperança de serem curadas. No caso de João de Deus há uma cidade inteira que ajuda a criar esse mito e prestígio", diz Lennon.

O ativista também conta como reconhecer e denunciar o crime é um passo importante no processo de superação do trauma e como sofre até hoje as consequências do abuso. “Não é como um braço quebrado, que se regenera. É para a vida toda.”

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