Cotas na USP: o que mudou e quais os próximos desafios?

A adoção de cotas pela USP foi tardia e fruto de mais de uma década de luta de toda a comunidade universitária em torno do tema.

Por Bianca Borges*

Cotas raciais - Reprodução

Em 2017, o Conselho Universitário da USP, uma das universidades mais elitizadas do país, aprovou a abertura de 1.088 vagas para alunos de escolas públicas, entre as quais 745 deveriam ser ocupadas por pretos, pardos e índios. Neste ano, pela primeira vez, a universidade fundada em 1934 recebeu alunos cotistas ingressantes pela FUVEST. A adoção de cotas pela USP foi tardia e fruto de mais de uma década de luta de toda a comunidade universitária em torno do tema. Agora, com a conquista que possibilitará, nos próximos anos, o ingresso de mais milhares de estudantes que pertencem à uma parcela da sociedade historicamente excluída das universidades públicas, os três setores da universidade permanecem mobilizados para a superação dos desafios que esses ingressantes enfrentam ao iniciar o ano letivo.

A adoção de cotas vem para suprir uma demanda que há muito tempo é reconhecida. Em 2017 o número de ingressantes de escolas públicas foi de apenas 36,9%. A meta de inclusão da universidade estabelecida em 2013 previa que em 2018 ano já deveria ter sido alcançado o número de 50% de matrículas de estudantes de escola pública. Com a aprovação da nova política de ingresso, a meta é de que esse percentual seja atingido em 2021, com 37% dos estudantes sendo pretos, pardos e indígenas.

A chegada dos cotistas é fundamental para a democratização do ensino e, também, para uma verdadeira transformação no conhecimento que é produzido. Como uma universidade de pesquisa, a USP produz ciência e tecnologia de ponta, mas a pesquisa realizada pelos corpo docente e discente permanece afastada das necessidades da população brasileira, e para a promoção do desenvolvimento econômico, social e cultural do país é imprescindível que a universidade esteja conectada às diversidades e realidades existentes em nossa sociedade.

A chegada desses estudantes que, muitas vezes, fazem parte da primeira geração da família a ter acesso ao ensino superior impõe novos desafios aos quais a universidade tem a responsabilidade de responder à altura. Os desafios para a permanência, que sempre existiram, tendem a se acirrar e é fundamental que exista uma política de assistência estudantil que garanta que esses ingressantes tenham bom aproveitamento da graduação e se formem e que compreenda a permanência em suas três esferas: econômica, acadêmica e psicológica.

Diante do reconhecimento desta necessidade, o movimento estudantil desempenhou um papel importante. O Diretório Central dos Estudantes “Alexandre Vannucchi Leme”, entidade tradicional e representativa dos estudantes de graduação e da pós, conquistou este ano a ampliação dos critérios para concorrer aos auxílios socioeconômicos da universidade e uma ampliação de 3,2 milhões de reais a mais de investimento em permanência estudantil no próximo ano, valor que está previsto no relatório do orçamento da universidade para 2019 e cuja aprovação se dará no Conselho Universitário no próximo mês.

Não restam dúvidas a respeito da transformação positiva na universidade que é fruto de sua democratização. Cabe, agora, à comunidade universitária a defesa intransigente das ações afirmativas e das políticas necessárias à permanência dos novos ingressantes na universidade, assim como a derrubada das barreiras ainda existentes para o ingresso. Afinal, a conquista de cotas para estudantes PPI e de escola pública representou um passo, mas a luta pelas cotas sociais e pelo vestibular indígena ainda são desafios que estão no horizonte.