Mourão diverge de Bolsonaro em entrevista à Folha de São Paulo

Em entrevista, vice manteve a linha de defesa econômica liberal de Paulo Guedes, mas preferiu ser comedido contra posturas já explícitas de Jair Bolsonaro em relações comerciais com outros países.

bolsonaro e mourão

Contrariando algumas posições do futuro presidente Jair Bolsonaro, o vice eleito, general Hamilton Mourão, defendeu o diálogo comercial da China aos Estados Unidos, mostrou-se receoso de algumas posturas de Bolsonaro, como o anúncio de mudar a embaixada em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, e o enfraquecimento da participação brasileira no Mercosul.

"Antes de pensarmos em extinguir, derrubar, boicotar, temos que fazer os esforços ainda necessários para que atinja os seus objetivos", defendeu em entrevista à Folha de S.Paulo, sobre o bloco econômico. Ao fazer a entrevista, a equipe do jornal descreveu o vice-presidente eleito como "amistoso e acessível" e ocupado com as tarefas de transição.

Sobre o receio da volta do regime militar que manteve a ditadura no país, Mourão disse que não há a "tutela militar". "O país entrou numa tal rota de falta de ética, de corrupção, ineficiência e má gestão que a população como um todo passou a se voltar para as Forças Armadas. E as Forças Armadas se mantiveram calmas e tranquilas em suas funções. Ninguém saiu do quartel nem nada", afirmou.

Na conversa, Mourão indicou que a soberania brasileira não será uma prioridade, dando privilégio a relações como com os Estados Unidos. Mas, da mesma forma como defendeu que não se pode "descuidar" dos americanos, também defendeu o diálogo com a China, por exemplo.

Não teve receio de contrariar o futuro mandatário, Jair Bolsonaro, contestando por exemplo a opinião dele a respeito das relações comerciais com a China, que tomaram grande repercussão, chegando aos ouvidos da própria potência oriental.

E na contramão do que vinha tentando o próprio presidente eleito, de distanciar sua imagem da de Donald Trump, disse que "eles são meio parecidos": "É óbvio que com os EUA, vamos colocar assim, tanto o presidente Bolsonaro quanto o presidente [Donald] Trump têm uma forma peculiar de lidar com o mundo exterior. Eles são meio parecidos nisso aí."

"Mas Trump comanda a maior economia do mundo e pode comprar certas brigas. Eu acho que o presidente Bolsonaro não vai poder", questionou a reportagem. "Exatamente. Nós podemos comprar as brigas que podemos vencer. As que a gente não pode, não é o caso de comprar", respondeu. Ainda, descartou a possibilidade de o Brasil fazer uma intervenção na Venezuela.

Sobre a questão da possível mudança da embaixada israelense de Tel Aviv para Jerusalém, Mourão preferiu dizer que "é óbvio que a questão terá que ser bem pensada. É uma decisão que não pode ser tomada de afogadilho, de orelhada. Nós temos um relacionamento comercial importante com o mundo árabe. E competidores que estão de olho se perdermos essa via de comércio."

Disse que, apesar de integrantes das Forças Armadas comporem o governo de Bolsonaro, não irão "sair do quartel" para comandar o país, mas não negou a possibilidade de uma intervenção em caso de "caos".

"Qual é a nossa missão? Defesa da pátria, garantia dos poderes constitucionais, garantia da lei e da ordem. Então tudo aquilo que poderá perturbar o desempenho de qualquer um dos Poderes constitucionais ou a lei e a ordem é algo que nos preocupa. Vamos imaginar que os dois lados começassem a se digladiar na rua. Qual é a única hipótese que poderia haver de as Forças Armadas terem que intervir? Se houvesse o caos", disse.