No futebol como no jazz – Por mais improviso e menos apostilas

O lúdico se perdeu nas apostilas ou como deixei de ver Jo Jones* no futebol brasileiro.

Por Lu de Castro*

futebol feminino - Foto: Marcos Paulo Rebelo/CBF.

Inevitável deixar de falar de mais uma eliminação em fase de grupos de uma seleção brasileira, ainda que seja a feminina e, portanto, com anos de atraso em seu desenvolvimento mais pleno.

O Mundial Feminino Sub-17 teve início no Uruguai no dia 13 de novembro com a seleção brasileira integrando o Grupo B. As adversárias: Japão, México e África do Sul. A campanha brasileira foi de 1 vitória, 1 derrota e 1 empate com 4 gols marcados e 2 sofridos. Em tese num grupo fraco, com grandes chances de avançar, mas a história repetiu o Mundial anterior.

Na Jordânia, em 2016, diante de um grupo teoricamente mais forte, a seleção brasileira caiu na primeira fase com 1 vitória, 2 derrotas, 2 gols marcados e 3 sofridos.

Em 2008, no Mundial da Nova Zelândia, o Brasil ficou em último lugar em seu grupo, composto por Inglaterra, Coréia do Sul e Nigéria. Foram 2 derrotas e 1 empate com 7 gols sofridos e 3 marcados.

Em Trinidad e Tobago em 2010, avançou às quartas, mas parou diante da Espanha com derrota por 2 a 1. No Azerbaidjão em 2012, também parou nas quartas de final diante da Alemanha, com placar de 2 a 1. Em 2014 o Brasil não participou do mundial, retornando em 2016 com Luisão no comando.

É importante destacar, porém, que Luisão assumiu o comando da seleção sub-17 em 2015 com a tarefa de melhorar o desempenho do selecionado cuja formação em clubes mal existia, situação que tem melhorado nos últimos anos, mas os resultados nos dois últimos mundiais foram piores que nos dois anteriores.

É interessante observar o crescimento da preocupação com a base e a caída no rendimento na competição mundial quase na mesma proporção. Enquanto se exige certificações e estudos mais aprofundados das técnicas e todos os assuntos que permeiam o alto rendimento, o futebol prodigioso a que nos acostumamos, vai sendo subtraído do nosso imaginário.

Luisão, treinador do sub17 feminino

Não carece de muita pesquisa, basta acompanhar o futebol das últimas décadas para perceber o quanto nos distanciamos do futebol arte, leve e livre. Nos aproximamos dos conceitos científicos, dos termos técnicos e de uma certa disciplina incômoda dentro das quatro linhas.

É como se perdêssemos a ginga, a qualidade do drible objetivo, a alegria em estar na presença da bola. Desqualificamos o passe, como se dele não saíssem as jogadas definitivas. O que importa é o quanto o atleta correu no tempo em que esteve em campo.

Não, não estou desprezando os estudos, mas não podemos perder o lúdico, o improviso, o refinamento do toque para o drible bonito, o arrojo de uma jogada para ser concluída com o gol e, sobretudo, a alegria.

Mais improviso!

Arrisco-me a fazer uma comparação pouco usual dentro deste contexto, aliás, os links são minhas linhas prediletas enquanto escriba, mas gostaria de ver mais Jo Jones no futebol. Explico no asterisco.

*Jo Jones foi um baterista de jazz com técnica incomparável, destruía o instrumento harmonicamente, invertia as mãos sem nunca perder o compasso. Desempenhando sua técnica e habilidade em solos absurdamente melodiosos, Jo Jones sorria o tempo todo, ainda que todo o seu esforço ficasse óbvio diante do suor que o impregnava.

Nos apegamos demasiado na apostila e nos esquecemos da liberdade de criar. No campo de jogo ou da música, ser livre pressupõe aplicar suas técnicas de maneira cadenciada e aprazível sem ser displicente. Atingir o objetivo da perfeição em qualquer momento da condução do jogo ou do som com o fim único de regozijar a alma do espectador.

Não tenho visto futebol como tenho ouvido música. Meus olhos tem se negado a apreender o que capta, ao contrário dos meus ouvidos que sobrevivem de relembrar Jo Jones apenas pelo youtube. Se o humano é finito, o jogo segue e é preciso voltar a ser melódico.

Assista um pouco dos dribles de Jo Jones na bateria: