A arte traz esperança neste período crítico, diz vencedor do Jabuti

“En la lucha de clases
todas las armas son buenas
piedras
noches
poemas”
(Leminski).

Os versos de Paulo Leminksi vêm certeiros neste cenário nebuloso onde o que se destaca são os ataques contra os direitos conquistados, a censura ao pensamento crítico e a desvalorização das artes. “A literatura e a arte devem suscitar a esperança”, é o que defende o vencedor do Prêmio Jabuti de poesia deste ano, Maílson Furtado Viana, autor da obra “à cidade”.

Por Mariana Serafini

Maílson Furtado - Divulgação

Se impor através das artes neste momento de retrocesso já é um ato de resistência, mas Mailson foi além. O cearense de Varjota recebeu o maior prêmio literário do país, o Jabuti, com seu livro “à cidade”, publicado com recursos próprios, de forma independente.

O prêmio, para ele, é uma prova de que é possível encarar “de forma muito honesta” o mercado editorial “por vezes bastante cruel”. “A poesia tem o papel de incomodar, e o próprio ato de publicar de forma independente é uma quebra no status quo”.

Apesar de trazer marcas da região onde Mailson cresceu e vive até hoje, “à cidade” abrange “até onde vai o trem, por consequência, diz respeito a qualquer cidade sertaneja”. “O Ariano Suassuna traz muito marcada a geografia e as questões folclóricas, isso foi muito impactante pra mim e me deu vontade de fazer algo neste sentido sobre a região onde eu moro”.

Além de poeta, Mailson é diretor de teatro na Companhia Teatral Criando Arte, e servidor público no município de Reriatuba. Admirador declarado dos poetas do sertão, ele bebeu na fonte de João Cabral de Melo Neto e Ariano Suassuna para trazer um olhar particular sobre a paisagem que o rodeia.

O livro traz uma única poesia, de 60 páginas, que ele construiu ao longo de uma ampla pesquisa histórica, e folclórica em busca da identidade do povo de Varjota. Neste aspecto, o autor se inspirou na obra de Gerardo Mello Mourão, “me apeguei muito no conceito histórico, ele constrói uns cenários em cima de epopeias”, conta.

“à cidade” é o terceiro livro de Mailson, que, segundo ele, tem também muito de suas obras anteriores, sua influência do cordel e da poesia marginal dos anos 70, especialmente Leminski, Ana Cristina Cesar e Chacal.

“Esse prêmio foi um ato de resistência contra esse momento crítico que a gente vive, onde colocam a cultura e a arte de canto, e a própria poesia. A arte deve suscitar esperança. A gente precisa acreditar que é possível esperar por algo melhor, e a arte tem vem neste sentido”, finaliza o vencedor do Jabuti.