O Hamas e o futuro da Palestina

Os palestinos sedentos de justiça e frustrados com o colapso das negociações, continuarão a acreditar que a resistência é o único caminho e se aproximarão cada vez mais do Movimento de Resistência Islâmica.

Por Sayid Marcos Tenório*

Palestina Hamas

Muito tem se falado sobre Movimento de Resistência Islâmica, o Hamas. O partido palestino é assunto constante em muitos noticiários em virtude de suas ações de resistência contra a ocupação israelense, principalmente em Gaza, onde se localiza a sua maior base social e o seu comando político e militar. EUA, Israel e outros países o declaram como organização terrorista que ameaça a existência de Israel. Países como a Rússia, África do Sul, Noruega, Irã e o Brasil não consideram o Hamas como organização terrorista, mas um legítimo movimento de resistência palestino.

Qualquer um de nós que der um “Google” buscando pela palavra “Hamas”, receberá uma infinidade de links dando conta de supostas ações terroristas, ataques com mísseis caseiros disparados de escolas contra cidades israelenses, homens e mulheres bombas, pipas incendiárias, crianças servindo de escudo humano e uma série de outras fantasias disseminadas principalmente por fontes israelenses e de organizações judaicas espalhadas pelo mundo afora.

Mas… o que é mesmo o Hamas? Diferentemente do que imaginamos no Ocidente, o Hamas não é um “grupo terrorista” cujo objetivo tem sido o de atacar Israel sem propósito, a dita “única democracia do Oriente Médio”. A verdade é que se trata de um partido político legalmente constituído e em franca ascensão nos territórios palestinos ocupados, um movimento nacional palestino, de orientação islâmica, de libertação e resistência, que representa uma das principais forças do nacionalismo islâmico na Palestina.

Fundado em 1987, no início da Primeira Intifada (revolta palestina), é hoje o maior dos vários grupos e partidos palestinos, com uma base social muito forte nos territórios palestinos de Gaza e da Cisjordânia. Sua meta é “libertar a Palestina e confrontar o projeto sionista”, conforme anunciado no recente “Documento de princípios gerais e políticas”, aprovado em maio de 2017.

O movimento é reconhecido por muitos como uma força popular e sociopolítica profundamente enraizada na sociedade palestina, que tem conseguido realizar um amplo trabalho, tanto em relação ao confronto militar contra a ocupação sionista, quanto aos trabalhos sociais voltados para as camadas mais desfavorecidas, através da assistência social, mobilização religiosa e ideológica e mantido relações com Estados, partidos e movimento em todo o mundo.

O Hamas surgiu com força perante o olhar do ocidente, após o resultado das eleições para o Conselho Legislativo Palestino, realizadas em 25 de janeiro 2006. O resultado foi surpreendente, tendo o Hamas eleito 76 dos 132 deputados, enquanto que o seu maior rival, o Fatah, conseguiu 43 cadeiras. A pergunta imediata foi: como o Hamas conseguiu vencer as eleições na Palestina, sedo um movimento quase proscrito? A vitória do Hamas foi resultante da sua oposição aos processos de Oslo, e as divisões internas no Fatah, conduziram à vitória eleitoral em 2006. Essa vitória eleitoral nunca foi reconhecida pelas potências ocidentais, tendo a Faixa de Gaza sido sitiada e transformada na maior prisão a céu aberto do mundo.

Durante o processo eleitoral palestino, o Movimento lançou uma “Plataforma eleitoral por mudanças e reforma”, onde a questão da resistência militar ficou relegada a um plano secundário, abordando a questão numa linguagem mais sutil do que a linguagem empregada nas plataformas anteriores. Assim, a formulação de “destruição de Israel” – slogan fartamente utilizado pela mídia ocidental para demonizar o Hamas – deu lugar a expressão “término da ocupação”, que dominou toda a Plataforma.

A Plataforma se baseava na ideia de um programa abrangente para a libertação da Palestina, o retorno do povo palestino às suas terras e o estabelecimento de um Estado palestino independente com Jerusalém como sua capital, numa clara rejeição aos Acordos, mesmo sabendo que este tema seria pouco convincente para muitos palestinos, uma vez que a existência do Conselho Legislativo é inseparável dos Acordos de Oslo.

Esse foi um tema que teve forte repercussão nos debates eleitorais e que provocou uma elevação do tom contra o al-Fatah, com o Hamas afirmando que sua participação no Conselho Legislativo seria parte do seu “programa de resistência” e que a realidades mostrava que Oslo era questão sem cumprimento por parte de Israel, letra morta num papel que era usada contra os palestinos.

O Hamas acusava a OLP de ter se transformado de um movimento para a libertação da Palestina, num garantidor indireto da segurança de Israel nos territórios ocupados, com a função de anular qualquer forma de resistência à ocupação. Um instrumento utilizado por Yasser Arafat e seus aliados para garantir sua permanência no poder da ANP como único representante dos palestinos. Por outro lado, reclamava de que as negociações de paz de Oslo tinham servido apenas aos interesses das lideranças da OLP, que deixaram o exílio para assumir o controle político da palestina.

Havia, naquele momento, uma inquietude e uma desconfiança em relação ao papel da ANP pós os Acordos de Oslo, onde o Hamas acusava a ANP de ser preposto de Israel na Palestina. E apontava como evidência o fato de a ANP estar concentrando seus esforços e os recursos financeiros nos programas de cooperação em segurança com Israel, enquanto que o bem-estar da população ficava em segundo plano. Dizia ainda, que a cooperação em segurança entre ANP e Israel, visava coibir e entrincheirar os movimentos palestinos e a atuação dos grupos de oposição que representassem ameaça a Israel.

Hoje em dia, passados 25 anos desde a assinatura dos Acordos de Oslo, o entendimento do Hamas é que aqueles Acordos puseram na mesa objetivos contraditórios e sabidos de difícil aplicação, uma vez que a OLP declarava a busca pelo fim do colonialismo israelense, enquanto que o Estado de Israel tinha como objetivo criar um sistema de controle indireto sobre os territórios ocupados em 1967.

Os objetivos dos Acordos jamais se concretizaram, deixando em aberto até hoje questões listadas na “Declaração de Princípios”, como o status de Jerusalém, a questão dos refugiados, os assentamentos judaicos em território palestino, a questão da segurança e das fronteiras, as relações e cooperação com os vizinhos e outras questões referentes a problemas de interesse comum.

O escritor Edward Said, em seu livro A Pena e a Espada (2012) narra sua decepção com os resultados daqueles acordos, dizendo ter “uma convicção muito forte, depois do acordo de Oslo, de que a discrepância entre aquele maldito pedaço de papel e a enorme história de expropriação, sofrimento e perda que constituem a verdadeira história palestina é tão grande, mas tão grande, que deve ser contada. Ela tem que ser narrada. Não pode simplesmente desaparecer. ”

O processo de paz que esperava-se existir após os Acordo de Oslo não representou os diversos setores políticos palestinos e nem israelenses. Eles foram combatidos pela esquerda palestina, sobretudo pela Frente Popular de Libertação Nacional (FPLN) e pela Frente Democrática de Libertação Nacional (FDLN). E também pelos movimentos de orientação islâmica, como Hamas e a Jihad Islâmica.

Embora fosse sabido os acordos não resultariam na criação de um estado palestino, mas apenas sobre a representação dos residentes nos territórios ocupados, setores da extrema direita israelense também demonstraram seu descontentamento e se opuseram fortemente aos acordos de paz com palestinos. Queriam (e continuam querendo) todo o território e nenhuma concessão a palestinos. O premiê sionista que negociou os acordos, Yitzhak Rabin, foi assassinado por um extremista em 04 de novembro de 1995.

Quando foram assinados os Acordos de Oslo, em 1993, havia 260.000 colonos judeus na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental. Hoje, esse número subiu para mais de 600.000, evidenciando o desprezo do Israel para com os Acordos e seu interesse pela Paz. Além da evidente violação do Artigo 49 da IV Convenção de Genebra, de 1949, que proíbe claramente os países de mover populações para territórios ocupados em guerra. Com isso, Israel demonstra mais uma vez o seu desrespeito pela lei internacional e os direitos humanos, através do descumprimento dos Acordos de Oslo.

Nas eleições de 2006, o Movimento declarou ser necessário e urgente a adoção de um compromisso mais abrangente da luta contra a ocupação, que se daria por meio de uma mudança e reforma que seriam empreendidas para que se construísse “uma sociedade civil palestina avançada, baseada no pluralismo político e na alternância do poder.” Declarou também que “o sistema político da sociedade palestina e sua agenda reformadora e política, seriam orientadas na direção do cumprimento dos direitos nacionais palestinos.”

Essa proposta era uma crítica dirigida ao monopólio do poder por parte da OLP, que havia negligenciado em promover a unidade e disciplina no cenário político palestino, já que se encontrava no poder desde a década 1960 e nunca havia incluído em sua pauta a possibilidade de que outras forças políticas palestinas e da resistência tomassem parte Autoridade Nacional Palestina.

Era um programa amplo, que além da resistência à ocupação israelense, tratava de assuntos internos e externos, como a reforma administrativa, o combate a corrupção, ao clientelismo e a troca de favores, se encarregava da reforma judicial e política, liberdade do povo e direitos civis, orientação religiosa, política social, política cultural e de mídia. Tratava também de questões como políticas para a juventude e mulheres, saúde, ambiental, habitacional, agrícola, política econômica, financeira e fiscal, questões trabalhistas, e questões de transporte, como a passagem entre Gaza e a Cisjordânia, já que a Declaração de Princípios previa no Art. 10º, cláusula 1, sub-cláusula, a existência de “uma passagem segura a ligar a Cisjordânia com a Faixa de Gaza para a deslocação de pessoas, veículos e bens”. Estas cláusulas eram violadas diariamente pelos soldados e polícias israelitas que não só não controlavam as passagens, como praticavam (e continuam praticando) atos violentos nos check-points, transformando as travessias em pesadelos e a Cisjordânia num espaço fragmentado, sem ligações entre si ou com a Faixa de Gaza.

Foi com esse programa e com a mobilização ampla, principalmente dos jovens palestinos cansados de esperar pelos seguidos acordos não cumpridos por Israel, que o Hamas conseguiu a maioria dos votos para o Conselho Legislativo Palestino.

Vitorioso, o Hamas apresentou a sua “Plataforma de governo”, baseada em sete pontos: 

Primeiro: resistir à ocupação e às investidas opressivas contra a terra palestina, seu povo, recursos e lugares sagrados;

Segundo: garantir a segurança dos palestinos e acabar com o caos na segurança;
Terceiro: diminuir as dificuldades econômicas do povo palestino;

Quarto: empreender reformas e lutar contra a corrupção financeira e administrativa;

Quinto: reordenar os assuntos internos palestinos por intermédio da reorganização de suas instituições sobre uma base democrática que garantiria a participação política para todos;

Sexto: fortalecer o status da questão palestina nos círculos árabes e muçulmanos e;

Sétimo: desenvolver as relações palestinas nos níveis regional e internacional para que sirvam posteriormente aos principais interesses do povo palestino.”

Essa Plataforma permitiu à liderança reclamar o respeito da comunidade internacional quanto a escolha do povo palestino ao eleger o Hamas. Quanto aos EUA e suas posições a respeito do governo do Hamas, o Movimento afirmou que exigia da administração norte-americana – que vive pregando a democracia e o respeito pelas escolhas das pessoas por todo o mundo – que apoiasse o desejo e escolha do povo palestino. “Em vez de ameaçar os palestinos com o boicote e o corte aos auxílios, ele deve cumprir as promessas que fez de ajudar no estabelecimento de um Estado palestino independente com Jerusalém como capital e o retorno dos refugiados”.


O futuro da Palestina na visão do Hamas

No recente “Documento Geral de Princípios e Políticas”, aprovado em maio de 2017, o Hamas apresenta uma plataforma política, onde aborda questões como a definição da territorialidade palestina, estabelece sua compreensão da causa palestina, os princípios de trabalho a serem usados para promover seus objetivos e os limites de flexibilidade usados para interpretá-lo.

Assim, na visão do Hamas, “a Palestina é o território que se estende do Rio Jordão no oriente ao Mediterrâneo no ocidente e de Ras Al-Naqurah no norte a Umm Al-Rashrash no sul, é uma unidade territorial integral. Esta é a terra e o lar do povo palestino. A expulsão e o banimento do povo palestino de sua terra e o estabelecimento da entidade sionista em seu lugar não anula o direito do povo palestino sobre sua inteira terra e não reconhece nenhum direito nela pela usurpadora entidade sionista. A Palestina é uma terra árabe islâmica. Ela é uma terra sagrada e abençoada que tem lugar especial no coração de todo árabe e de todo muçulmano.”

O Documento assegura que o povo palestino é constituído pelos árabes que viveram na Palestina até 1947, independente se eles foram expulsos ou permaneceram após a Nakba (tragédia). “Cada pessoa que nasceu de um pai árabe palestino após aquela data [1947, início da ocupação sionista], se dentro ou fora da Palestina, é um palestino. (…) O povo palestino é um, feito por todos os palestinos dentro e fora da Palestina, independentemente de sua religião, cultura ou afiliação política. ”

Para o Hamas, independente das catástrofes que recaíram sobre o povo palestino desde 1948, como consequência da partilha e da ocupação sionista e sua política de deslocamento e limpeza étnica, a identidade palestina não será apagada nem negada. Um palestino ou palestina jamais perderá a sua identidade nacional e os direitos, mesmo depois de adquirir uma segunda nacionalidade. A Palestina será sempre “a terra do povo que está determinado a defender a verdade – dentro de Jerusalém e suas redondezas – que não é desterrado ou se intimida por aqueles que se opõem a ele e por aqueles que os traem, e ele continuará sua missão até que a promessa de Deus se cumpra.”

O movimento denuncia o projeto sionista como baseado na agressão racista, colonial e expansionista, hostil ao povo palestino e o seu direito à liberdade, libertação e autodeterminação
Jerusalém, para o Movimento, é a capital da Palestina. E afirma que o seu status religioso, histórico e civilizacional é fundamental ao mundo em geral, independentemente de ser cristão, muçulmano, druso, armênio ou judeu, árabes ou ocidentais. O mesmo ocorre para com os lugares sagrados. E declara que as medidas tomadas pelo ocupante sionista como a judaização de Jerusalém, através da construção de assentamentos como fato consumado da presença israelense na cidade sagrada, são ações nulas e vazias porque contrariam as regras e o Direito Internacional.

Alerta ao mundo que a ação dos sionistas não visa apenas a Palestina, mas a Nação Árabe e Islâmica, constituindo-se numa grande ameaça a segurança internacional, a paz e a estabilidade da região. Na mesma linha, o Hamas refuta a ideia de que o conflito que se estende por mais de 70 anos, não é uma guerra contra judeus por serem judeus, embora o sionismo se esforce para identificar o judaísmo e os judeus com o seu projeto apartheid colonial. Mas assevera que trava uma luta contra os sionistas que ocupam a Palestina.

Ao rejeitar o viés religioso ou sectário da luta contra a ocupação, o Hamas condena qualquer forma de perseguição a qualquer ser humano ou a negação dos seus direitos. Para o Movimento, “o problema judaico, o antissemitismo e a perseguição de judeus é um fenômeno fundamentalmente ligado à história europeia, não à história dos árabes e muçulmanos ou seus herdeiros. O movimento sionista, que foi capaz de ocupar a Palestina com apoio das potências do Ocidente, é a maior ameaça de ocupação por assentamentos que já desapareceu de grande parte do mundo e precisa desaparecer da Palestina.”

O Movimento de Resistência Islâmica aponta em seu “Documento Geral de Princípios e Políticas” um elenco de posições atualizadas para a luta de resistência e a busca de soluções para o problema da ocupação sionista na palestina. Entre elas está a rejeição e nulidade de documentos como a Declaração Balfour, o documento do Mandato Britânico, a resolução da ONU sobre a partilha da Palestina e os Acordos de Oslo, pois considera que eles geraram ações que violaram os direitos do povo palestino, usurpando suas terras e banindo-os de seus lares. Assim, a “resistência e luta para a libertação da Palestina continuará sendo um direito legítimo, um dever e uma honra para todos os filhos e filhas de nosso povo e nossa Nação”,
Segundo o Documento, o estabelecimento de chamado “Estado de Israel” com base naquelas decisões unilaterais, é completamente “ilegal e transgride o inalienável direito do povo palestino e vai contra sua vontade e a vontade da Nação; é também uma violação dos direitos humanos que são garantidos por convenções internacionais, o primeiro entre eles é o direito à autodeterminação.”

O Hamas também afirma que não reconhecerá “Israel” nem nada do que aconteceu na Palestina em termos de ocupação, construção de assentamentos, judaização de lugares históricos e sagrados ou mudança nas características ou falsificação de fatos, por entender que o direito dos palestinos sobre sua terra e lugares jamais caducarão.

Embora rejeite uma solução que não seja a libertação da Palestina, “do rio ao mar”, sem comprometer sua rejeição a “Israel” e sem abandonar qualquer direito dos palestinos, o Hamas considera o “estabelecimento de um totalmente soberano e independente Estado palestino, com Jerusalém como sua capital ao longo das fronteiras de 4 de junho de 1967, com o retorno dos refugiados e deslocados de seus lares dos quais eles foram expulsos, para ser uma fórmula de consenso nacional.” Rejeita qualquer tentativa de desarmar a resistência ou de inibir sua capacidade de desenvolver medidas e mecanismos de resistência, como as jornadas semanais da “Grande Marcha do Retorno”, que ocorrem em Gaza desde 30 de março e já custou a vida de centenas de mártires e deixou milhares de feridos.

Sua liderança tem declarado que acredita e se empenha pelo restabelecimento das relações e ações conjuntas das organizações palestinas, baseadas no pluralismo, democracia, parceria nacional, aceitação do outro e adoção do diálogo, como objetivo para reforçar a unidade para atender as aspirações do povo palestino. Reconhece a OLP como uma referência para o povo palestino que precisa ser preservada, desenvolvida e reconstruída em bases democráticas dentro e fora da palestina, de maneira a assegurar a participação de todas as forças que lutam para resguardar os direitos dos palestinos.

No que diz respeito a Autoridade Nacional Palestina, o Movimento considera que ela precisa servir ao povo palestino e salvaguardar a sua segurança, seus direitos e o interesse nacional, em bases democráticas e baseada na parceria nacional, incluindo o direito de resistência e eleições livres e justas. Um movimento que será enriquecido por suas personalidades proeminentes, instituições da sociedade palestina, grupos de juventude, estudantes, sindicalistas e mulheres, cujo papel é definido como fundamental no processo de construção da história palestina e no propósito de resistência e conquista da liberdade.

Referindo-se ao que chama de Nação Árabe e Islâmica, o Hamas acredita que a questão palestina é a causa central e acredita na cooperação de Estados, sem entrar em disputas que ocorram nos diversos países. E que tem se esforçado para estabelecer relações equilibradas na base de uma combinação dos objetivos da causa palestina e do interesse do povo palestino em uma mão, com interesses da Nação, seu renascimento e sua segurança em outra mão.

No que diz respeito ao aspecto humanitário e internacional, o Hamas entende que apoiar e sustentar essa causa é uma tarefa humanitária e civilizacional, já que a questão palestina é uma das que tem maior dimensão e pré-requisitos para a verdade, justiça e valores humanitários. E a resistência como uma atividade legítima, isto é, um ato de autodefesa e uma expressão do direito natural de todos os povos à autodeterminação.

Finalizando, o Documento faz um chamamento ao internacionalismo, pregando a rejeição às tentativas de imposição de hegemonias sobre nações e povos do mundo, condenando todas as formas de colonialismo, ocupação, discriminação, opressão e agressão no mundo.

Cabe aqui uma pergunta: a atualização do seu programa e a redefinição de tarefas de resistência e libertação da Palestina, tornará o Hamas mais fraco ou mais forte num futuro próximo?

O que podemos concluir é que, desde a sua fundação em 1987, o Hamas vem numa trajetória de crescimento. É certo que sofreu derrotas, contratempos e momentos difíceis, mas, em termos gerais e baseado no olhar das circunstâncias da sua história de lutas, é impossível prever se o Hamas se tornará mais forte ou mais fraco. O que podemos afirmar é que o seu crescimento será proporcional à continua brutalidade e humilhação da ocupação sionista contra os palestinos, associada ao fracasso das organizações palestinas seculares rivais do Hamas em promover soluções negociadas com Israel.

Os esforços de Israel, da mídia ocidental e da Autoridade Palestina em desacreditar e impedir o crescimento do papel do Hamas e a sua popularidade na sociedade palestina, não se concretizarão enquanto Israel exercer o controle sobre a Palestina histórica, impedindo a criação de um Estado palestino. Enquanto Israel mantiver sua ocupação e o apartheid que domina, segrega e restringe a liberdade de movimentação dos palestinos com muros e checkpoints.

Enquanto Israel limitar os cuidados com saúde, educação e impedir o acesso à terra e o desenvolvimento e o crescimento econômico dos palestinos, a resistência existirá e se tornará mais atuante.

A solução de acordos, não cumpridos por parte do ocupante, é um dos motores do crescimento do Hamas. Os palestinos sedentos de justiça e frustrados com o colapso das negociações, continuarão a acreditar que a resistência é o único caminho e se aproximarão cada vez mais do Movimento de Resistência Islâmica, que é uma consequência natural da ocupação brutal, e aquela força que sustenta a bandeira dos direitos, da liberdade e da autodeterminação palestinos.

* Sayid Marcos Tenório é historiador e secretário geral do Instituto Brasil-Palestina (IBRASPAL) – Email: [email protected] – Twitter: @hajjsayid

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