Hitler ganhou a eleição

Não foi na primeira tentativa. Mas com alguns milhões de votos construiu o caminho. Elegeu maioria, se tornou chanceler, fechou o parlamento, reabriu com poucos partidos, aprovou a Lei Habilitante que lhe dava plenos poderes, fechou partidos e sindicatos e iniciou a política higienista. Primeiro os comunistas, depois os judeus, homossexuais, negros, socialdemocratas, cristãos não-alinhados, imigrantes, entre outros.

Por João Paulo Gomes*

Adolf Hitler

Durante o período de doutorado na Europa tive a chance de estudar o nazifascismo, conhecer campos de concentração, entrevistar famílias alemãs, polonesas, holandesas. Os depoimentos de vários ex-apoiadores do regime de Hitler coincide no caminho do voto. “Votei contra a corrupção”, “votei por Deus e pela pátria”, “votei pra mudar tudo que estava posto”. Ocorre que atreladas a essas frases sempre vêm as ressalvas: “Ele era uma figura muito dura, mas daí a prender ou matar alguém por ser diferente era impensável”, “quando ele argumentava da presença dos judeus em postos de comando das empresas parecia um alerta ao país, não o início da maior guerra da história”.

Independente do resultado das urnas, o fato é que a semente do fascismo já ganhou a eleição no Brasil. Se Haddad ganhar, terá um parlamento ultraconservador e dificuldade em passar propostas progressistas além da divisão já estabelecida e do forte antipetismo. Seu partido tem imagem fragilizada e uma coalizão democrática não foi montada para o segundo turno no porte que o desafio pedia. Figuras como Ciro Gomes, Marina Silva e Fernando Henrique fazem falta no palanque. Vários líderes religiosos desalinhados com posturas ditatoriais ainda não se posicionaram explicitamente.

Se o favorito Bolsonaro vencer, a barbárie terá carta branca. Ele não precisa praticar nenhum crime. Suas palavras avalizam as atitudes mais extremas nas ruas do Brasil. Mulheres estão sendo espancadas por usar camisas “Ele Não”. Pessoas maltratadas por usar vermelho, por discordar, por pensar diferente.

Em julho, o candidato do PSL anunciou que pretendia ampliar a composição do STF de 11 para 21 ministros, deixando o Supremo com maioria absoluta de indicados por ele em menos de 4 anos. É uma cópia do que fizeram os militares Castello Branco e Costa e Silva, respectivamente, nos AI 2 e 5. Esse é o primeiro passo para a “Lei Habilitante” implementada pelos nazistas, que deu liberdade a Hitler para legislar sem congresso e sem a tutela do judiciário.

Assim como em 1932, o debate do segundo turno não é programático. Bolsonaro não fala de saúde, educação ou economia – diz que não entende do assunto. O líder do partido nazista alemão seguia a mesma lógica, substituía o debate de programa de governo pelas expressões “Alemanha acima de tudo” ou “uma nação, um líder”. Frases fortes, notícias falsas e viralização.

A conjuntura e o tempo histórico separam a Alemanha de Hitler e o Brasil de Bolsonaro? Sem sombra de dúvidas. Ainda assim, a história prova o peso do discurso, a conduta de presidentes militares em todas as democracias, e a fragilidade do Brasil enquanto Estado, suscetível a aventuras capazes de desestruturarem a economia e as relações sociais internas de forma avassaladora.