Reitor na Paraíba diz que ataque foi planejado para calar universidade

“É uma das maiores agressões à autonomia universitária”, declarou Antonio Guedes Rangel Junior, reitor da Universidade Estadual da Paraiba (UEPB) sobre a invasão de fiscais do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) nesta quinta-feira (25) na universidade. Fiscais da Justiça Eleitoral interromperam a exibição do filme “Preciosa”, que trata de preconceito racial, para interrogar a professora sobre o conteúdo da aula e exigir dados pessoais.

Por Railídia Carvalho

Antonio Guedes Rangel Junior, reitor da Universidade Estadual da Paraiba (UEPB) - reprodução

“Acredito que houve excessos e uma prática arbitrária do ponto de vista da interpelação da professora”, declarou Rangel ao portal Vermelho nesta sexta-feira (26). O filme estava sendo exibido para estudantes do curso de Serviço Social. Segundo o reitor, não foi apresentado mandado de busca e apreensão. A justificativa dos fiscais para interromper a aula e interrogar uma professora faria parte de uma ação rotineira de fiscalização eleitoral.

“Não foi para recolher material impróprio, não foi para busca e apreensão de material de propaganda irregular. Pelo contrário, tivemos uma sala de aula literalmente invadida por agentes da lei alegando que precisavam saber o que estava acontecendo naquele espaço”, completou. Para ele, houve arbitrariedade e intimidação. “Não há precedente legal que ampare esse tipo de atitude e nenhum dispositivo na Constituição e nem na lei eleitoral”.

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Intimidação às universidades

Cerca de 29 universidades pelo Brasil sofreram ações da fiscalização de TREs neste dia, entre elas as universidades federais de Campina Grande e da Paraíba e instituições no Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Pará. Algumas dessas instituições organizavam palestras e debates com o tema defesa da democracia.

Rangel afirmou também que o debate não interessa a certos grupos políticos neste processo eleitoral e que os ataques às universidades fazem parte desta estratégia. Pela primeira vez as eleições brasileiras à presidência da república não terão debate no segundo turno. O candidato do PSL, Jair Bolsonaro, se negou a participar dos encontros com o petista Fernando Haddad.

Para o reitor, as ações nas universidades são promovidas por aqueles que não querem dialogar sobre o que está acontecendo no país. “Foram ações bem calculadas e planejadas para atingir diretamente o lugar onde mais se debate a vida em sociedade. A universidade é o local da expressão da liberdade. Não existe outro espaço em sociedade mais devotado ao exercício da liberdade e do livre pensar.”

MBL e a cadeia de denúncias

Rangel afirmou que as ações em quase 30 universidades fazem parte de uma articulação nacional originada de um grupo político “reacionário e conservador”. “Esse agrupamento político se articulou para formular denúncias em cadeia nos TREs de cada área onde tem universidade para intimidar as instituições”, ressaltou. Segundo ele, O Movimento Brasil Livre (MBL) fez circular nas redes sociais posts de que havia denunciado à justiça eleitoral eventos “Contra o fascismo e pela democracia” na UFCG e na UEPB.

“É parte de um grupo ideológico que vê na universidade uma ameaça à liberdade. Dizem que as universidades querem doutrinar a juventude. A universidade é o lugar da pluralidade. Não existe uma instituição no mundo mais plural que a universidade. E esse grupo em nome de uma suposta liberdade quer cercear a liberdade. É uma coisa estranha”, enfatizou Rangel.

A ação do TRE foi repudiada pela comunidade acadêmica em ato realizado por estudantes na própria quinta na UEPB. Rangel informou que a universidade vai acionar os órgãos necessários para pedir apuração para a Justiça Eleitoral. A universidade quer saber de quem partiu a ordem que levou os agentes a agir dessa forma na universidade.

Como no tempo da ditadura

Há 30 anos no ambiente da UEPB, parte como estudante, professor e reitor, Rangel vê o episódio desta quinta-feira como uma volta aos tempos do golpe de 1964. Entre 1980 e 1985, fins da ditadura militar, ainda estudante de psicologia ele participou da organização de eleições simbólicas no Centro de Ciências Biológicas da universidade.

“A Polícia militar chegou e levou as urnas. Naquela época não precisava de mandato, então sentimos na pele”, contou. Ele se diz “horrorizado” e define a invasão das universidades como “se fossem um prenúncio ou uma tentativa de instaurar novamente um regime de exceção’.

Rangel sinalizou ainda para uma seletividade nas ações da Justiça Eleitoral. “Existem práticas nitidamente contrárias à legislação eleitoral sendo exibidas em igrejas, que também são espaços públicos mas não foram objeto de nenhuma ação de força policial comparando com o que sofreu a universidade”.

Educação para a cidadania

“Há uma lacuna deixada pela ausência de uma educação voltada para o exercício da cidadania, o exercício democrático. Setores importantes da sociedade se aproveitam para estimular um clima em que as pessoas flertam com o autoritarismo. Vem iludidos com a ideia de um alinhamento moralista por parte do Estado no sentido de doutrinar a sociedade para determinado padrão de conduta”, argumentou Rangel.

“Queremos um povo civilizado e educado para o exercício da liberdade”, defendeu o reitor. Na opinião dele, o modelo de educação dogmatizada defendida por esses grupos políticos reacionários nem pode ser chamada de educação. “É adestramento”. 

Confira mensagem do reitor Rangel em repúdio à ação do TRE na UEPB