Marcelo Rubens Paiva rebate acusações de Bolsonaro contra seu pai

“Ninguém resiste à tortura”, garante Jair Bolsonaro (PSL) para acusar o deputado Rubens Paiva de ter entregado companheiros de resistência durante a ditadura militar. Em coluna no Estado de São Paulo desta quinta-feira (25), o escritor Marcelo Rubens Paiva, filho do ex-deputado, rebateu as acusações do presidenciável.

Busto Rubens Paiva Câmara - Divulgação

O engenheiro Rubens Paiva foi eleito deputado federal em 1962 e, com o golpe militar, foi preso, torturado e assassinado, em 1971. A família só teve confirmação do óbito 40 anos depois, quando os responsáveis admitiram o crime em depoimento para a Comissão da Verdade. Um dos símbolos da resistência ao regime militar, ele sempre foi alvo de acusações e injúrias feitas gratuitamente por Bolsonaro, que chegou a cuspir no busto em homenagem ao colega parlamentar na Assembleia.

Marcelo diz que a família Paiva não costumava dar audiência aos comentários de Bolsonaro, afinal, tratava-se de um deputado obscuro que só conseguia algum espaço ao fazer pronunciamentos polêmicos. “Nunca demos bola. O ex-capitão era uma figura secundária na política brasileira e se sobressaía exatamente pelas falas polêmicas e sem sentido, ofensas a gays, negros, nordestinos e mulheres, no Congresso e em programas de rádio e TV. Falas que continua a pronunciar”.

Porém, com o crescimento de Bolsonaro no cenário nacional, aumentaram também as calúnias contra a família que além de convier com a dor da morte sob tortura de Rubens, agora precisa lidar com os seguidores do presidenciável que diariamente fazem ataques nas redes sociais.

“Como candidato à presidente, repete sua teoria sobre uma suposta participação indireta do meu pai na Guerrilha do Vale do Ribeira.Seus seguidores passaram a reproduzir trechos da sua teoria nas minhas redes sociais. Foi então que eu soube dela. Meu pai teria dado armas a [Carlos] Lamarca, diz. Todos sabem que, em 24 de janeiro de 1969, acompanhado do sargento Darcy, do cabo José Mariani e do soldado Roberto Zanirato, o capitão Lamarca desertou do Exército levando do 4º Regimento de Quitaúna uma Kombi com 63 fuzis FAL, três metralhadoras leves e alguma munição. Armamento que usou no Vale do Ribeira, em guerrilha financiada por milhões de dólares roubados do cofre do ex-governador Adhemar de Barros. Bolsonaro disse no plenário da Câmara de 20 de março de 2012: ‘Então, o Lamarca, aproximadamente em 3 meses, estava a montante do Rio Ribeira de Iguape, Município de Eldorado Paulista, lindeiro com a Fazenda Caraitá. Que Fazenda Caraitá é essa? Pertencia à família Paiva. Um dos donos: Rubens Paiva. E o Rubens Paiva, então, foi quem indicou aquela região para o Lamarca, assim como no passado indicaram a região do Araguaia. Então, o Lamarca usava aquela região, indicada por Rubens Paiva, e bancado, financeiramente, por Rubens Paiva’. Quem foi fazer guerrilha no Araguaia foi o PCdoB, anos depois. Lamarca já estava morto, assim como meu pai”.

O escritor esclarece também que a fazenda Eldorado não era de Rubens, mas de seu pai, Jaime Paiva e que na época eles tinham desavenças políticas porque o patriarca era conservador e chegou a ser eleito prefeito pela Arena, o partido braço civil dos militares.

Bolsonaro acusa Rubens paiva de ter dado “local e meios” para Lamarca “criar um foco de guerrilha” na região de Barra do Braço, no Eldorado Paulista. Marcelo desmente: “O campo de treinamento da guerrilha na verdade ocorreu a mais de 100 quilômetros de Eldorado Paulista, nas matas na fronteira com o Paraná, e na fuga eles saíram em Barra do Turvo, a 50 quilômetros de mata da fazenda, região montanhosa sem estradas”.

O presidenciável também sustenta a tese de que Rubens Paiva foi assassinado por companheiros da resistência, especificamente pelo “bando do Lamarca”, por ter entregados nomes durante a tortura. Isso porque, Bolsonaro garante sem titubear: “ninguém resiste à tortura”. Mas esta hipótese foi refutada quando os próprios militares assumiram a morte do deputado.

“Em 2014, o general reformado Raymundo Ronaldo Campos revelou que o Exército montou uma
farsa ao sustentar, na época, que Paiva teria sido resgatado por seus companheiros “terroristas” ao ser transportado por agentes do DOI no Alto da Boa Vista. Raymundo, que era capitão, conduzia o veículo supostamente atacado e estava na companhia dos sargentos e irmãos Jacy e Jurandir Ochsendorf. Segundo O Globo: ‘O general, que passou os últimos 43 anos sustentando a farsa, mudou a versão sobre o episódio em depoimentos ao Ministério Público Federal e à Comissão Nacional da Verdade. Ele admitiu que recebera ordens do então subcomandante do DOI, major Francisco Demiurgo Santos Cardoso (já falecido), para levar um Fusca até o Alto da Boa Vista e simular o ataque. Raymundo e os dois sargentos metralharam e incendiaram o carro, jogando um fósforo aceso no tanque de combustível’”.

Além de exaltar a tortura e os torturadores, principalmente Carlos Alberto Brilhante Ustra, chefe do Doi-Codi, Bolsonaro não respeita a dor das famílias que perderam seus entes nos porões da ditadura militar.