Indústria se queixa de incerteza e falta de diólogo com Bolsonaro

O setor produtivo brasileiro está preocupado com o descaso do candidato Jair Bolsonaro (PSL) com a indústria nacional. Para representantes de entidades da área, o postulante só dialoga com o setor financeiro e há incertezas em relação a itens de seu programa de governo.

antonio megale

O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Antonio Megale, reclamou: “a equipe de Bolsonaro procura mais o mercado financeiro do que o setor produtivo, principalmente o Paulo Guedes”. Segundo ele, há dúvidas em relação à real extensão e a como será aplicada a agenda liberal do economista Paulo Guedes, já indicado por Bolsonaro como seu futuro comandante da economia.

Megale, que participou de almoço com um grupo de jornalistas nesta terça (9), também teceu críticas à proposta de Bolsonaro, que, se eleito, pretende criar o superministério da Economia. A nova pasta abarcaria as funções hoje desempenhadas pelos Ministérios da Fazenda, Planejamento e Indústria e Comércio, bem como a Secretaria Executiva do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI).

"O MDIC para nós é o ´nico ministério que ainda tenta fazer uma política industrial, que a gente entende que é absolutamente necessária", queixou-se.

Ele expressou ainda especial preocupação com o risco de uma abertura comercial unilateral, com redução do Imposto de Importação, hoje de 35%. O medo é o de que a iniciativa inunde o mercado brasileiro de produtos importados a baixos preços, tirando competitividade dos produtos brasileiros.

Megale defende uma redução a zero do Imposto de Importação num prazo de 15 anos e carência de cinco a sete anos antes da alíquota começar a cair. “O país precisa ser mais aberto, mas não unilateralmente e nem tão rápido porque nesse caso perderíamos os bens que temos aqui”, disse.

O presidente da Anfavea disse também que a parceria entre Bolsonaro e Guedes gera dúvidas. "É uma incógnita. Esperamos que nos debates de segundo turno tenhamos mais tempo de entender”, declarou. Segundo ele, as discussões com Bolsonaro foram tratadas com superficialidade porque ele ainda “não teve condição de entender com profundidade” as questões.

De acordo com Megale, ainda falta clareza sobre o programa dos dois candidatos. “Mas uma das coisas que estão convergentes é que os dois programas estão muito preocupados com geração de empregos no país", afirmou. Para Megale, a maior incerteza, contudo, vem da plataforma de Bolsonaro.

“Nós não temos certeza da visão de cada um para a indústria como um todo. O lado do PT já tem mais conhecimento pela história do partido ligada ao setor automotivo. O do Bolsonaro tem um lado liberal pelo sentido da abertura e tem que ter um entendimento sobre qual a gradação dessa abertura. Esse tipo de preocupação que temos que discutir com o próximo presidente”, projetou.

O presidente da Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), João Carlos Marchesan, também afirmou que o diálogo de Bolsonaro privilegia o mercado. “Nos ressentimos da mesma situação”, disse. “Não tivemos ainda essa interlocução e entendemos que a saída do Brasil passa não só pelo agronegócio, mas pela indústria também.”

Na sua avaliação, o setor de máquinas não é contra a abertura comercial, mas ela tem de ser acompanhada de uma política de melhora da competitividade. Em artigo publicado no site da Abimaq antes do primeiro turno, Marchesan já havia externado a preocupação de que uma abertura unilateral, sem isonomia competitiva, agrave o processo de desindustrialização no país.

Os relatos dos representantes da indústria também indicam informações conflitantes. O presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), Fernando Figueiredo, por exemplo, disse que, nas duas vezes em que conversou com representantes da campanha de Bolsonaro, “não se falou, em nenhuma reunião, de junção de ministérios”.

Propostas

Em reportagem de O Estado de São Paulo sobre a política industrial dos candidatos, a campanha de Fernando Haddad informa que o petista traçou uma estratégia para a recuperação do setor industrial que prevê "manter preços macroeconômicos, como juros e câmbio, em patamares competitivos e estáveis, possibilitando o planejamento empresarial".

O candidato também aposta na recuperação do mercado consumidor interno como um pilar da retomada da atividade econômica. "É fundamental retomar o dinamismo do mercado consumidor interno, através do aumento da renda, da retomada do emprego e do crédito", informa.
Um terceiro pilar da recuperação industrial é a intensificação do comércio com parceiros internacionais, principalmente os que compram produtos manufaturados, como o latino-americano.

O programa passa ainda por medidas que aumentem a competitividade da indústria nacional, como a reforma tributária "que desonere a produção" e a redução da burocracia que dificulta a vida das empresas.

Já Bolsonaro não respondeu às perguntas da reportagem até a publicação da matéria, nesta quarta (10). O plano de governo do postulante não menciona estratégia específica sobre o assunto.