A Conmebol e a sua novidade

"Acredito que esse novo formato de partida final única não seria apenas uma cópia do modelo europeu ou um golpe final no processo de gentificação do futebol mas um grande negócio que beneficiaria principalmente os dirigentes do nosso amado futebol".

Por Marco Antunes de Lima*


Conmebol

No último dia 23 de fevereiro, a CONMEBOL (Confederación Sudamericana de Fútbol) anunciou que a partir do ano de 2019 as suas duas principais competições entre clubes, a Copa Libertadores da América e a Copa Sudamericana, seriam decididas em partida única. No último 14 de agosto, a própria Confederação anunciou as cidades sedes para o ano de 2019: Santiago (Chile) para a Copa Libertadores e Lima (Peru) para a Copa Sudamericana.

Conforme o presidente da CONMEBOL, o paraguaio Alejandro Dominguez, a mudança para uma final única tem o objetivo de:

“de potenciar el desarrollo deportivo del fútbol sudamericano mediante mayores recursos, más inversión y mejores estándares en todo nivel. Además de generar más ingresos para reinvertir en desarrollo deportivo, las Finales Únicas serán una gran oportunidad, para que Sudamérica, dé un gran salto en infraestructura deportiva, organización de eventos, controles de seguridad, comodidad y atención en los estadios, y en la promoción regional y mundial de nuestros torneos, clubes y jugadores.”i

Desde quando foi anunciado o novo formato da final das competições, a Confederação vêm sofrendo diversas críticas, tanto por parte de torcedores quanto pela imprensa especializada, por querer, de alguma forma, copiar o modelo europeu – lembrando que a Liga dos Campeões da Europa possui final em jogo único há mais de 50 anos e a Liga Europa tem esse modelo desde 1998. Repito aqui a maioria das críticas feitas no sentido de a CONMEBOL copiar os formatos da UEFA dizendo que a América do Sul, geograficamente, é infinitamente maior do que a Europa; que a América do Sul, por circunstâncias histórico-econômicas, não possui a mesma infraestrutura de transportes e locomoção como na Europa; e, principalmente, que a economia europeia é totalmente diferente da economia sul-americana, não fazendo sentido copiar o formato de final única.

Mas a mudança no formato das finais por parte dos dirigentes sul-americanos não se faz apenas para copiar o formato da UEFA, que dá certo. A intenção não é para ser uma cópia do que supostamente dá certo sem levar-se em conta os fatores próprios da América do Sul. A mudança desse formato – que será um teste durante pelo menos quatro temporadas – vai muito além da cópia do modelo europeu. Ela tem uma intenção clara: faz parte do processo de gentrificação ou “gourmetização” do futebol sul-americano. Não há dúvidas de que o processo de gentrificação do futebol sul-americana se encerra com essa medida. Há anos os valores altos dos ingressos nessas competições vêm expulsando as camadas mais populares das torcidas, principalmente no Brasil. Mas mesmo assim, com uma final em duas partidas ainda havia a chance de o torcedor popular participar do encontro na “sua casa”, fazendo um esforço sobre-humano com as suas economias e gastando aquilo que não possui por amor ao seu clube de coração. Agora, com essas mudanças, somente as camadas mais ricas dos torcedores poderão acompanhar seu clube de coração na final, pois provavelmente a CONMEBOL cobrará preços europeus nas partidas finais das suas competições-eventos.

Não acredito que a CONMEBOL esteja interessada na assistência das finais únicas. A preocupação dela é quanto esse evento pode render economicamente para a entidade em forma de direitos comerciais e de exibição. A Confederação não está preocupada com o costume do torcedor sul-americano ser totalmente diferente do torcedor europeu. Vejamos: supondo que a final da Copa Libertadores de 2019 seja entre um clube brasileiro e um clube argentino (a melhor hipótese possível) e o estádio nacional do Chile, em Santiago, tenha capacidade para cerca de 50.000 espectadores, será que haveria torcedores suficientes dos dois finalistas com capacidade para arcar com os altos custos da viagem e dos ingressos para a partida? Será que a população local de Santiago teria interesse em assistir a uma partida entre clubes brasileiros e argentinos? Não acredito. E na final da Copa Sudamericana em que os clubes que a disputam são de menor expressão, principalmente nos países excluindo o Brasil?

Para as televisões, que provavelmente pagarão valores maiores à CONMEBOL pois está sendo vendido um evento e não uma partida, acredito que terão uma arrecadação menor em vendas de cotas de propaganda. Afinal, será apenas uma partida final de cada campeonato e não duas, como sempre ocorreu.

O jornalista Marcel Rizzo, em seu blog do Portal UOLii informou que a opção por final de apenas uma partida está garantida até pelo menos 2022, pois a empresa responsável pela comercialização do evento, a FC Diez Media, pretende fechar acordos de patrocínio por pelo menos quatro anos. É nesta informação que está a grande chave para entender a opção da CONMEBOL pela Final em partida única. A chave está na empresa responsável pela comercialização do evento. A FC Diez é uma joint venture criada entre as empresas de mídia esportiva IMG e Perform Group para cuidar dos acordos comerciais e de transmissão dos eventos. O acordo com a CONMEBOL, como dito anteriormente, é de quatro anos, e o valor mínimo garantido à entidade máxima do futebol sul-americano é de US$ 1,4 bilhão, conforme o site Meio e Mensagemiii.

Conhecendo o perfil dos dirigentes do futebol sul-americano na história, alguém acha que eles realmente estão preocupados se as Copas Libertadores e Sul-americana serão um sucesso de público? Alguém acha que eles estão preocupados com o torcedor dos clubes finalistas (de qualquer classe social)? Acredito que não. Estão preocupados com o que fazer com pelo menos 1 bilhão e 400 milhões de dólares do contrato com a FC Diez.

Acredito que esse novo formato de partida final única não seria apenas uma cópia do modelo europeu ou um golpe final no processo de gentificação do futebol mas um grande negócio que beneficiaria principalmente os dirigentes do nosso amado futebol.

Ou isso ou o início da unificação da América Latina para a criação da URSAL. Acho que não.