Fernando Morais: Para sociedade, 'ditadura de Temer' é pior do que a de 1964

Nesta quarta-feira (15), dia do registro da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à presidência da República, será lançado o livro Vontade Popular e Democracia: Candidatura Lula? (editora Praxis). No lançamento, será realizado um debate (veja serviço abaixo) com a participação do ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão, da professora e advogada Weida Zancaner, do professor de sociologia e política Aldo Fornazieri e do jornalista Fernando Morais.

Fernando Morais

Prefaciador do livro, Morais destaca – entre os temas relacionados à obra – que o “estrago” causado pelo governo Michel Temer ao país e à sociedade como um todo é pior do que os efeitos da própria ditadura militar iniciada no país em 1964.

“A ditadura militar de 1964 e 1968 praticou crimes imprescritíveis, matou, torturou gente, censurou teatro, cinema, livros. A ditadura que estamos vivendo agora tem peculiaridades. Está sendo muito mais danosa para a sociedade como um todo do que para as pessoas individualmente, porque está vendendo o Brasil a preço de banana, vendendo a Petrobras, o pré-sal, a Embraer, estabelecendo congelamento de gastos sociais por 20 anos”, diz Morais.

Para ele, é de suma importância a “abundância de reportagens, ensaios, livros escritos por juristas e acadêmicos” publicados e lançados recentemente sobre a atual conjuntura da país.

“Isso tudo é um registro. Essas obras que estão saindo, particularmente a que está sendo lançada hoje, são como o registro da tatuagem que vai ficar na pele dessa gente para o resto da eternidade. Daqui duzentos anos, quando o Temer felizmente já não existir mais, ele e a quadrilha dele, seus tataranetos, vão poder saber com fidelidade quem foi essa gente e quais foram o crimes que cometeram contra o Brasil.”

A Lei da Ficha Limpa, os direitos políticos de Lula, a lawfare (conceito jurídico segundo o qual a lei é usada como arma de guerra) serão também temas abordados no debate de lançamento do livro.

O que poderia dizer sobre o livro e o simbolismo da data de lançamento?

A importância de deixar um registro fiel da situação que o Brasil vive, para as pessoas se informarem agora sobre o que está acontecendo, mas sobretudo para quem, daqui a duas ou três gerações, quiser pesquisar sobre o Brasil de hoje. Sou só prefaciador, mas falo como consumidor de história do Brasil. Para escrever meus livros tive que recorrer à bibliografia existente. E há momentos da história do Brasil, momentos graves, sobre os quais há muito pouca coisa. Então, essa abundância de reportagens, ensaios, livros escritos por juristas e acadêmicos, isso acaba sendo um registro perene da situação dramática que o Brasil está vivendo hoje.

Tem como comparar a ditadura iniciada com o golpe de 1964 com o momento atual?

Um dado chama a atenção, que é o seguinte: a ditadura militar de 1964 e 1968 praticou crimes imprescritíveis, matou, torturou gente, censurou teatro, cinema, livros. A ditadura que estamos vivendo agora tem peculiaridades, porque está sendo muito mais danosa para a sociedade como um todo do que para as pessoas individualmente, porque está vendendo o Brasil a preço de banana, vendendo a Petrobras, o pré-sal, a Embraer, estabelecendo congelamento de gastos sociais por 20 anos. Imagina o que isso vai significar para a educação e a saúde, para o desenvolvimento tecnológico.

Essas obras que estão saindo, particularmente a que está sendo lançada hoje, isso tudo é um registro, uma tatuagem, o registro da tatuagem que vai ficar na pele dessa gente para o resto da eternidade. Daqui duzentos anos, quando o Temer felizmente já não existir mais, ele e a quadrilha dele, seus tataranetos vão poder saber com fidelidade quem foi essa gente e quais foram o crimes que eles cometeram contra o Brasil.

Em certo aspectos, piores do que os da ditadura civil-militar?

Nesse sentido, muito piores do que a ditadura militar, porque a ditadura, com todos os crimes que cometeu, não vendeu o Brasil. Ao contrário, eram militares nacionalistas. Então você não encontra um único caso de privatização. E mesmo num aspecto que poucas pessoas chamam a atenção – e Celso Amorim fala disso com certa frequência – até na política externa a ditadura militar foi menos ditadura que a atual. O Brasil foi o primeiro país a reconhecer Angola como um país independente, antes mesmo da União Soviética e de Cuba, ou o voto anti-sionista na ONU. Desse ponto de vista, a ditadura do Temer, de 2016, está fazendo um estrago no futuro do Brasil infinitamente pior do que o feito pelos militares.

Em quanto tempo esse estrago pode ser revertido, se é que pode?

Temos feito uma série de entrevistas com candidatos a presidente. Uma das primeiras perguntas que a gente repete a todos é essa. Se você for eleito presidente da República, o que vai fazer para retomar de volta o que está sendo roubado do Brasil agora? A maioria fala em referendo popular, em projetos de lei que revoguem aquilo que foi aprovado no âmbito do Congresso, e, se for preciso, convocação de Constituinte exclusiva para reaver o patrimônio brasileiro que está sendo vendido na bacia das almas no exterior.

No caso da emenda Constitucional do teto dos gastos, só uma outra emenda para revogar…

É por isso que a gente tem que se preocupar não só em escolher um candidato a presidente, mas se preocupar muito com os candidatos a senador e a deputado. Não adianta nada você eleger um presidente progressista, nacionalista, se ele não tiver maioria no Congresso. Ele vai continuar governando com a mesma canalha que está lá hoje, a canalha que derrubou a Dilma.

E o que dizer à nova geração, aos jovens que têm vinte, vinte e poucos anos? O que podem esperar do futuro?

Aqui no Nocaute, além de convidar os candidatos a presidente, vamos convidar candidatos a senador e a deputado, inclusive de outros estados, que sejam comprometidos, pessoas que se elejam tendo como bandeira a disposição de tornar sem valor esse estrago que estão fazendo.

O senador Roberto Requião (MDB-PR) mandou uma carta para cada embaixador estrangeiro sediado no Brasil dizendo o seguinte: avise os empresários de seu país que, se por acaso estiverem comprando bens que são vendidos pelo atual regime, saibam que, tão logo esse regime acabe, vamos tomar isso de vota como receptação de material roubado.

E sobre a nova geração?

A gente está chamando deputados e senadores para mostrar que não basta votar no Lula, no fulano e no beltrano. Se você não der a ele – seja quem for – a garantia de que vai ter um Congresso progressista, vai se repetir o calvário da Dilma.

Você está otimista ou pessimista?

Fui pessimista desde o começo. Tive a oportunidade de dizer a Lula, inclusive, respeitosamente, que eu não tinha nenhuma esperança de que permitissem que ele viesse a ser candidato a presidente, porque senão nada disso teria sentido. Tudo isso, o golpe na Dilma e o que veio depois, tudo isso tem um único objetivo central. Impedir que o Lula volte a ser presidente, porque eles sabem que se o Lula volta isso tudo vai ser desfeito.

E o que ele disse?

Ele é um homem que olha para o futuro com um olhar de esperança. Mas eu tenho a impressão de que no fundo da alma concordava comigo em achar que isso era um golpe contra ele.

Serviço
Lançamento do livro Vontade Popular e Democracia: Candidatura Lula?
Dia 15 de agosto, às 19 horas
Endereço: Tupi or not Tupi
Rua Fidalga, 360, Vila Madalena, São Paulo