França assume o poder do futebol

A França é a dona da taça da Copa do Mundo da Rússia. Vai levar a Paris a peça de ouro e sustentar nos próximos quatro anos a hierarquia do futebol até que surja um novo campeão no Catar em 2022.

Por Luiz Antonio Prósperi, da CartaCapital

França Copa do Mundo Futebol - Foto: SHAUN BOTERILL GETTY IMAGES

 Uma das favoritas desde que pisou em Moscou há pouco mais de um mês, seleção francesa deixa para trás gigantes adormecidos e entra no seleto grupo de quem tem mais de uma Copa na sua coleção com as conquistas de 1998 e agora em 2018.

A vitória com autoridade por 4 a 2 diante da lutadora Croácia, neste domingo no estádio Luzhniki com 78 mil torcedores, simboliza o tamanho dessa França, recheada de jogadores de origem nas colônias africanas e disposta a ditar novos rumos do futebol, claro, se a concorrência não reagir. A fonte é fértil. Mbappé, 19 anos, foi eleito pela Fifa melhor jogador jovem da Copa.

A derrota não estremece a Croácia, uma pequena nação de 4,1 milhões de habitantes que teve seus jogadores criados sob sofrimento, som e pânico de balas zunindo nas ruas durante a guerra dos Balcãs nos anos de 1990. É uma geração vencedora por natureza e por isso não se entregou nunca nesta Copa da Rússia até o colapso sem saída na final do Mundial. O reconhecimento da luta vem com Modric, 33 anos, eleito pela Fifa melhor jogador do Mundial.

O jogo

Croatas sofreram um duro castigo no primeiro tempo. Dominadores do jogo, levaram dois gols em lances de bola parada – quase 50% dos gols desta Copa –, com direito a um deles por indicação do VAR (arbitragem de vídeo), em dois raros ataques sem compromisso da França.

A derrota parcial não cabia no futebol jogado pela Croácia. Desde o início da partida se impôs com troca de passes, com soberania, procurando os cantos do campo e dali os cruzamentos na área – característica marcante deste time. Provocou calafrios nos franceses, esteve a ponto até de marcar o primeiro gol com Perisic.

Postura covarde, pelo time que tem, a França aceitava de forma passiva as investidas do adversário. Plantada no seu campo, lutava para impedir as ramificações dos croatas de uma árvore da vitória. Não queria correr riscos. Griezmann e Mbappé, arco e flecha dos Le Bleus, e Pogba, carregador de bola ao campo inimigo, não ultrapassavam a linha divisória. Futebol pobre, sem luz, mas coerente com sua estratégia.

Croácia não era merecedora nem mesmo dos caprichos do futebol. Mas o imponderado muitas vezes premia quem não tem direito ao presente. Como no lance em que Griezmann cai, induzido ser abatido por uma falta inexistente, e o juiz argentino confirma a falta. Griezmann bate e Mandzukic desvia contra seu próprio patrimônio: Franca 1 a 0, aos 17.

A dor do gol sofrido abate os croatas por dez minutos até que, em falta recebida por Perisic, Modric levanta na área, Varsalkjo escora de cabeça, Manduzkic completa o toque, também de cabeça, Vida domina rebote e serve a Perisic, que gira e faz um golaço de canhota. Empate merecido: 1 a 1, aos 28.

Gol de Perisic faz a Croácia renascer e impor sua vontade na decisão da Copa. Futebol de muita obediência tática e simplicidade.

Quando tudo parecia caminhar mais fácil aos croatas, apoiados pela maioria da torcida no Luzhniki, eles levam outro castigo. Esse de doer. Em raríssimo ataque francês, um escanteio demolidor com a bola chicoteando na mão de Perisic. Pitana recorre ao VAR e marca pênalti. Griezmann bate e faz o segundo: 2 a 1 França, aos 37.

Croácia deveria recomeçar sua história. A França apenas sustentar a hierarquia. Uma injustiça.

Segundo tempo não havia muito a fazer por parte dos croatas. Ou aceleravam o passo em busca do empate ou a taça estaria encaminhada a Paris. O problema é que eles não poderiam abrir sua casa para Mbappé entrar. Garoto como trem-bala e de dribles desconcertantes seria um tormento nos contra-aques.

Depois de dez minutos de muito pelejar, Croácia começou a sentir o peso da derrota e da diferença de um time para outro. No primeiro contra-ataque bem encaixado de Mbappé sai o gol de Pogba em jogada que ele mesmo havia iniciado: 3 a 1, aos 14.

Pogba e Griezmann assumiam as rédeas do jogo. Davam velocidade na saída ao ataque e contornavam todos os problemas. Da trama deles, nasce gol de Mbappé, em bola desviada na zaga: 4 a 1. A Copa já tinha um destino.

Como os croatas, arrastados até ali na final do Mundial depois de três prorrogações e muita luta, poderiam impedir avalanche francesa? Era preciso dobrar os esforços, impedir ação de Griezmaan e Pogba, dar um jeito de frear Mbappé e criar situações de gol. Ufa!

Não era uma tarefa fácil. E, com 4 a 1 no lombo, pior ainda.

Acontece que o goleiro Lloris, capitão francês, se descuida na saída com os pés e dá um gol de graça a Mandzukic: 4 a 2. Um sopro de vida a quem precisava de muito oxigênio e um sinal de alerta a quem gozava de boa saúde.

Tempo escorre como rio de fogo à Croácia e uma correnteza calma em águas limpas a favor do França. Modric não tem mais força e cabeça. Pogba esnoba sua fonte de energia. A Copa havia acabado faz tempo. Como há um bom tempo o canto da torcida francesa fazia ecoar e estender o manto dos Bleus no Luzhniki.

França se legitima bicampeã e entra no grupo imponente de seleções que têm mais de uma Copa na sua coleção – Brasil, Alemanha, Itália, Argentina e Uruguai. E confirma sua autoridade de favorita desde o dia em que pisou na Rússia há pouco mais de um mês, deixando para trás gigantes adormecidos. Paris, a nova casa do futebol.