Manuela rebate vice-presidente da TV Cultura sobre Roda Viva

Após 15 dias da entrevista, Jorge da Cunha Lima, vice-presidente do Conselho Curador da TV Cultura, que exibe o programa Roda Viva, publicou artigo na Folha de S. Paulo em que trata sobre a entrevista da pré-candidata do PCdoB à Presidência da República, Manuela D’Ávila.

Por Dayane Santos

Avante, Manuela D’Ávila! - Reprodução/YouTube

Sem sequer citar o nome de Manuela, Jorge justifica a agressão sofrida pela pré-candidata no programa, afirmando que o Roda Viva não é “um simpósio”.

“Responsável pelo programa, o jornalista Ricardo Lessa, ao ser convidado, foi alertado de que o Roda Viva não é um simpósio para exposições doutrinárias nem uma arena para se levantar a bola a fim de que o entrevistado a utilize para fazer proselitismo político ou propaganda de seus posicionamentos partidários”, disse ele.

A julgar pelo que se viu na entrevista de Manuela, verifica-se que esse argumento serve apenas para a entrevistada, e não para entrevistadores como Frederico D’Ávila, diretor da Sociedade Rural Brasileira e um dos responsáveis pelo programa de Jair Bolsonaro (PSL), e Joel Pinheiro da Fonseca, economista da campanha de Marina Silva (Rede).

O que para muitos seria óbvio, para Jorge escalar o coordenador de campanha de um candidato adversário foi apenas um erro.

“Erramos ao permitir que um debatedor convidado para o programa da candidata à Presidência pelo PCdoB fosse militante de uma campanha para presidente – erro que reconheço, pois autorizei, e para o qual já adotamos normas restritivas. Mas, em nenhuma hipótese, nem antes nem depois do programa, nos pautaremos pelo critério das estratégias partidárias”, justificou ele.

Mais de 60 interrupções 

Em um post nas redes sociais, Manuela comentou o artigo de Jorge Cunha. Para ela, o artigo do vice-presidente da fundação fez apenas uma autocrítica: a de terem convocado o coordenador de uma candidatura frontalmente adversária.

“Vejam: quanto às interrupções, ele considera que não houve nada de anormal. Nem mesmo os dados objetivos expostos por pesquisadores foram levados em conta”, enfatizou a pré-candidata, lembrando que levantamentos comparativos com outras entrevistas de pré-candidatos, mostraram que Manuela foi interrompida mais de 60 vezes, enquanto outro pré-candidato foi interrompido apenas oito vezes em todo o programa.

“Nenhum outro entrevistado do grupo de pré-candidatos sofreu pelo menos a metade das interrupções que sofri”, apontou. “Nem a repercussão imensa que reuniu análises produzidas por renomados pesquisadores das áreas dos mass media, gênero e sociologia, além de uma gama considerável de manifestações contrárias à postura do programa expressa por atores, escritores, veículos de comunicação nacionais e internacionais e tantos outros formadores de opinião ou mesmo a petição que juntou dezenas de milhares de assinaturas fizeram-no refletir”, completou.

Para ela, o artigo de Jorge Cunha demonstra que “estamos todas e todos autorizados a considerar que o episódio se repetirá com as próximas mulheres que se sentarem naquela cadeira”.

Jorge usou a maior parte de seu artigo para contar a história dos 30 anos do Roda Viva, como se fosse suficiente para explicar o que foi feito durante a entrevista de Manuela. No entanto, foi justamente esse argumento usado por diversos especialistas de comunicação, jornalistas e lideranças políticas para apontar a disparidade do programa comparado a outros anos.

Jorge disse que o âncora e entrevistadores “podem cobrar jornalisticamente objetividade nas respostas, quando houver dissimulação visível por parte do entrevistado”.

Com uma bancada seletiva e um apresentador que toma partido, o Roda Viva tentou ser a casca de banana da pré-candidata do PCdoB ao imputar a visão ultradireitista e conservadora de que o comunismo é a chaga da humanidade. Manuela se agigantou e com clareza e segurança, encarou e desarmou as arapucas reforçando porque aos 36 anos é um quadro do PCdoB e tem todas as condições de postular o cargo de presidente do Brasil.

O apresentador e parte dos entrevistados não queriam uma resposta da Manuela, mas queriam ouvir o que eles pensam sobre o comunismo, socialismo, Stalin, Lenin, Coreia, Venezuela.

Um comentário de um internauta nas redes sociais sintetizou essa estratégia que o apresentador Lessa tantas vezes insistiu: “Ela não consegue, nem sob a mira de um revólver, dizer ‘Sim, Stalin matou muito’. Cada célula de seu corpo foi programada para relativizar os ídolos sanguinários do comunismo”.

Sobre as mais de 60 interrupções feitas contra Manuela por alguns entrevistadores, inclusive o apresentador, Jorge Cunha disse que não se tratou e machismo. “Um clima de respeito à pessoa humana é fundamental, seja homem ou mulher. Mas dar duro num entrevistado homem, conforme tradição do programa, não significa que o programa seja feminista, e vice-versa”, afirmou.

Mas o que Jorge chama de “dar duro no entrevistado” passou longe de uma sabatina jornalística. Por uma hora, Manuela foi bombardeada com perguntas de entrevistadores que não estavam interessados em seu projeto de desenvolvimento para o Brasil, mas em vê-la tropeçar nas perguntas-pegadinha.

“Foi o equivalente midiático de um fuzilamento, ao vivo e em cores”, avaliou o jornalista Renato Bazan. “Numa realidade em que o mediador do Roda Viva fosse Heródoto Barbeiro ou Paulo Markun, as perguntas teriam chance de serem respondidas, e não seriam transformadas em armadilhas para render manchetes nas redes sociais”, completou.