A perseguição de Trump a refugiados, imigrantes e à própria ONU

A data de 20 de junho foi consagrada pela ONU como o dia mundial dos refugiados. Neste ano de 2018, o Presidente dos Estados Unidos retirou a representação deste país junto ao Conselho de Direitos Humanos da ONU pouco antes da celebração, oferecendo mais uma das muitas provas do frequente desrespeito aos direitos humanos que este país põe em execução no mundo todo.

Por Jacques Távora Alfonsin, no Sul21

Donald Trump - Divulgação

Dentro do próprio território dos Estados Unidos, a implementação dessa política dá um exemplo da barbárie que a inspira contra famílias de imigrantes que conseguem entrar no país. No jornal Hora do Povo de 19 deste junho, lê-se o seguinte:

“As crianças apartadas dos pais são postas em gaiolas, como no centro de detenção de Brownsville (Texas) e ex-Walmart. Para servir de lençol, recebem grandes folhas de alumínio. As cenas de centenas de crianças mantidas em gaiolas de arame em um ex-hipermercado Walmart no Texas, rebatizado de ‘Casa Padre’, após terem sido separadas à força de seus pais imigrantes na fronteira pela política de ‘tolerância zero’ do governo Trump, causaram enorme comoção nos EUA e no mundo inteiro, em meio a protestos, condenação da ONU, repúdio de entidades, religiosos e parlamentares e com a própria esposa Melanie se negando a endossá-la.”

Se nem a mulher do presidente consegue demovê-lo dessa insanidade, não admira que ele se indisponha contra o Conselho de Direitos Humanos da ONU. Em meio à consternação de algumas vozes lamentando a saída dos Estados Unidos, talvez fosse o caso de se considerar se isso não será bom para o próprio Conselho. Que pode fazer lá, pelos direitos humanos, a representação de um governo que trata de modo tão desumano crianças de famílias que, seguramente por sua grande maioria, já entram naquele país obrigadas por um estado de necessidade que não encontrou solução satisfatória em suas terras de origem?

O culto de admiração pelo nível de vida e pela propalada educação do governo e do povo americano do norte, povoando a imaginação de muita gente ingênua, pode ser desmitificado por organizações populares de direitos humanos e críticos conhecidos mundialmente que lá mesmo vivem, como é o caso de Noam Chomski.

Em “11 de setembro”, (edição traduzida para o português pela Bertrand Brasil em 2002), obra que publica uma extensa entrevista sobre sua opinião relativamente a tragédia provocada pelo ataque terrorista de aviões às torres gêmeas, em Nova York, matando milhares de pessoas, embora Chomski não poupe críticas ao atentado, não entrou na onda da imediata retaliação-vingança que se desencadeou então por todo o país norte americano. Recordou, então, a responsabilidade dos Estados Unidos pelas numerosas intervenções militares e guerras que a sua história registra, sem outra razão que não a dos seus interesses econômicos.

Respondendo a uma pergunta sobre se uma nação pode vencer uma suposta guerra contra o terrorismo e prevenir-se de atentados como os que sofreram Nova York e Washington, Chomski disparou:

“Se quisermos refletir seriamente sobre essa questão, devemos reconhecer que, em grande parte do mundo, os Estados Unidos são vistos como um Estado líder do terrorismo, e por uma boa razão. Podemos considerar, por exemplo, que em 1986 os EUA foram condenados pela Corte Mundial por “uso ilegal da força” (terrorismo internacional) e então vetou uma resolução do Conselho de Segurança da ONU que instava todos os países (referindo-se aos EUA) a aderir às leis internacionais. Este é apenas um entre inúmeros exemplos. {…} Nos anos 1980, a Nicaragua foi vítima de um violento ataque conduzido pelos EUA. Dezenas de milhares de pessoas morreram. O país sofreu uma substancial devastação e jamais pôde se recuperar. O ataque terrorista internacional foi acompanhado por uma arrasadora guerra econômica que um pequeno país, isolado do mundo por uma vingativa e cruel superpotência, dificilmente poderia enfrentar, como revelaram em detalhes os principais historiadores que estudam a Nicaragua, como Thomas Walker, por exemplo.”

O tratamento que Trump está dando às crianças das famílias imigrantes que chegam aos Estados Unidos segue essa violenta e injusta tradição. Como o presidente procura justificá-la num lema de claro arbítrio, do tipo “tolerância zero” aberto a qualquer interpretação dele próprio, acaba zerando também o respeito devido às crianças das famílias imigrantes, à cidadania, aos direitos humanos, ao que é lícito se esperar do governo de um país realmente democrático e de direito. Essa não seria a oportunidade de atual (des)governo do Brasil, pelo menos unir-se a imediata denúncia que está partindo de outras nações contra a desumanidade de Trump?