Macron lança ataque contra a habitação social

O governo francês prepara-se para forçar a venda de grande parte da habitação social, composta por cerca de 5 milhões de casas, e criar contratos de aluguel de um a 10 meses

emmanuel macron

O governo de Emmanuel Macron aprovou pela Assembleia Nacional francesa, na terça-feira (19), uma proposta de lei que altera profundamente o panorama da habitação pública e social no país, que tem um peso muito significativo, particularmente quando comparado com o que acontece em outros países da União Europeia.

Um dos principais objetivos é fundir os organismos que gerem a habitação social, a maioria dos quais gerem habitação pública, e aumentar as vendas anuais de uma média atual 8 mil casas para 40 mil, segundo o L'Humanité.

Governo promove alienação da habitação pública

Os atuais propietarios, sejam do setor privado ou do setor público (no essencial, organismos municipais), vão ver os apoios diretos à construção por parte do Estado reduzidos. Ao mesmo tempo, o subsídio de renda, assumido também pelo Estado, já sofreu cortes que podem chegar a 60 euros mensais, de acordo com o corresponde em Paris do jornal espanhol El Salto. Agora, transferiu esses encargos para os organismos que gerem a habitação social, que terão que refletir a descida nas rendas praticadas. Com isto, o executivo de Macron pretende empurrá-los para um ciclo de vendas que visa reduzir brutalmente o parque habitacional público e social.

A lei ELAN, como é conhecida, põe ainda um ponto final no limite das rendas em 28 cidades, introduzido na legislação francesa em 2014, tornando-o experimental e voluntário. Até o momento, apenas em Paris e em Lille foi introduzido um tecto máximo, entretanto cancelado. Os principais grupos econômicos do setor reagiram com satisfação quando a proposta foi conhecida. Desde o fim do limite em Paris, os preços subiram 5,7%, segundo a imobiliária Century21, citada pelo L'Humanité, cujos responsáveis terão admitido num encontro com os trabalhadores da empresa que "é hora de expulsar os quadros intermédios da capital".

Esta intenção será ainda mais facilitada porque o prazo no qual uma habitação social continua a contar para efeitos estatísticos passa de cinco para dez anos, permitindo que o objetivo fixado em 2000 na lei de que cada localidade deve ter 20% de habitação social não seja cumprido.

Segurança mínima, lucro máximo

Outra novidade do pacote legislativo de Macron é a criação de um "contrato de mobilidade", apelidado pelas estruturas de inquilinos como um "contrato de precariedade". Através deste novo mecanismo, passa a ser possível alugar casas por períodos entre um e dez meses, não renováveis.

A medida é apontada como um autêntico favor para os proprietários que utilizam plataformas de aluguéis de muito curta duração como o Airbnb, que na França está limitado a 120 noites por ano. Nestes casos e se for aprovada a proposta, ganham um mecanismo para manter as casas a render nos restantes oito meses em que não as podem colocar nessas plataformas, sem o risco das elevadas multas a que arriscam caso ultrapassem o limite.

A França é dos países da União Europeia em que a habitação social tem um peso significativo, cerca de 19% do parque habitacional e mais de 40% do mercado de aluguéis. Em Portugal, de acordo com dados da federação Housing Europe, a habitação social representa apenas 3% do parque habitacional.