Em Defesa da Soberania Nacional, da Democracia e Estabilidade Política

Os clássicos elementos do Estado Moderno, conforme Dalmo Dallari, são o território, a população, o poder político e a finalidade. Entretanto, estes elementos devem ser organizados e dirigidos pelo aparelho estatal ou burocracia (Max Weber). E, ainda, ao lado desses elementos, as duas grandes características essenciais do Estado são os princípios da soberania (Jean Bodin) e o do monopólio da força física (Weber).

Por Vanderlei Siraque*

Vanderlei Siraque

O princípio da soberania, interna e externa, é una e indivisível e não se confunde com a autonomia por ser ilimitada e perpétua. A soberania garante a autodeterminação dos povos e dos Estados, apesar de hoje ser relativizada pelo Direito Internacional e, ainda, garante a possibilidade e o poder de criação do ordenamento jurídico interno, ou seja, de um plexo de normas jurídicas, cujas consequências, em caso de violações, são as possibilidades de sanções e de coerções. As sanções podem ser definidas como algumas formas de punições (ex. multas de trânsito, condenações criminais) e a coercibilidade é a possibilidade de execução de tais sanções até mesmo pela força física. Assim, o Estado, além da soberania, tem o monopólio da força física (exemplo a decretação de Intervenção Federal, do Estado de Defesa, do Estado de Sítio por meio das Forças Armadas e também dos órgãos policiais).

Destaque-se, porém, que o uso legítimo do monopólio da força física está limitado pelos princípios e regras da Constituição e das leis infraconstitucionais, conforme as exposições de motivos do ato a ser praticado e para atender aos interesses públicos, como a segurança do Estado e da sociedade, sob os seguintes critérios de ponderações: necessidade, razoabilidade e proporcionalidade na coerção.
Sem o respeito e sem o exercício da soberania e do monopólio do uso legítimo da força física o Estado Constitucional sucumbe ao Estado Paralelo que é comandado pelo crime organizado ou por grupos políticos paralelos que apesar da capacidade de força física e política não possuem legitimidade constitucional.

É importante salientar que a soberania e o monopólio da força, as instituições estatais, a burocracia não andam e nem se preservam sozinhas. É necessário o exercício do poder político estatal, é preciso governabilidade política, gestão, liderança da nação e para tanto o governo, apesar de não ser o soberano, pois soberano é o povo através do Estado, precisa exercer as suas funções constitucionais e legais. Mas este não é o caso do Michel Temer, pois o seu governo tem o pecado original do "golpe parlamentar" e da quebra dos princípios e regras constitucionais perpetrados por setores do Ministério Público, do Judiciário e da mídia, os quais, certamente, beneficiaram-se de informações estratégicas da NSA-Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos que gravaram autoridades do mundo todo e, portanto, quebraram o princípio da soberania do Brasil e de outros Estados. O gravíssimo é que as violações dos princípios e regras não se limitaram ao governo Dilma, por exemplo na gravação das conversas sigilosas entre a presidente e o ex-presidente Lula publicizadas, de forma criminosa, pelo juiz Sérgio Moro sem punição alguma a ele pelo Conselho Nacional de Justiça-CNJ e acovardamento do STF como se fosse algo de somenos importância. A quebra de princípios e regras continuaram após o golpe, pois é inaceitável que o então procurador geral da república tenha autorizado um acusado a gravar o presidente da República dentro de sua própria residência oficial para os nossos orgasmos, do MP, de setores do Judiciário e da mídia! Gravar um presidente da República, mesmo que seja fruto de um golpe, é crime de lesa pátria! É colocar em risco a segurança nacional e o próprio Estado Constitucional! É quebra de autoridade! E todos esses fatores geraram crises e mais crises de governabilidade e instabilidade política, econômica e social. Geraram a sensação de que não mais existem autoridades no Brasil e que cada qual poderia fazer aquilo que bem entendessem, pois não há mais credibilidade no governo central, fato que se espraiou para autoridades políticas de outros entes da Federação brasileira.

Se as diversas formas de golpes não bastassem, tentaram dar o golpe de misericórdia com o célere processo de condenação do ex-presidente Lula sem ato de ofício e sem provas cabais com o objetivo de impedi-lo de concorrer à presidência da República. E, pior, se não bastassem as céleres condenações em primeira e segunda instâncias, passaram por cima do princípio constitucional da presunção de inocência ou da não culpabilidade previsto na cláusula pétrea do art. 5º, LVII da Constituição, cuja presidente do STF e outros ministros se fazem de rogados e não colocam em votação a ADC do CFOAB e do PCdoB em relação ao art. 283 do Código de Processo Penal. E, assim, prenderam o maior líder popular da história do Brasil, o Lula.

Porém, não bastaram o impeachment da Dilma e a prisão de Lula, a gravação de Michel Temer, o crepúsculo de Aécio Neves e de José Serra. Tentaram salvar o Geraldo Alckmim, utilizando critérios de "dois pesos e duas medidas", através da Justiça Eleitoral e do chefe do MP paulista, mas a vergonhosa manobra é tanta que até a mídia percebeu que, pelo princípio da igualdade, o tucano deveria mesmo ser julgado em Curitiba pelo aliado de outrora, o juiz Moro.

A questão, no entanto, não é de aplausos, de orgasmos políticos ao ver o golpista Temer e os tucanos Aécio, Serra e Alckmim no mesmo caminho de integrantes do PT. A questão é outra, pois o PT e o PSDB são frutos do fim da Ditadura Militar e fiadores da nossa Democracia Política, enquanto o PMDB foi o contraponto do Golpe Militar de 1964 durante toda a ditadura e foi importante para a redemocratização do Brasil. O PSDB, conseguiu reunir sob a sua liderança o espectro político liberal e do centro-direita e estabilizar a moeda, o Real. O PT, com o apoio do PCdoB, PSB, PDT, entre outros, conseguiu, de forma espetacular, organizar todo o centro esquerda e implementar políticas públicas de inclusão social de última geração sem perder as conquistas do Real. E o PMDB esteve dos dois lados. O fato lamentável é que discordando ou não, os enfraquecimentos do PT e do PSDB, sem a capitalização pelo PMDB, geraram o caos político, econômico e social do Brasil e do povo brasileiro e tais fatores abrem brechas para os aventureiros e oportunistas, inclusive dentro do próprio ninho tucano, como é o caso do Dória.

Todos esses fatores desagregaram, irresponsavelmente, a política e o tecido social do Brasil. A tal "classe política" foi levada à lona e, assim, somente está sobrando, por ora, a autoridade do Judiciário e os poderes políticos do MP e da mídia. Entretanto, as autoridades do Judiciário e do MP podem estar com os dias contados em decorrência das contendas entre as duas turmas do STF: qual das duas tem razão? Talvez quando setembro chegar nenhuma das duas. E sobre o MP, onde estão o ex-procurador da República que se vendeu para o Joesley e onde está o ex-procurador geral? Será que eles tem algo a dizerem sobre os procedimentos de delações premiadas da JBS? O que vai dizer o STF sobre esses casos? E as publicizações de gravações sigilosas, premiações e viagens do Moro aos Estados Unidos e suas fotos com o Aécio e o Dória? Tudo foi por acaso! (sic!). O fato é que não temos magistrados politicamente ou juridicamente neutros, cada qual tem a sua própria ideologia, religião, filosofia de vida e, muitos não conseguem ou não desejam separar as suas vontades da vontade da lei, a mens legis e julgam conforme as capas dos autos e, assim, a supremacia sai da política, ou seja, das autoridades do Executivo e do Legislativo eleitas para a supremacia dos magistrados e do Judiciário, não eleitos pelo povo.

E, enfim, assistimos a crises com grandes profundidades por uma simples reivindicação de caminhoneiros em decorrência da falta de responsabilidade de um tal presidente da Petrobrás, dos golpistas e de seus asseclas que apenas atendem aos interesses do capital e dos países estrangeiros em detrimento do desenvolvimento econômico e social do Brasil e do povo brasileiro e da soberania nacional. E, assim, observamos um governo ilegítimo que não tem credibilidade e nem autoridade para exercer o monopólio legítimo da força, pois nem sequer sabe quem são os seus interlocutores pela incapacidade de identificá-los, já que tentou acabar e esgarçar as entidades sindicais e outras instituições civis e, pior, não tem capacidade ou autoridade política para dialogar com mais ninguém.

Por fim, creio que somente as eleições de outubro e a democracia podem resolver a crise política, econômica e social que nos meteram. E somente um grande acordo de centro esquerda, juntamente com os progressistas e defensores da democracia unidos ao trabalho, ao capital nacional e aos interesses da soberania e do povo brasileiro, através de uma candidatura que lidere este espectro político, poderia tirar o Brasil e o povo brasileiro deste caos e levar o Brasil à estabilidade e à conciliação. Viva o Brasil e a Democracia: Frente Ampla a ser construída.