Uso do WhatsApp será trunfo e desafio em campanha eleitoral

Candidatos, marqueteiros e agências digitais já se movimentam em torno de app de mensagens utilizado por 91% dos brasileiros, mas ‘campeão’ na disseminação de fake news.

Por Henrique Julião

whatsapp - Foto: DREAMSTIME

A campanha eleitoral de 2018 deve ser marcada pelo intensivo uso do WhatsApp como ferramenta de marketing político. Enquanto agências digitais já exploram comercialmente a possibilidade, ainda pairam dúvidas quanto à fiscalização da atuação de candidatos dentro do aplicativo de mensagens – considerado o maior canal de disseminação de fake news.

“Há uma série de empresas que estão oferecendo o disparo no WhatsApp como opção de publicidade [para campanhas]”, afirmou ao DCI o diretor do Instituto Tecnologia & Equidade (IT&E) e fundador do AppCívico, Thiago Rondon.

Apesar da funcionalidade não ser prevista pelos termos de uso nem disponibilizada pela plataforma para fins políticos, tal prática foi identificada pela Universidade britânica de Oxford tanto nas eleições municipais de 2016 quanto nas gerais de 2014 – quando marqueteiros “desenvolveram personalidades em grupos privados para promover mensagens políticas de forma automática”, incluindo na corrida presidencial.

De lá para cá, a oferta evoluiu, passando a compreender até mesmo bots conversacionais, de acordo com empresa que falou em “off” ao DCI. Sediada em uma capital nordestina, a agência realiza ativações eleitorais desde as eleições municipais de 2012; em 2014, seis pleiteantes a governos estaduais recorreram ao serviço.

Neste ano, conversas com pelo menos dez pré-candidatos a governador foram reportadas; entre interessados em uma cadeira no Senado Federal, a procura seria ainda maior. Apesar de afirmar que a promoção automática das campanhas no WhatsApp “nunca deu problema”, o empresário reconhece que “alguns candidatos ainda ficam com medo” de utilizar o canal. Sócio do Peck Advogados, Leandro Bissoli observou que “não há vedação legal” para o uso de aplicativos de mensagens em campanhas políticas a partir de 16 de agosto; por outro lado, o especialista em direito digital lembrou que a minirreforma eleitoral – ou resolução 23.551 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – criou punições para candidatos que realizem “impulsionamento de conteúdos de forma indevida”.

“Há penalidades entre R$ 5 mil e R$ 30 mil ou o dobro da quantia que ele [o candidato] pagou”, sintetizou Bissoli. O advogado também reiterou que o uso de funcionalidades que “não sejam específicas da plataforma” pode acarretar problemas, bem como a ausência de mecanismos de opt-out que possibilitem a exclusão de um usuário da lista de destinatários, caso ele deseje.

O caráter potencialmente intrusivo da interação via WhatsApp também foi citado pelo sócio e diretor estratégico da iFaro, Rogerio Cabral. Especializada em mailing segmentado, a empresa atuou com a plataforma na eleição de 2016, quando prestou serviço para um candidato à prefeitura de cidade no Grande ABC, em São Paulo.

“Foi uma experiência horrível”, comentou o ele, assinalando que tal prática “se encaixa melhor em cima de uma base de filiados.”Braga afirma que ainda não fechou com nenhum candidato para as eleições deste ano. “Depois da Copa do Mundo eles devem se mexer mais”, observou.

O especialista, contudo, observa que o custo da ativação é alto. “Fica R$ 0,08 ou R$ 0,09 por disparo. Já uma SMS com voz fica entre R$ 0,01 ou R$ 0,02”.

Fake News Procurada, a assessoria de imprensa do WhatsApp informou que a empresa “não comenta essas questões.”

Já o TSE afirmou em nota que vai “neutralizar os comportamentos abusivos na campanha eleitoral com o apoio da imprensa e do próprio eleitorado”.

“A Justiça Eleitoral atuará, primordialmente, de forma educativa-preventiva alertando o eleitor para os cuidados essenciais que se deve tomar para identificar uma notícia falsa e não propagá-la”. Vale lembrar que pesquisa recente da Universidade de São Paulo (USP) constatou que o app – com destaque para os chamados grupos de família – é a principal fonte de fake news no País.

Se o caráter privado e descentralizado da ferramenta de mensagens deve inviabilizar a identificação e remoção de conteúdos falsos ou indevidos no WhatsApp, “as plataformas de modo geral serão mais cobradas”, afirmou Thiago Rondon. Exemplo da postura foi dado nesta quinta-feira (7), quando o TSE determinou que o Facebook remova em um prazo de 48 horas cinco postagens falsas divulgadas contra Marina Silva, pré-candidata da Rede à corrida presidencial.

Responsável pela decisão, o ministro Sérgio Banhos também solicitou à rede social os dados pessoais do criador e dos administradores dos perfis responsáveis pela publicação em um prazo de dez dias.

Obrigações

Mesmo que disciplinado durante a minirreforma eleitoral, o impulsionamento de posts em redes sociais institui uma série de responsabilidades para as plataformas – como a identificação do caráter publicitário dos conteúdos.

Proprietário do WhatsApp, o Facebook já anunciou uma série de medidas para tornar mais transparente a política de anúncios da rede social na esteira do escândalo do mau uso de dados pela Cambridge Analytica.

Segundo a companhia, estará disponível já neste mês para usuários brasileiros uma ferramenta que permite, em uma aba única, a visualização de todos os anúncios patrocinados por uma página. Mais potente e em fase de testes durante as eleições regionais nos Estados Unidos, uma segunda funcionalidade criaria aba onde “todos os anúncios marcados como políticos ficariam disponíveis em arquivo pesquisável [com dados] sobre por quem ele foi pago, quanto foi pago e informações demográficas do perfil [alvo]”.

A declaração foi dada pela gerente de políticas públicas e de privacidade do Facebook, Nathalie Gazzaneo, durante seminário realizado na Câmara dos Deputados no mês passado. Procurada, a assessoria de imprensa do Facebook não soube informar se a funcionalidade chegaria ao Brasil antes da eleição de outubro.

O Twitter, por sua vez, anunciou recentemente que não deverá aceitar o impulsionamento de posts por candidatos. “Ninguém quer o mesmo problema reputacional que o Facebook está atravessando”, comentou Leandro Bissoli.

O advogado também citou a responsabilidade das próprias agências na resolução do problema. “A [Associação Brasileira das Agências Digitais] Abradi criou um código de conduta para incentivar o uso ético da internet nas eleições”. O documento desincetiva o uso do WhatsApp para envio de spam.