Dólar a R$3,96: Mercado vê o descontrole do governo, diz economista

Na tarde desta quinta (7), o dólar superou a marca de R$ 3,96, mesmo após o Banco Central reforçar a intervenção extraordinária no câmbio. É o maior patamar desde março de 2016. O Ibovespa, principal indicador da bolsa brasileira, chegou a recuar quase 6%. Para o economista-chefe da Spinelli Corretora, André Perfeito, o mercado percebe o descontrole do governo Michel Temer e reage aos sinais de que a população pode rejeitar nas urnas a agenda de reformas ortodoxas.

Por Joana Rozowykwiat

Manifestação contra dólar alto e pelo impeachment de Dilma

“O mercado está percebendo um grau de descontrole do governo atual. Por exemplo, você teve a ação dos caminhoneiros, o governo anunciou um tabelamento [do frete], que já gerou reclamações com os ruralistas. O governo não está conseguindo estabilizar essa questão. Tenta coisas fora do lugar, como usar força de polícia para garantir o desconto do diesel na bomba. Todo esse conjunto cria um espaço para dúvidas a respeito da capacidade de o governo estabilizar algumas variáveis”, avaliou.

Para tentar conter a escalada da moeda estrangeira, o Banco Central promoveu um leilão extraordinário de 40 mil contratos de swaps cambiais, que equivalem à venda de dólares no mercado futuro, correspondendo a US$ 2 bilhões. Mais cedo, no leilão rotineiro, a autoridade monetária já havia vendido o lote integral de 15 mil contratos, representando US$ 750 milhões.

Não surtiu efeito. Em algumas casas de câmbio, a moeda norte-americana já era negociada, nesta quinta, a R$4,16, incluindo o imposto sobre operações financeiras (IOF). No cartão de viagem pré-pago, o valor chegava a R$ 4,35.

A alta do dólar tem impacto sobre a inflação, uma vez que insumos e produtos importados ficam mais caros e tendem a ser repassados aos preços finais ao consumidor.

Ataque especulativo

De acordo com André Perfeito, o Brasil está sendo alvo de um ataque especulativo, que é quando um conjunto de investidores decide apostar na desvalorização da moeda de um país. Para o economista, contudo, o ataque se dá de forma pontual, e a situação “não é o fim do mundo”, uma vez que o Brasil possui uma grande reserva de dólares e uma balança comercial muito positiva.

“O que acontece hoje em dia é que o Banco Central e o Tesouro Nacional estão intervindo no mercado para evitar que o juro exploda, que o câmbio ande muito. Quando acontece isso, o mercado vai testar esses limites. Para explicar de forma simples: você sabe que alguém sempre vai comprar alguma coisa num preço x. Você compra mais barato e vende para ele. Até quando? Até quando ele consegue comprar. Em linhas gerais, é isso que está acontecendo. Por isso essa ideia de ataque”, detalhou.

Na sua avaliação, o mercado, na verdade, está sendo “mais realista”, porque trabalhava com “hipóteses muito ingênuas” a respeito de 2018. O bom cenário projetado para este ano não tem, afinal, se concretizado.

“Um exemplo: os juros estavam caindo. Quando os juros caem, não é interessante colocar dinheiro em renda fixa, mas em renda variável, aí a bolsa sobe. Mas qual a perspectiva hoje? É subirem os juros. Então, se vão subir, a bolsa tem que cair um pouco mais, vai perder atratividade porque passa a valer mais a pena emprestar para o governo”, disse.

Governo sem credibilidade

Segundo o economista, o Banco Central e o Tesouro estão tendo que trabalhar muito, por causa da debilidade do Palácio do Planalto. “Estão tentando comprar credibilidade para o governo. Quando um governo vira e fala que vai controlar os preços sob polícia, acabou. E, se o governo sistematicamente não passa uma ideia de credibilidade, fica cada vez mais caro para o Banco Central ajustar do outro lado”, indicou.

Para ele, o impacto do câmbio sobre os preços não deve ser encarado como um grande problema, uma vez que a inflação está em patamares baixos. “A inflação vai subir um pouco, mas não é o fim do mundo. Agora, o governo está tentando de todas as formas segurar isso, o que pode custar caro ao Brasil lá na frente, tem um custo fazer isso. Lembra as operações de swap em 2015, com a Dilma [Rousseff]? Aquilo deu um prejuízo gigante. Mas temos uma situação que é administrável”, defendeu.

Aumentou a certeza: povo resiste a reformas

Na opinião de Perfeito, ao contrário do que anunciam alguns veículos de comunicação, a reação do mercado não se dá porque o grau de incerteza em relação ao país aumentou, pelo contrário. Para ele, há hoje uma certeza maior de que a agenda de reformas pode não prosseguir depois das eleições.

“Está cada vez mais evidente que a população talvez não queira mais reformas tão ortodoxas. O que a gente viu com os caminhoneiros? Foi o apoio da população. As pessoas estão impacientes com o nível de atividade, o desempenho da economia brasileira.”

De acordo com ele, o mercado costuma ser pragmático. “A ideia é a seguinte: as reformas podem não ser referendadas nas urnas. Gera esse desconforto. Vamos supor que vá ganhar um candidato de centro-esquerda, então o dólar tem que estar mais para cima. Simples assim. É colocar o preço no lugar certo. Se você tem um candidato liberal, o preço do câmbio é um; se tem um candidato mais heterodoxo, intervencionista, o preço é outro. A gente coloca muita emoção na voz do mercado, mas ele é mais frio. Qual é o preço que equilibra esse ou aquele nome, essa ou aquela situação?”, apontou.