O “Processo” impedido da presidenta Dilma

“O processo” é um documentário brasileiro dirigido por Maria Augusta Ramos, cineasta, documentarista, diretora também de “justiça” (tudo minúsculo assim mesmo), premiado documentário de 2004 que oferece ao público uma reflexão sobre o sistema judicial brasileiro.

Por Teddy Falcão*

O Processo - filme - Divulgação

A estreia comercial do filme acontecerá em 17 de maio de 2018, mas já foram realizadas algumas sessões de pré-estreia no país, inclusive em São Paulo, onde pude ver em uma sessão de sábado a meia-noite na rua Augusta.

Sem pretensão de ser “épico” ou doc-hipster, o filme não oferece nada em termos de efeitos e serviços espetaculares de pós-produção. A fotografia se limita a documentar e não há trilha musical em momento algum do filme, nem nos créditos. Tudo o que ouvimos são as vozes dos personagens e o barulho de pontos específicos de Brasília onde aconteceram os eventos mais importantes do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff.

O filme traz a oportunidade de acompanhar por dentro, como testemunha, nos corredores, salões, plenários e salas de reuniões e até carros oficiais, as ações dos principais personagens que trabalharam ativamente na acusação e/ou na defesa de Dilma.

Nos apresenta o questionável e controverso processo de impeachment da presidenta, reeleita em 2014 com mais de 54,5 milhões de votos para o seu segundo mandato.

Temos a constatação de um processo deliberadamente político e sem provas contundentes para sustentar a alegação de crimes de responsabilidade praticados por Dilma. Vemos o curso de um golpe arquitetado por uma classe política de ficha suja escancarada, com parlamentares envolvidos e até condenados pelos mais diversos crimes. Um conjunto de eventos contestáveis de lamentável afronta à democracia brasileira, agravando ainda mais a crise pela qual o país lutava para sair.

Em duas horas e meia, acompanhamos os recortes de todos os eventos do processo. Desde um início liderado por Eduardo Cunha, que sem escrúpulos, aceitou o pedido de impeachment à presidenta Dilma de modo vingativo e decidido a destituí-la do poder que lhe foi conferido pelo voto popular e legítimo.

O momento constrangedor e surreal onde os deputados federais protagonizaram em rede nacional um dos episódios mais tristes e vergonhosos da história da política brasileira, dizendo “sim” à abertura do processo de impeachment contra Dilma, tirando-a, assim, de seu posto de presidenta da República temporariamente para dar lugar ao vice-presidente que assumiu interinamente a presidência, até três meses depois, 81 senadores totalizarem o quórum da sessão final do processo de cassação do mandato da presidenta. Onde ninguém se absteve e 61 votaram a favor e 20 contra o afastamento definitivo Dilma, deixando o posto para o seu vice.

“O processo” é literal em sua montagem e honesto na sua narrativa. Entrega a versão não televisada de um processo de impeachment, que mesmo que tenha seguido o rito constitucional não apresentou provas contundentes de crimes presidenciais, gerou instabilidade no país e aprofundou incertezas geradas desde o início do período, levando a questionamentos como: Quais retrocessos já se comprovaram desde o afastamento de Dilma? Quais as principais ameaças aos direitos dos brasileiros nesse momento?

Ao sair da sessão, é possível fazer uma sugestão de complemento ao título do filme que deveria se chamar “o processo impedido”, pois essa é a constatação que se tem após rever episódios complementados pelos novos não divulgados a época, onde vemos uma defesa de mãos atadas, com falas e apresentações ignoradas e menosprezadas por uma acusação teatral e relatores afinados com o “grande acordo” já conhecido.

Um filme necessário, que deveria ser visto por todos, especialmente por aqueles que foram, cegamente, a favor do impeachment. Certamente ficariam envergonhados.

Assista ao teaser oficial do filme: