Dia das Mães marca 12 anos de impunidade dos Crimes de Maio

O Dia das Mães comemorado neste domingo (13) tem um sabor amargo para ao menos 505 famílias que tiveram seus filhos assassinados brutalmente, em maio de 2006, quando as polícias paulistas e grupos de extermínio revidaram os ataques e assassinatos de 59 agentes de segurança protagonizados pela facção Primeiro Comando da Capital (PCC).

Protesto mães de mãe. crimes de maio em são paulo em 2006 reação da polícia ao PCC - Mães de Maio/Facebook

E outras tantas que viram seus familiares mortos anos depois, por grupos que se garantem na impunidade que se perpetua a cada chacina, como no caso dos 18 mortos em Osasco e Carapicuíba, em 2015.

Desde então, as famílias tentam, sem sucesso, conseguir resposta para a principal questão daquela semana entre 12 e 21 de maio: quem matou essas 505 pessoas? O estado brasileiro nega responsabilidade. O Ministério Público paulista arquivou quase todos os inquéritos sem que se chegasse a uma resposta

O governo paulista criou um Dia das Mães de Maio, mas nega que sua polícia tenha agido fora da lei. A Justiça alega não ver fatos que justifiquem a reabertura dos processos. A Procuradoria-Geral da República está há oito anos sentada sobre um pedido de federalização dos casos.

Oito em cada dez vítimas assassinadas nesses ataques eram jovens de até 35 anos. A quase totalidade era do sexo masculino (96% do total), mais da metade eram negros e pardos. E apenas 6% das vítimas tinham algum antecedente junto à Justiça.

A violência só parou após um acordo entre Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola – apontado como chefe do PCC – , o então secretário de Segurança, Saulo de Castro Abreu, e o de Administração Penitenciária, Nagashi Furukawa, sob o comando de Claudio Lembo (DEM), que governou o estado de abril a dezembro de 2006.

Relatório da Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, ligado à Secretaria Nacional de Direitos Humanos, apontou que em 60% dos casos, as vítimas foram baleadas na cabeça, indicando execução sumária, sem confrontos entre agentes e facções. Um relatório preliminar feito pela comissão ainda em 2006 apontava que 82 crimes cometidos no período eram de autoria desconhecida e apresentavam indícios de execução.

Já um relatório parcial feito pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), também em 2006, apontou que 431 vítimas tinham sido atingidas por disparos a longa distância (87,42% dos casos), 51 por disparos a curta distância e 11 por disparos encostados ao corpo. A análise também constatou que 2.359 tiros foram disparados contra 493 vítimas.

"Se isso não for esclarecido, vamos ter 'crimes de maio' ano após ano", afirmou centenas de vezes Débora Maria Silva, coordenadora do movimento Mães de Maio. Ela avalia que nunca houve qualquer preocupação em esclarecer os casos. Não houve perícia dos corpos e locais de assassinatos. O filho dela, o gari Edson Rogério da Silva, foi morto em 16 de maio de 2006, a alguns metros de casa. O caso foi arquivado a pedido do Ministério Público (MP), mas anos depois foi encontrada uma bala na coluna dele, após exumação de seus restos mortais.

Em abril de 2015, o Conselho Nacional do Ministério Público realizou audiência na sede do Ministério Público Estadual paulista para ouvir os relatos das Mães de Maio. O então presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Fundamentais do conselho, Jarbas Soares Júnior, e o ex-procurador-geral de Justiça de São Paulo, Márcio Fernando Elias Rosa, atualmente secretário de Estado da Justiça e Defesa da Cidadania estavam presentes e receberam o pedido delas para reabrir os casos. Nada aconteceu depois disso.

Sem resposta, os familiares vivência diariamente a dor da perda de seus filhos, mas sem parar de gritar todos os dias por justiça. "Nossos mortos têm voz", é o principal lema das Mães de Maio. Mas doze anos se passaram e algumas destas guerreiras já chegaram ao fim de suas vidas sem ver a justiça ser feita. Na última semana, Vera Lúcia Gonzaga dos Santos, uma das fundadoras das Mães de Maio, foi encontrada morta em sua cama. Hipótese mais provável: suicídio.

Há algum tempo ela vinha se afastando das atividades e dos amigos. Não suportava mais a perda da filha, Ana Paula, grávida de nove meses, de sua neta Bianca, ainda na barriga, e do seu genro, Eddie Joey. Eles saíram para comprar um lanche e foram mortos na rua, por um grupo de encapuzados em um carro, um dia antes do parto agendado, em Santos, litoral paulista. O caso também foi arquivado pelo MP.