O risco do ataque dos ocidentais à Síria, uma ação duvidosa

Trump ameaçou bombardear a Síria com mísseis depois do suposto ataque químico que potências ocidentais colocam na conta do governo de Bashar al-Assad. Macron diz ter provas, que até agora não foram vistas; Rússia tenta evitar o conflito, e ONU pede responsabilidade por parte dos países ocidentais

Por Alessandra Monterastelli *

Protestos nos EUA contra ataque na Síria - EPA

Após um ataque químico ainda sob investigação em Duma, na Síria, os Estados Unidos não hesitaram em ameaçar bombardear o país, como castigo para o presidente Bashar al-Assad, que segundo as acusações, teria atacado o próprio povo com os agentes químicos. Também pelo twitter, Donald Trump ameaçou a Rússia, aliada do governo sírio, dizendo que "os mísseis estão a caminho". 

A França e o Reino Unido anunciaram que se houver uma ação militar liderada pelos Estados Unidos contra o governo de Assad, ambos participarão da ofensiva (por motivos um tanto quanto questionáveis). A única que não topou fazer parte dessa empreitada dúvidosa foi Angela Merkel, primeira-ministra alemã, que afirmou que seu país não participará da coalizão formada pelos Estados Unidos. 

O presidente francês, Emmanuel Macron, disse ter provas contra o governo sírio, mas que ainda não foram divulgadas. Segundo informa a Abril Abril, um jornalista da BBC que cobre a agressão na Síria desde 2012, Riam Dalati, escreveu no twitter que a foto que serve de prova do uso de armas químicas pelo exército sírio em Douma foi encenada pelos Capacetes Brancos, grupo voluntário coordenado por serviços secretos ocidentais acusado de fazer propaganda contra o governo e de apoiar terroristas na região. Entretanto, o tweet foi apagado por violar a política editorial.

Já a primeira-ministra britânica do partido dos conservadores, Theresa May, divulgou uma nota em que afirmou ser "muito provável" que a ação química tenha sido efetuada pelo governo de Assad. A fala causa certa contradição, uma vez que não parece responsável apoiar um ataque bélico em um país que está há sete anos em guerra sem ter certeza do que está motivando esse ataque; a Organização para a Proibição de Armas Químicas ainda está investigando o caso, e mais explosões na região poderiam acabar com as provas que auxiliariam a uma conclusão sobre a autoria dos ataques químicos, e se estes de fato aconteceram. 

A primeira-ministra também falou em "aliviar o sofrimento humanitário". Essa justificativa para legitimar o ataque na Síria está sendo criticada por muitos, em especial pela ONU; um, pela questão de acabar com as provas do suposto ataque na região, e dois, porque causaria outra escalada de violência e conflitos em um país que começava a ter esperanças de paz novamente após longos anos de sofrimento e destruição. 

O embaixador russo na ONU, Vassili Nebenzia, disse temer o risco da ofensiva ocidental gerar uma guerra entre a Rússia e os EUA. Ele alertou para o risco de uma "escalada perigosa": "eu espero que não haja um ponto de não retorno, que os EUA e seus aliados desistam de ação militar contra um Estado soberano", disse. 

O secretário-geral da ONU, António Guterres, durante um pronunciamento sobre a Síria para o Conselho de Segurança, pediu para que todos os Estados “hajam com responsabilidade nessas circunstâncias perigosas”. “Crescentes tensões e a incapacidade de chegar a um acordo sobre o estabelecimento de um mecanismo de responsabilidade arriscam levar a uma completa escalada militar”, disse Guterres, segundo informa a Reuters.

Depois de gerar tanta tensão, de convocar uma reunião na tarde de quinta-feira (12) na Casa Branca que resultou em "nenhuma decisão final", Trump pareceu recuar levemente: publicou em seu twitter- por onde costuma tomar as decisões oficiais e fazer diplomacia– que "nunca disse" quando um ataque na Síria iria acontecer, e que "pode ser muito em breve ou nem tão cedo". O Secretário de Defesa dos EUA, James Mattis, pareceu querer colocar panos quentes na declaração de ataque "certo" proferida por Trump, também pelas redes sociais. 

"Eu não quero falar de um ataque específico que ainda está pronto", disse aos parlamentares. O secretário ainda manifestou preocupação com efeitos colaterais indesejados da possível ofensiva, uma vez que se a justificativa é salvar vidas de inocentes, "a questão é como evitar que isso tenha uma escalada que fuja do controle". Se formos analisar as ações militares dos Estados Unidos no Oriente Médio ao longo da história recente (como a Guerra do Iraque, a venda de armas aos Talbãs, a invasão do Afeganistão, etc), e as consequências dessas ações (como, por exemplo, o nascimento do Estado Islâmico), sabemos que o resultado não costuma ser bom. 

Além da Rússia, outra potência que é aliada do governo de Assad entraria em confronto com os EUA, em caso de ataque norte-americano: o Irã. Ali Akbar Velayati, conselheiro do líder da revolução iraniana e antigo ministro das Relações Exteriores do Irã, declarou em visita a Damasco que "o Irã estará sempre ao lado da Síria perante a agressão estrangeira".

Como explicou o professor Reginaldo Nasser, do Departamento de Relações Internacionais da PUC-SP em entrevista para o Portal Vermelho no começo da semana, o Irã é uma grande potência no Oriente Médio, não só em termos de influência, mas também em termos militares. O professor não acredita que um confronto entre Estados Unidos e Rússia irá acontecer, mas lembra que "o Irã não é o Iraque desmantelado da época da Guerra no Iraque, e sim uma potência".

Mattis disse ainda que se houver uma ação, essa será limitada, uma vez que o objetivo dos EUA é derrotar o Estado Islâmico na Síria (apesar de terem provas de que os norte-americanos estejam auxiliando na libertação de terroristas rendidos). Em todo caso, o que se espera é que esse ataque não aconteça. Em qualquer cenário, o resultado não parece ter como ser positivo; pelo cotnrário.