Lógica de justiça da direita: PEN quer retirar ação por favorecer Lula

O PEN/Patriotas, autor de uma das ações que tentam impedir a possibilidade de cumprimento de pena após condenação em segunda instância, decidiu que vai retirar o pedido de liminar protocolado na semana passada no Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo o próprio presidente do partido, Adilson Barroso, apesar de ser injusta a prisão em segunda instância eles preferem retirar o pedido, pois poderia beneficiar o ex-presidente Lula.

Por Dayane Santos

Adilson Barroso PEN Patriota - Jailson Soares/Politica Dinamica

"Pois é. Aí eu estou cometendo, sinceramente, uma pequena injustiça. Se a lei é para todos, então ninguém podia achar ruim se ela está beneficiando Lula entre outras pessoas. Mas, infelizmente, como estão pensando que fiz especificamente para salvar Lula, então desejo que resolva isso depois. Não agora", disse o presidente da legenda em entrevista ao Estadão

O partido aguarda decisão do Tribunal Superior Eleitoral para mudar o nome de PEN para Patriotas. No ano passado, o deputado Jair Bolsonaro (RJ) chegou a anunciar que concorreria ao Palácio do Planalto pela sigla, mas desistiu e optou o PSL.

Adilson Barroso disse que vai fazer uma coletiva de imprensa na Câmara nesta quarta (11) para explicar os detalhes da decisão do PEN, mas adiantou que o objetivo da liminar era "uniformizar" a posição do STF. ele diz que deu todo apoio ao ajuizamento da ação, em maio de 2016. “Mas naquela época Lula não era nem réu”, lembra. “Não quero que fiquem dizendo por aí que estamos defendendo a esquerda. Sou de direita, o partido é de direita, está no estatuto”, completou.

As delcarações de Barroso reforçam a lógica de como a direita acha que deve funcionar a Justiça. E é com essa mesma lógica que a direita estabelece como deve funcionar o Estado e as suas intituições: seletivamente. 

Ele confessa que a decisão de tentar retirar a ação é por interesse meramente político. Ao explicar porque a legenda mudou de posição, ele diz: "Porque aconteceu isso aí (prisão do Lula)". Segundo ele, a ação foi para ajudar a população e "não para petista", ainda que seja injusto.

A deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ) criticou a decisão , enfatizando que uma ação deste tipo não deve "objetivar o beneficio ou o prejuízo de um acusado". "Deve objetivar a presunção de inocência estabelecida na Constituição para evitar prisões arbitrárias de inocentes", disse.

O advogado Paulo Fernando, que atua na área eleitoral em Brasília, já tem a procuração para atuar em nome do PEN e fazer o pedido de desistência, destituindo do caso o criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro (Kakay).

O ministro Marco Aurélio Mello, relator dos casos na Corte, sinalizou que poderá levar a liminar a plenário também nesta quarta (11), o que gerou a reação de desistência do PEN. O desespero é tanto que Adilson Barroso disse até que pensa em desistir da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) apresentada no STF, no entanto, a Lei 9.868/1999, que trata sobre as ações declaratórias de constitucionalidade, prevê em seu artigo 5º, que "não se admitirá desistência".

“Entendemos que não é mais uma questão urgente”, disse Paulo Fernando, sobre a desistência da liminar. “Se ele [Marco Aurélio] insistir e levar para a pauta, vou à tribuna pedir para que seja reafirmada, então, a tese da prisão em segunda instância”, afirma o advogado do PEN. Seria uma situação insólita, ele reconhece, “mas se o ministro Gilmar Mendes mudou de opinião, por que eu não posso?”, disse.

Exceção

Para o professor de Direito Constitucional Luiz Tarcísio Teixeira, a posição do PEN revela muito do momento político-jurídico que o Brasil vive. Ele reforça que o interesse não é específico, mas de todo a população, então a parte não pode mais evitar a decisão do Supremo, pois pouco importa a quem a medida beneficia, já que o objetivo da medida cautelar é aponta uma ilegalidade e inconstitucionalidade.

"É uma questão que deve ser analisa em abstrato. Não se pode querer analisar na retirada do pedido, se beneficia este ou aquele, porque o pedido da inconstitucionalidade da prisão é em abstrato", salienta o professor.

"O que a gente aprende e ensina nas faculdades é exatamente que o aplicar do direito tem que aplicar a regra e a Constituição. Um dos primados do direito constitucional – tão sério que todos o sistema jurídico está preso à Constituição – é que ao se fazer tábula rasa da Constituição, vivemos a exceção em que os fins e quaisquer fins justificam quaisquer meios", enfatizou Luiz Tarcísio Teixeira.

Para o professor, ensinar direito hoje no Brasil "é muito difícil". "Como falar de Direito Constitucional quando o próprio guardião está rasgando a Constituição pelos fins? Não podemos por uma condição específica, transgredir a Constituição", afirma.

Processo maculado

De acordo com o professor, todo o processo contra o ex-presidente Lula está maculado. "Todos nós sabemos e o país sabe que a condenação é sem qualquer motivo jurídico", argumentou. "É por um suposto apartamento que está dado nos autos de recuperação de uma empresa", lembrou o professor, se referindo ao fato do tríplex ser apontando como propriedade do ex-presidente Lula, mas foi dado como garantia na recuperação judicial da empresa OAS.

"A condenação por si só é uma aberração jurídica cometida por ambos os tribunais, de primeira e segunda instância, agora, negar ao ex-presidente Lula ou suprimir o princípio da presunção da inocência, sem transito em julgado, é rasgar a Constituição. Isso é demonstração do estado de exceção", frisou o professor, dizendo ainda que acredita que a ministra Rosa Weber vai manter o seu contraditório voto para não se indispor com o golpe.

"Sou capaz de arriscar um prognóstico: a ministra não terá coragem de julgar de acordo com os sua consciência. É tão absurdo o que estamos vivemos. Não estamos vivendo um estado de direito. Estamos vivendo um golpe e no golpe vale tudo", acrescentou.