Agricultura sob Temer: alimentos mais caros, exportações em apuros

 Não é de hoje que alerto na coluna quanto à vulnerabilidade da agricultura brasileira. Não só por dependermos em 85% de fertilizantes importados para produzir, mas sobretudo pela forma oligopolizada como os fabricantes de matérias-primas se organizaram no exterior e os distribuidores ao mercado final se concentraram no Brasil. 

Por Rui Daher

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Afora, as demais mazelas que pegam mais forte na agricultura familiar. Os brasileiros, com o tempo, pagarão mais caro os alimentos ou os pequenos proprietários desistirão de plantar.

No que se refere às exportações, haverá falta de competitividade via custos, ou ainda, mais grave, desabastecimento, planejado ou não como guerra comercial. Com posição de destaque entre produtores e exportadores mundiais de alimentos, fibras, biocombustíveis e produtos da silvicultura, o Brasil incomoda concorrentes, entre eles um presidente “pele laranja” que, atualmente, destrói regras do comércio internacional. Enfim, vamos à batalha com o arsenal já destruído.

Diante da disposição do presidente da Petrobras, Pedro Parente, de hibernar (parar de produzir) as unidades de fertilizantes nitrogenados, localizadas na Bahia e Sergipe, as velhas e ainda boas FAFEN (Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados), a ABIQUIM, Associação Brasileira das Indústrias Químicas, se posicionou através de forte comunicado contrário.

Com total razão. Centenas de empresas brasileiras misturadoras e fabricantes de fertilizantes foliares dependem da produção da amônia e da ureia fabricadas nessas unidades.

Segundo a associação, “as duas unidades de fertilizantes da Petrobras possuem capacidade de produção conjunta de 36,3 mil toneladas de ácido nítrico, quase 1 milhão de toneladas de amônia e mais de 1,1 milhão de toneladas de ureia, sem contar outros produtos derivados do próprio processo, como dióxido de carbono, sulfato de amônio e ARLA (ureia diluída, utilizada para redução das emissões de NOx nos caminhões que utilizam diesel)”.

O alerta a mim chegou pelo GGN, onde também colaboro. Assim o jornalista Luís Nassif se referiu a Pedro Parente: “Não se sabe o que Pedro Parente pretende à frente da Petrobras. Todos seus atos são para desmontar e abrir mão de qualquer papel relevante, como estruturadora de investimentos no país. É de uma irresponsabilidade com o país que chama a atenção, ainda mais partindo de quem fez parte de sua carreira no setor público”.

Pois bem, eu sei. O intuito é retalhar a BR e tornar mais fácil sua privatização. Parente forma com Pérsio Arida e Elena Landau a troika ‘internacionalista’, que pensa soberania não importar mais no planeta globalizado.

A história vem de longe. Começa, de forma mais intensa, nos primeiros anos da década de 1990, com a privatização pirata da produção nacional de fertilizantes (Fosfértil, Ultrafértil e Goiasfértil), incentivada pelo ex-presidente Collor, mantida em banho-maria por Itamar Franco e, finalmente, sacramentada por Fernando Henrique Cardoso e equipe econômica radicalmente neoliberal e privatista.

O que se viu depois foi uma tentativa de, assegurada a produção nacional de matérias-primas por grupo privado de grandes fabricantes, nacionais e estrangeiros, ser possível administrar o mercado e extinguir a concorrência predatória que ocorria na ponta e ameaçava quebrar empresas tradicionais do setor.

Vira-e-mexe, mexe-e-vira, assim a história se desenrolou: quem não entrou no consórcio comprador (Fertifós) quebrou ou foi vendido; durante poucos anos de domínio da produção nacional, a concorrência arrefeceu; os novos proprietários não colocaram centavos em novos investimentos para ampliar a capacidade de produção; por outro lado, a demanda da agricultura cresceu de forma acelerada e o setor voltou a aumentar a necessidade de importações.

O plano de privatização virava geleia. As empresas do consórcio voltaram a competir, não aguentaram, e optaram por vender marcas e ativos às suas parceiras multinacionais. Os donos das empresas, que receberam as estatais do BNDES, em avaliações feitas pelo Capeta na bacia das almas, saíram limpos e com muita grana.

Eventos mais recentes, como a venda das minas de potássio da Vale, em Sergipe, para a Mosaic (Cargill), e o fechamento das duas unidades da FAFEN, são absurdos mal-intencionados, mas corolário e quireras de quase 30 anos de aniquilamento da indústria nacional de matérias-primas para fertilizantes. Durante esse período, as únicas tentativas de salvar alguns trocados ocorreram nos governos Lula-Dilma, logo interrompidos pelo golpe de 2016.

Agora, babau. Rezem, pois o raciocínio de Parente (“já importamos 85% das necessidades, o que representará um pouquinho a mais”?) é estúpido, generalista e com interesses ideológicos escusos.

Taí um Parente que eu não quero. É serpente.