Sergio Amadeu: Tecnologia da informação é crucial para desenvolvimento

Não é possível falar em desenvolvimento sem colocar em pauta o tema da tecnologia da informação. E, nessa seara, o Brasil ainda vai mal. A avaliação é de Sergio Amadeu, doutor em sociologia, pesquisador do mundo digital e professor da UFABC. Em evento promovido pela Fundação Mauricio Grabois, ele chamou a atenção para distorções na legislação eleitoral brasileira, que veda propaganda paga na internet, mas abre exceções que beneficiam empresas estrangeiras, como Google e Facebook.

sergio amadeu internet foto deborah moreira

“A principal questão hoje do desenvolvimento, além da questão da infraestrutura, é a chamada economia informacional. O mundo está numa economia informacional. É o principal fator de rendimento dos Estados Unidos e será, em breve, também da China”, disse Amadeu, durante o seminário Desafios para a retomada do desenvolvimento nacional, realizado em São Paulo, na última sexta (23).

O pesquisador iniciou sua fala com uma comparação crítica. “O Whatsapp foi comprado há pouco pelo Facebook por US$ 22 bilhões de dólares. Então estão vendendo a Eletrobras por um quarto do valor do Whatsapp”, afirmou, após declarar que a política neoliberal em curso no atual governo atua contra o conjunto das empresas estatais, que visa desabilitar o poder econômico do país.

Em seguida, ele deu exemplos que mostram o peso que as empresas do mundo informacional têm para a economia e o quanto Brasil ainda precisa caminhar para se inserir neste setor. Segundo Amadeu, em 2016, a Apple faturou US$ 215 bilhões; a Amazon, US$ 135 bilhões; o Google, 90,2 bilhões; e o Facebook, 27,6 bilhões.

“Só essas quatro, conhecidas como tubarões brancos, tiveram U$ 484,4 bilhões de dólares de faturamento em 2016. Quero comparar com o PIB brasileiro, que, no mesmo ano, foi de US$ 1,7 trilhões. Quatro empresas do mundo informacional perfazem mais que um quarto do PIB brasileiro”, calculou, para, em seguida, fazer uma pergunta retórica aos presentes sobre a presença de empresas brasileiras expressivas no mundo digital.

“Esse caso do vazamento da Cambridge Analytics, não foi um vazamento. E o grande problema não é a Cambridge, mas o Facebook. E hoje 78% dos brasileiros estão conectados ao Facebook e 84% se comunicam diariamente pelo Whatsapp, empresa do Facebook. Pergunto a vocês o nome de uma empresa brasileira que tenha uma rede social no mundo hoje”, colocou, numa referência ao escândalo de uso ilegal de dados dos usuários do Facebook pela Cambridge Analytics.

Como exemplo do descaso que o Brasil tem tido com esse setor, ele mencionou que uma assessora da ex-presidenta Dilma Rousseff teria comparado tecnologia a uma caneta, para dizer que tanto fazia qualquer uma, usava-se a que funcionasse. “Tecnologia da informação não é uma caneta, é um fator de desenvolvimento crucial. São tecnologias da inteligência, que nós não dominamos. Os que dominaram a revolução industrial viraram os países ricos do século 20. Não foram os que apostaram em agricultura. Porque a tecnologia de ponta era a tecnologia industrial. Hoje, são as tecnologias informacionais”, defendeu.

“Chamo a atenção para quem vai discutir desenvolvimento – sei que não é uma pauta muito palatável, porque nossas condições são muito ruins – mas precisamos incluir no temário, além da catastrófica situação da nossa infraestrutura, a nossa ausência no mundo da tecnologia da informação, ou nossa pequena inserção ou, pior, um conjunto de empresas que são compradoras de canetas. Tecnologia da informação não é caneta. É tecnologia estratégica. Ou você domina, ou é usuário. Ou desenvolve, ou não é nada”, apontou.

O pesquisador também falou sobre a legislação para as eleições de 2018, aprovada no Congresso no final do ano passado. O artigo 57-C da lei eleitoral diz o seguinte: “É vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos, coligações e candidatos e seus representantes”.

Amadeu indica que a brecha beneficia o Facebook, já que é lá que se impulsionam conteúdos mediante pagamento, mas pode prejudicar determinadas candidaturas. “Impulsionar quer dizer pagar para um público poder ver um conteúdo publicado na sua página no Facebook. Aquele candidato da esquerda, que acreditava que ia fazer campanha boca a boca na rede, que não tem recursos, vai ter a distribuição orgânica pelo Facebook bloqueada. Então a nossa lei nacional proíbe propaganda paga no UOL, nos blogs, no G1, mas não no Facebook”, criticou.

De acordo com o pesquisador, não daria para beneficiar só o Facebook, desconsiderando o Google, e o legislador garantiu que a propaganda paga também possa ser destinada à empresa, acrescentando um artigo que diz: “inclui-se entre as formas de impulsionamento de conteúdo a priorização paga de conteúdos resultantes de aplicações de busca na internet”.

“Na hora em que você fizer uma busca no Google sobre educação, vai aparecer o candidato fulano de tal dizendo que é o melhor candidato nos primeiros resultados da busca. Isso significa que estamos, na nossa legislação, permitindo campanha paga na internet em dois grupos: dois grupos norte-americanos. Não dá”, criticou.