O envolvimento do Facebook no escândalo que favoreceu Trump 

O Facebook sofreu um forte abalo no último sábado com a revelação de que as informações de mais de 50 milhões de pessoas foram utilizadas sem o consentimento delas pela empresa americana Cambridge Analytica para fazer propaganda política, especificamente a favor das campanhas de Trump e do Brexit 

Mark Zuckerberg

A empresa teria tido acesso ao volume de dados ao lançar um aplicativo de teste psicológico na rede social. Aqueles usuários do Facebook que participaram do teste acabaram por entregar à Cambridge Analytica não apenas suas informações, mas os dados referentes aos amigos do perfil.

A denúncia, feita pelos jornais The New York Times e The Guardian, levantou dúvidas sobre a transparência e o compromisso da empresa com a proteção de dados dos usuários.

A denúncia já está trazendo prejuízos para o Facebook. as ações da companhia recuaram 2,6%. Somadas as perdas de segunda-feira (19), a desvalorização da empresa desde que o caso veio à tona no fim de semana é de quase US$ 50 bilhões, conforme informa o Valor Econômico.

A empresa também entrou na mira de autoridades nos Estados Unidos e no Reino Unido. O deputado britânico Damian Collins convocou o CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, para depor diante de um comitê legislativo – ele tem até 26 de março para responder. As autoridades também estão trabalhando para conseguir um mandado de busca e apreensão para entrar na sede da Cambridge Analytica e recolher material que ajude a elucidar o caso.

Explicando o caso

A BBC Brasil fez uma reportagem em que explica detalhadamente o caso. Segundo a agência britânica, a Cambridge Analytica é uma empresa de análise de dados que trabalhou com o time responsável para campanha do republicano Donald Trump nas eleições de 2016, nos Estados Unidos. Segundo o jornal The Guardian, na Europa a empresa foi contratada pelo grupo que promovia o Brexit (a saída do Reino Unido da União Europeia). A empresa é propriedade do bilionário do mercado financeiro Robert Mercer e era presidida, à época, por Steve Bannon, então principal assessor de Trump.

A Cambridge Analytica teria comprado acesso a informações pessoais de usuários do Facebook e usado esses dados para criar um sistema que permitiu predizer e influenciar as escolhas dos eleitores nas urnas, segundo a investigação dos jornais The Guardian e The New York Times.

Na noite de segunda, a rede de TV britânica Channel 4 veiculou uma reportagem em que o diretor-executivo da Cambridge Analytica, Alexander Nix, foi filmado conversando sobre uso de suborno, ex-espiões e prostitutas para encurralar políticos. Nix foi suspenso da diretoria em seguida.

Um ex-funcionário da empresa, Christopher Wylie, revelou ao Guardian que o esquema começou em 2014, dois anos antes da eleição americana de 2016 e três anos antes do Brexit.

As informações dos usuários do Facebook foram coletadas por um aplicativo chamado thisisyourdigitallife (essa é sua vida digital, em português), que pagou a centenas de milhares de usuários pequenas quantias para que eles fizessem um teste de personalidade e concordassem em ter seus dados coletados para uso acadêmico. Além da óbvia questão de que muitos usuários não leem os longos termos e condições e mal sabem que estão dando suas informações para os desenvolvedores desses testes, o grande problema foi que o aplicativo também coletou as informações dos amigos de Facebook das pessoas que fizeram o teste. Ou seja, se uma pessoa respondesse o quiz, estaria entregando informações privadas não apenas do seu perfil, mas também dos seus amigos.

Os dados incluíam detalhes sobre a identidade das pessoas – como nome, profissão, local de moradia – seus gostos e hábitos e sua rede de contatos. Os usuários do aplicativo não faziam ideia de que isso tudo seria usado para ajudar a eleger Donald Trump.

O aplicativo se aproveitou de uma "brecha" nas normas do Facebook – à época, a política da plataforma permitia à aplicativos externos a coleta de dados de amigos das pessoas, mas dizia que eles deveriam ser usados apenas para melhorar a experiência do próprio usuário no aplicativo.

Era proibido que os dados fossem vendidos ou usados para propaganda – mas não havia controle do Facebook sobre esse uso.


Wylie afirmou que os dados vendidos à Cambridge Analytica teriam sido usados para catalogar o perfil das pessoas e, então, direcionar, de forma mais personalizada, materiais pró-Trump e mensagens contrárias à adversária dele, a democrata Hillary Clinton. A base de dados coletada é uma ferramenta poderosa porque permite que as campanhas identifiquem pessoas que estão em dúvida e direcionem a elas mensagens com maior probabilidade de convencê-las. Wylie, que entregou o esquema detalhado para os jornalistas do Times e do Guardian, saiu da empresa em 2015 junto com uma parte da equipe original, que estava insatisfeita com as inclinações políticas dos donos da Cambridge Analytica.

Consequencias para o Facebook

O vazamento foi levado ao conhecimento do Facebook pela primeira vez há cerca de dois anos, mas a empresa só suspendeu a Cambridge Analytica da plataforma na última sexta-feira (16)– depois que as reportagens procuraram a empresa para pedir uma resposta sobre o caso. A rede social diz que o aplicativo usado para a coleta dos dados foi retirado do ar em 2015.

Além da queda na bolsa de valores e da intimação para que Zuckerberg vá depor na justiça (ele ainda não fez nenhuma declaração sobre o caso), o antigo mentor do empresário, Roger McNamee, disse à rede de TV norte-americana CNN que a crise de confiança pública atravessada pelo Facebook "vai destruir a empresa", conforme informou o R7.

De acordo com McNamee, a empresa "sequer deu o primeiro passo de admitir que há um problema". "Se eles não fizerem algo muito em breve, as pessoas vão perceber que não podem mais usar o Facebook", afirma. Ainda de acordo com o R7, a posição de McNamee se junta a de um grupo de investidores, técnicos de tecnologia e executivos que questionam o poder que as plataformas de tecnologia exercem e seu impacto na sociedade.

Informações de mais de 50 milhões usuários da rede social foram vazadas sem o consentimento deles pela empresa americana Cambridge Analytica para fazer propaganda política.