A crescente agressividade de Trump contra o mundo

Editorial do jornal progressista mexicano La Jornada analisa os movimentos diplomáticos e administrativos de Trump. O presidente dos EUA aposta em aprofundar a hostilidade do seu governo para com a comunidade internacional, e escancaram o caos que a atual administração estadunidense promove

Donald Trump discursa no Congresso dos Estados Unidos

A demissão de Rex Tillerson como secretário de Estado e sua substituição pelo extremista Mike Pompeo, que até então era o diretor da Agência Central de Inteligência (CIA, por sua sigla em inglês), assim como a designação de Gina Haspel – uma agente veterana vinculada a práticas regulares de tortura em prisões no exterior – como nova chefa do mais poderoso serviço de inteligência do mundo, mostram uma aposta do presidente Donald Trump em aprofundar a hostilidade do seu governo para com a comunidade internacional, e escancaram o caos que a atual administração estadunidense promove, e que poderia levar o planeta a tempos ainda mais obscuros para a vigência dos direitos humanos e da legalidade no contexto internacional.

Embora não seja surpreendente, não se pode passar em branco a forma grosseira e pouco institucional com a que o hóspede da Casa Branca executa suas decisões: através de mensagens via twitter. Foi assim que Tillerson soube que havia sido despedido – e curiosamente, o subsecretário Steve Goldstein, que comentou sobre esta decisão pela mesma via, também foi sacado de seu cargo, horas depois. Por outra parte, é preocupante a designação de Pompeo, um falcão do chamado Tea Party (grupo ainda mais ultraconservador dentro do já ultraconservador Partido Republicano) que promove a espionagem dos cidadãos dentro das dependências governamentais, defende a tortura, autoriza a intensificação das operações encobertas no Afeganistão e vocifera contra o acordo de desnuclearização do Irã, porque o considera brando demais para com o país persa. O perfil e o histórico do novo secretário tornam inevitáveis os temores sobre um endurecimento das posturas de Washington, que já eram beligerantes e agressivas para com o resto do mundo, e tendem a se acentuar.

Diante de tal situação, também é evidente que tanto o tom quanto o conteúdo das recentes conversas de alguns governantes da América Latina com Tillerson – durante a pequena turnê que este realizou em fevereiro pela região – estarão sujeitos a uma revisão. Assim como os inesperados avanços que o agora ex-secretário de Estado havia conseguido para diminuir a tensão entre Estados Unidos e Coreia do Norte, agora podem desvanecer em qualquer momento.

Tão ou mais preocupante é a chegada de Gina Haspel à direção da CIA, que leva a pensar que o papel de Washington como violador mundial dos direitos humanos pode alcançar níveis ainda mais escandalosos que durante os períodos presidenciais de George W. Bush, quando tanto essa agência como também o Pentágono e a Agência Nacional de Segurança (NSA, por sua sigla em inglês) estabeleceram uma rede de centros de torturas e assassinatos em dezenas de países, com o pretexto da guerra contra o terrorismo.

Nesse sentido, é pertinente recordar que Haspel supervisou um dos centros, situado na Tailândia, onde dezenas de supostos militantes da Al Qaeda foram brutalmente torturados com afogamentos – método chamado waterboarding, no jargão da CIA –, e que ela mesma, posteriormente, se encarregou de destruir os vídeos que documentavam tais atrocidades.

Para aumentar a complexidade da questão, essas mudanças em cargos tão relevantes ocorreram no mesmo dia em que Trump visitou os protótipos do muro que pretende construir na fronteira comum com o México – um gesto que expõe sua agressividade pessoal – num prédio situado em San Diego, Califórnia. Como era de se esperar, o mandatário aproveitou a visita para criticar e até ameaçar esse estado, que se opõe à xenofobia presidencial e se nega a colaborar com a perseguição de imigrantes.

O mais alarmante em tudo isso é o fato de que, em meio a toda essa hostilidade exalada pelo governante estadunidense, é muito difícil encontrar uma estratégia política definida e clara. Pelo contrário, tudo parece indicar que Trump se move por reações viscerais e imprevisíveis, seja para distrair a atenção interna dos múltiplos escândalos nos que está envolvido, seja para dar soluções conjunturais e imediatas aos interesses corporativos aos que ele representa, e para satisfazer os setores mais atrasados e brutais da sociedade estadunidense – os quais, no fim das contas, são os que conformam sua base eleitoral.