Eleições na Colômbia: extrema-direita mostra poder de fogo

Ainda é cedo para analisar em profundidade o que significa o resultado eleitoral da primeira disputa depois da guerra de meio século na Colômbia. Porém, uma coisa é certa: a extrema-direita mostrou poder de fogo. A vitória esmagadora de Álvaro Uribe deixa claro que a paz estável e duradoura ainda tem um longo caminho para ser conquistada.

Por Mariana Serafini

Álvaro Uribe e Ivan Duque - Reuters

As eleições parlamentares realizadas neste domingo (11) são um marco na história da Colômbia, foi a primeira vez que a ex-guerrilha, e agora partido, Farc, participou ativamente do processo. E foi também a primeira vez que os colombianos foram às urnas depois da guerra que durou mais de 50 anos no país.

O que chama a atenção neste quadro, no entanto, é a vitória esmagadora da extrema-direita. O ex-presidente Álvaro Uribe foi o candidato ao Senado mais votado, com 875.554 votos. Com um discurso de ódio, ele é contrário ao acordo de paz e à inclusão dos ex-guerrilheiros à vida civil. Em muitos discursos rechaçou a campanha pelo fim da guerra e foi o maior porta-voz dos que defenderam o “não” no referendo realizado em 2016 para aprovar o acordo entre as Farc e o governo.

Em diversas ocasiões, Uribe ameaçou retomar a guerra, caso voltasse a ser presidente. Isso porque, ele discorda dos esforços feitos pelo mandatário Juan Manuel Santos para estabelecer um acordo com as Farc e deixa claro que, caso volte ao comando, pretende reverter a assinatura do acordo que levou quatro anos para ser elaborado sob a fiscalização da ONU e diversos observadores internacionais.

O crescimento da direita se dá em um momento de conflito no continente em que a Colômbia – junto com o Brasil – avança sobre a Venezuela sob o comando direto dos Estados Unidos. As cidades fronteiriças colombianas têm servido de palco para ataques e tentativas de desestabilização contra o governo do presidente venezuelano Nicolás Maduro. O país apoia e fortalece as sanções de Washington que configuram, principalmente, bloqueio econômico contra Caracas.

“Xérox” de cédula eleitoral

Este ano, mais de 36 milhões colombianos estavam habilitados a votar, porém, pouco mais de 17 milhões foram às urnas, o equivalente a 48,82%. Além de eleger os 280 representantes do Senado e da Câmara, os eleitores também escolheram os candidatos que irão concorrer à presidência no próximo dia 27 de maio, numa espécie de prévias.


Com a falta de cédulas oficiais, o órgão responsável pelas eleições autorizou a votação em fotocópias 

A questão é que o Conselho Eleitoral colombiano não estava preparado para esta votação. Durante o processo, acabaram as cédulas destinadas à escolha dos candidatos à presidência e as pessoas foram autorizadas a votar com fotocópias.

A justificativa imediata do responsável pela organização das eleições, Juan Carlos Galindo, foi de que haviam sido impressas 30 milhões de cédulas e mais pessoas do que o esperado compareceram às urnas. No entanto, o saldo final mostrou que pouco mais de 48% dos eleitores votaram, na verdade.

Estreia da Farc

A antiga guerrilha escolheu manter a mesma sigla para o partido que se chama Força Alternativa Revolucionária do Comum, apelidado nesta campanha de o “Partido da rosa”, em alusão ao símbolo do movimento político.

Um dos pontos chave do acordo de paz com o governo, firmado no ano passado, foi a participação eleitoral da ex-guerrilha. Eles conquistaram o direito a cinco cadeiras no Senado e cinco na Câmara nestas eleições e nas próximas, daqui a quatro anos, mesmo que não tenham votos o suficiente para tal.

Nesta primeira disputa, o novo partido contabilizou 52.532 votos para o Senado e 6.106 para a Câmara. Ao longo da campanha, a sigla precisou lidar com intimidações dos paramilitares que continuam atuando nas zonas rurais onde a guerrilha foi desmobilizada, e episódios de violência contra líderes camponeses e sindicais.

Além disso, a maior concentração de eleitores da Farc está no campo, justamente a área mais afetada com a falta de acesso às urnas. De acordo com a Missão de Observação Eleitoral (MOE), 360 municípios sofreram com dificuldade de acesso aos centros de votação e a complexidade do sistema eleitoral inibe os eleitores com baixa escolaridade.

O presidente do partido, o ex-guerrilheiro Rodrigo Lodoño, conhecido como Timochenko, agradeceu o apoio das pessoas que tiveram coragem de depositar seu voto pela paz, mesmo diante de uma imensa campanha de ódio. “Agradecemos imensamente o apoio à nossa alternativa, porque cada voto pelo partido da Rosa foi um voto valente. Foram pessoas que, apesar da propaganda de ódio, ouviram nossa mensagem clara: paz com justiça social”.