Taurina, de Anelis Assumpção, versos que alimentam o dia a dia

Da capa ao título, passando pela foto de divulgação de Anelis Assumpção, tudo remete ao signo Touro e também ao animal. Será? Uma pesquisa rápida com amigos do Twitter revelou que os taurinos são esfomeados, intensos no amor (para o bem e para o mal), egoístas, sensíveis, bonitos, sensuais e preguiçosos. O disco também é feminista ao ponto que o animal no caso é uma vaca, como na capa de Camile Sproesser, que remete ao alimento e até ao sagrado como na Índia.

Por Hugo Morais

Anelis Assumpção - Caroline Bittencourt

O novo disco de Anelis Assumpção fala do dia a dia, do amor, das perdas, das neuras, tudo com cheiro de cozinha. Recheado de referências a comida como mote para o amor e claro a desilusão. Para sentimentos sexuais, para demonstrações de afeto que podem ser frutas ou um delicioso pastel de vento com o coração dentro, como diz a letra de “Pastel de Vento”. Uma boa definição para algumas frustrações do dia a dia. As frustrações, aventuras e preguiça do passar do tempo também podem ser vistas como demonstrações do feminismo sem cair no mais do mesmo do linguajar. Nas entrelinhas da poesia está tudo lá.

Em “Gosto Serena” Anelis canta “degustar a palavra”. O disco é bem isso. Uma degustação de palavras, já que sua poesia passeia e costura o que somos e nossa relação com a comida. Nossa não, dos taurinos. Por aqui uma declaração de amor pode ser um cuscuz com ovo ou queijo coalho. Tapioca na manteiga, molhada no leite de coco ou com qualquer recheio que exista. No café, no almoço e no jantar. Sem restrições. Pode ser apetite, pode ser gula, pode ser amor. Fazer uma tapioca para pessoa amada e uma xícara de café é uma bela demonstração de amor.
Ouvindo Taurina é inevitável não lembrar de Rita Lee em “Macarrão com linguiça e pimentão” do disco Build Up.

Há quem achou Taurina um disco fraco. Não é fraco, talvez menos exigente na parte musical em comparação com os anteriores Amigos Imaginários (2014) e Sou Suspeita, Estou Sujeita, Não Sou Santa (2011). Mas que no fim das contas os sambas, blues (lembrei da potiguar Simona Talma), reggae/dub e rock seguem uma linha de produção aos moldes dos discos anteriores, de modo que bate com o que Karoline, Fernando, Mariana, Gabi e Caio disseram. Mais precisamente o que Andreza Cruz, uma taurina, me disse sobre o signo: “gostam de estabilidade em todos os sentidos, consequentemente resistentes a mudança”.

A perda também é vista e descrita como jejum. Anelis perdeu a irmã, Serena, para um câncer. O jejum pode ser ela ou um amor perdido, dependendo do ponto de vista de quem lê e ouve. A bebida, no caso a cerveja, também é contemplada em “Amor de Vidro” e é retrato fiel de tantos casos de amor mundo afora. Seja em se quebrar fácil como o vidro ou se envolver e sorver o líquido. O samba convida a ir a um boteco e se entregar, como descreve a música: “uma ampola e dois cigarros e me entrego sem pestanejar”.

O disco é um lançamento da Natura Musical e Scubidu Music. Como de costume conta com várias participações e estão no disco Liniker e Os Caramelows, Tulipa Ruiz, Ava Rocha, Vitor Hugo, Thalma de Freitas e Céu. A banda é formada por Lelena Anhaia, MAU, Zé Nigro, Ed Trombone, Saulo Duarte e Thomas Harres. A produção foi de Beto Villares.

Se o disco não é excelente, também não é ruim. É um bom disco onde a poesia se sobressai ao lado musical. E tem seu lado feminista, como dito antes, ao ponto que os sentimentos, vivências e desejos são mostrados nus e crus, sem vergonha de ser quem ela é.

Ouça na íntegra: