'Temer banaliza uso das Forças Armadas para esconder sua incompetência'

A intervenção feita pelo governo federal na Segurança Pública do Rio de Janeiro tem sido alvo de críticas e denúncias de diversos setores da sociedade que consideram a medida como inconstitucional, podendo gerar efeitos no Estado Democrático de direito.

Por Dayane Santos

Perpétua Almeida: Defesa como vértice da retomada do desenvolvimento - Renato Araújo

O governo de Michel Temer utilizou um remédio constitucional, ou seja, previsto em lei para supostamente solucionar a crise na segurança que vive o Rio de Janeiro. Mas o problema não é de exclusividade da população fluminense, pelo contrário, é uma das principais preocupações dos brasileiros que vivem reféns do medo e da insegurança.

Para Perpétua Almeida, ex-deputada e ex-assessora do Ministério da Defesa na área relativa à política nacional de defesa, de indústria de defesa, afirmou em entrevista ao Portal Vermelho que, apesar de excepcional, a intervenção é um instrumento previsto na Constituição como forma de garantir a lei e a ordem no país.

“O problema que vejo é o excesso ou banalização do uso da chamada GLO (Garantia da Lei e da Ordem). A medida em que recrudesce a crise política, financeira e fiscal, vivenciada pela União e as unidades da federação, as Forças Armadas vão sendo empregadas mais frequentemente, principalmente para resolver questões de segurança pública, como os ocorridos em Roraima, Rio Grande do Norte e, com mais frequência, no Rio de Janeiro. E é claro q esse uso excessivo de GLO representa um desvio de finalidades das responsabilidades das Forças Armadas. Aliás, quem tem constantemente se posicionado sobre excesso do emprego de GLO’s é o próprio comandante do Exército, o general EduardoVillas Bôas”, analisou Perpétua.

Para ela, há uma “excesso ou banalização” do uso das Forças Armadas na área da segurança pública. “Tem sido um remendo, perante a incapacidade do governo de resolver os problemas estruturais em que se encontra o Brasil nesta crise federativa”, afirma a ex-deputada eleita pelo PCdoB do Acre.

Perpétua endossa as críticas de que o governo usa a intervenção para atender interesses políticos da cúpula do MDB ligada a Michel Temer.

“O governo até tem se esforçado para esconder, mas é visível que tem um fundo político eleitoral nessa iniciativa do Temer, no sentido de mudar a pauta impopular que ele tocava, como é o caso a reforma da Previdência, pela pauta da segurança pública, que tem apelo popular. Um problema real, dramático no cotidiano, na vida das pessoas, que precisa ser enfrentado”, frisou.

Ela enfatiza que o uso político desta pauta não torna a situação da criminalidade e da violência um problema menos grave. “O narcotráfico, uma real ameaça nacional, tem provocado o caos em várias regiões do país, bairros, favelas, presídios, e exige medidas duras por parte do governo federal. Quando o crime organizado dita as ordens, impedindo uma ação de Estado, o Estado precisa mostrar que está no controle, garantir a segurança da população.”

Mas Perpétua reforça que a intervenção na segurança do Rio de Janeiro “não vai resolver a questão”. Ela cita dados levantados pela Federação das Favelas do Rio de Janeiro que mostram que o governo, em pouco tempo, já gastou mais nas operações militares que em investimentos sociais nas mesmas áreas. “O que mostra que, se por um lado precisamos de um choque de mudanças estruturantes no sistema de segurança, também necessitamos de um choque de ação social que mire a geração de emprego e renda para a população”, defende.

Sobre a preocupação em torno de possíveis abusos que podem ocorrer com a intervenção, principalmente em áreas de comunidades, ou seja, mais pobres, Perpétua destaca que é de fato um risco.

Ao abordar a reivindicação feita por alguns setores de elevar a proteção jurídica para garantir que as tropas militares atuem na intervenção, Perpétua afirma que a polêmica foi superada quando o Congresso aprovou lei que estabelece a Justiça Militar como o foro para julgamento de eventuais crimes cometidos por militares contra civis, durante operações com emprego de militares, em GLO e outras missões.

“Essa proteção para as Forças Armadas atuarem em “ambiente urbano”, tem a ver, especificamente, com a natureza das tropas, já que essas são preparadas, fundamentalmente, para a guerra, para a aniquilação do inimigo. E não podemos deixar de pensar que essa é sempre uma ação temerosa, já que o emprego de soldados, preparados mais precisamente para a guerra, entrando em ambientes urbanos, lidando com a rotina da população, é sempre um risco”, declarou.

Ela lembra que em audiência nas comissões de Relações Exteriores da Câmara e do Senado, o próprio comandante das Forças Armadas, general Eduardo Villas Bôas, declarou que a sociedade brasileira está doente quando permite “que nossos soldados apontem armas para nosso povo”.