A coluna Praça Oito de 05/02/18 e a régua de Judith

 O jornal “A Gazeta” é o principal jornal de meu estado, o Espírito Santo, embora perca em vendas para “A Tribuna”, seu concorrente direto. Estão para o Espírito Santo, como os jornalões “O Globo”, “O Estado de São Paulo” e a “Folha de São Paulo” estão para o Brasil, ou seja, são, ao fim e ao cabo, porta-vozes dos grandes grupos econômicos locais e nacionais, e das forças políticas que os representam.

 A mais tradicional coluna política de “A Gazeta” chama-se Praça Oito, que já teve mais influência, mais glamour, já foi mais “fonte” das novidades do mundo político, mas hoje, com os fatos e boatos circulando online, já não desperta mais tanto interesse.

 

Mesmo assim é uma coluna respeitada e, de certa forma, ainda tem um certo peso na formação da opinião dos leitores do jornal, o que deveria contribuir para maior esmero com as opiniões ali emitidas, mas que, infelizmente, não é o que acontece.

 

A edição de hoje (05/02) abre uma série de textos que irão tentar convencer o leitor que Lula e Bolsonaro têm muito mais semelhanças do que antagonismos. E começa por dizer que a principal semelhança entre os dois é que ambos repudiam o papel da imprensa, “um dos mais importantes pilares de qualquer nação que se pretende democrática”.

 

O colunista, indo na onda dos apelidos, inicia essa inacreditável e absurda abordagem com o título “Bolsolula: opostos, mas nem tanto”.

 

Destaca o titular da coluna que o “desapego de Lula pelo trabalho da imprensa e o ‘germe autoritário’ incubado em seu discurso político serão abordados na sequência das colunas.”

 

Vamos aguardar para ler e comentar, é claro, mas, a depender do que foi publicado hoje, pois pelo que já é afirmado na coluna Praça Oito de hoje, afirmando semelhanças entre Lula e Bolsonaro, inclusive quanto ao suposto viés autoritário de Lula, expresso, como diz a coluna, no seu repúdio ao trabalho da imprensa.

 

São afirmações tão estapafúrdias, fruto de uma leitura distorcida da realidade ou, pior, propositadamente construída com o intuito de influenciar o leitor de que é isso mesmo.

 

Que Bolsonaro é adepto do autoritarismo, não é necessário nenhum exercício analítico para se chegar a essa conclusão. Seu autoritarismo é autodeclarado e vem embutido com tudo que há de pior na humanidade, como homofobia, racismo, machismo, misoginia…, ou seja, fascismo na veia.

 

Também está muito claro que Bolsonaro não é o candidato dos sonhos das oligarquias nacionais e seus porta-vozes tradicionais, eles mesmos membros dessa oligarquia, como os grandes grupos de mídias com seus decadentes jornais impressos.

 

Já sabemos o mais que virá nas próximas colunas, num árduo e ingrato exercício de redação na tentativa de sustentar a tese de que Lula é autoritário e, por isso, tem “desapego pelo trabalho da imprensa”.

 

Mas a que trabalho da imprensa o colunista se refere? A qual imprensa o colunista se refere? Não pode ser outro senão aquele trabalho e aquela imprensa refletida pelo que afirmou em 2010, no auge do segundo governo Lula, Maria Judith Brito, então presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ) e executiva do grupo Folha de S. Paulo. Disse ela: A liberdade de imprensa é um bem maior que não deve ser limitado. A esse direito geral, o contraponto é sempre a questão da responsabilidade dos meios de comunicação e, obviamente, esses meios de comunicação estão fazendo de fato a posição oposicionista deste país, já que a oposição está profundamente fragilizada. E esse papel de oposição, de investigação, sem dúvida nenhuma incomoda sobremaneira o governo.

 

Então, atentem bem, quando o colunista de Praça Oito fala que Lula tem desapego pelo trabalho da imprensa, repudia o trabalho da imprensa, o ex-presidente deixa transparecer esse sentimento, faz esse juízo de valor da imprensa preconizada por de Maria Judith Brito.

 

Lula jamais repudiou ou repudia o jornalismo que busca a verdade, a informação legítima, para depois reportar com a maior fidelidade possível. Não há como fazer esse bom jornalismo se os grandes meios de comunicação nacionais e regionais, como A Gazeta, se orientam pela régua de Judith.

 

Mas vamos aguardar as próximas colunas de Praça Oito, para ver o malabarismo analítico que o titular da coluna fará para dar sustentação às supostas semelhanças entre Bolsonaro e Lula, e o enaltecimento do papel dos grandes grupos de mídia nacionais em defesa da democracia. Ei, Getúlio, ei JK, ei Jango… você leram isso?