EUA – Neoliberais gostam de ser chamados de “neodemocratas”

O escritor e jornalista liberal estadunidense Jonathan Chait fica muito chateado quando é chamado de "neoliberal". Insiste que essa palavra não tem sentido, e não descreve uma mudança política real ocorrida poucas décadas atrás. A constatação foi feita pelo comentarista político, advogado e blogueiro, também estadunidense, Matt Bruenig, num texto que publicou, em seu blog Politics, nesta quinta-feira (21) e reproduzido pelo portal Jacobin.

Fernando Henrique Cardoso

Jonathan Chait usa um disfarce que os brasileiros conhecem bem – aqui inúmeros tucanos (entre eles o cardeal emplumado Fernando Henrique Cardoso) também não aceitam a designação de neoliberal e, nos vários disfarces que usam, chegam a tentar usar a máscara de social-democratas, e mesmo de esquerda!

Nos EUA, muitos neoliberais referem-se a si próprios como neodemocratas, em referência ao partido onde a maior parte deles está, que abriga mesmo muitos setores da esquerda dos EUA – o Partido Democrata.

Matt Bruenig comenta ser um dos grandes paradoxos da linguagem o fato de que palavras de grande uso e difusão acabarem muitas vezes perdendo o sentido original devido ao uso excessivo. É o que pode ter ocorrido, diz , com a palavra "neoliberal", da mesma forma como outras, como "estrutural" ou "patriarcado" e outras semelhantes,

Ele sugere que o mais importante é que, mesmo deixando de lado a palavra "neoliberal", o principal argumento de Chait é que nada mudou no Partido Democrata, e que a esquerda mente ou delira quando diz que houve a mudança indicada por aquela. “O que é estranho nesse movimento é que os próprios democratas alegaram que estavam mudando”, diz. “Até se chamaram de "Novos democratas"., ou de "Neodemocratas", e mesmo de "neoliberais".

Talvez, comenta Bruenig, os autoproclamados “neodemocratas”, incluído Bill Clinton e Al Gore, entre outros, é que estariam mentindo sobre a mudança, “mas deve pelo menos ser levada a sério a proposição de que eles eram sinceros e, na verdade, pretendiam, como alegavam, deslocar o partido para o centro, para longe da esquerda”.

Bill Clinton, amigo dileto de Fernando Henrique Cardoso e um dos inspiradores do neoliberalismo tucano, é membro do “Conselho de Liderança Democrática”, e em sua campanha para a presidência da República dos EUA, certamente se colocou contra os antigos democratas. Em seu documento de 1991 intitulado "The New American Choice Resolutions" (Resolução Nova Escolha Americana), está essa palavra traquina novamente! E se coloca como uma novidadeira “terceira via”, distante da direita e da esquerda: “As velhas ideologias à direita e à esquerda já não são suficientes para realizar as aspirações do povo americano, e ambos os partidos políticos serão deixados para trás, a menos que apresentem novas respostas e novas instituições para uma nova era”.

Mas para muitos americanos, o Partido Democrata representou sempre o velho programa, que já não funciona, e defende interesses privados antes do interesse das pessoas comuns, internamente e no exterior.

As políticas do New Deal, aplicadas para enfrentar a grande crise da década de1930 e permitiram a união da classe média, já não controlam sua lealdade. E hoje o desafio para o Partido Democrata, diz Bruenig, é abandonar as ortodoxias do passado e defender um governo voltado para as demandas nacionais, que e não seja prisioneiro de estreitos interesses privados. Que seja um criador de oportunidades e não um obstáculo para elas. Ao contrário dos republicanos, é preciso –diz – acreditar no governo e fazê-lo funcionar na era da internet e da informação.

“O papel do governo é garantir a igualdade de oportunidades”, diz Bruenig. “A América não terá sucesso na era da informação se continuar a desperdiçar o potencial de milhões de cidadãos desfavorecidos”.

Defende que “a idéia de que os Novos Democratas (não os chamem de neoliberais!) representam uma ruptura com os velhos democratas, que se voltaram contra os interesses de sua base, não é particularmente radical. Na verdade, um cavalheiro com o nome de Jonathan Chait o disse há apenas cinco dias:

“Essa não é a abordagem que os democratas assumiram no cargo. Bill Clinton se apresentou como um ‘novo democrata’ mas irritou sua base ao declarar a era do governo grande”.

Grande para os ricos, para o 1% de renda mais elevada, e mínimo para o conjunto da população, poderia ter concluído Bruenig. Lá como cá, os governos neoliberais são os que favorecem aos ricos, contra a nação e o povo.