CUT/Vox: 60% dos trabalhadores reprovam “legalização do bico”

Em vigor desde o dia 11 de novembro, o contrato de trabalho intermitente, ou o chamado “bico”, uma das formas mais precárias de contratação prevista na nova Lei Trabalhista, é reprovado por 60% dos trabalhadores e trabalhadoras em todo o país, aponta a última rodada da pesquisa CUT/Vox, realizada entre os dias 9 e 12 de dezembro, e que entrevistou 2.000 pessoas, em 118 municípios de todos os estados e do Distrito Federal.

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Para 51% dos entrevistados, essa nova possibilidade de contrato de trabalho é boa somente para os patrões. A região em que os trabalhadores mais reprovam o contrato de trabalho intermitente é o Sudeste, com 68%, seguido pelo Nordeste, em que 65% disseram não aprovar.

A possibilidade de contratar um trabalhador por apenas alguns dias ou horas no mês – sem carteira assinada e nenhum direito trabalhista – tem alto índice de rejeição em todas as faixas de renda e escolaridade.

O contrato intermitente é reprovado por 64% dos que ganham de dois até cinco salários mínimos, seguidos por 62% dos que ganham até 2 salários mínimos (SM), e 51% da faixa de mais de 5 SM. Dos entrevistados que possuem ensino médio completo, 62% desaprovam, seguidos por 61% com ensino fundamental e 55% com ensino superior.

Para Graça Costa, secretária de Relações de Trabalho da CUT, esses números, apesar de altos, tendem a crescer, pois nem todos os trabalhadores e trabalhadoras têm o exato conhecimento do impacto e do alcance da precarização que o trabalho intermitente pode causar no mercado de trabalho.

“Essa reforma trabalhista, que legalizou a fraude e as formas precárias de contratação, é resultado de um projeto que estava engavetado na Câmara dos Deputados e eles aprovaram a ‘toque de caixa’ sem qualquer debate com a sociedade, então muitas perversidades, como o trabalho intermitente, não são de conhecimento ainda de todos”, explica.

Segundo Graça, em nenhum país do mundo a legislação trabalhista foi alterada em tão pouco tempo como ocorreu recentemente no Brasil. Ela lembra que, apenas três dias depois de aprovada a nova Lei Trabalhista, o governo encaminhou a Medida Provisória 808, com alterações à recém-aprovada lei e que hoje possui 967 emendas ao texto, um recorde histórico.

“Esse é apenas um exemplo de como este governo e seus aliados estão descompensados, perderam completamente a vergonha”, critica Graça.

Ela denuncia que a MP e as centenas de emendas podem “abrir a porteira para uma segunda reforma trabalhista, cuja dimensão é desconhecida do conjunto dos trabalhadores e trabalhadoras”. A maioria das emendas (142), segundo Graça, diz respeito ao trabalho intermitente.

“Não sabemos se isso é bom ou ruim”, diz a secretária de relações do Trabalho da CUT, ao esclarecer que a análise prévia das emendas feita pela assessoria técnica da Central já constatou que 200 delas têm origem na Confederação Nacional da Agricultura (CNA). “Pode ser um desastre maior ainda para a classe trabalhadora”, completa.

Resistência e luta contra a nova Lei Trabalhista

O presidente da CUT, Vagner Freitas, explica que, apesar do desmonte de direitos que representa a reforma e os ataques que ainda podem ocorrer, os sindicatos cutistas estão na luta para impedir que a nova Lei Trabalhista retire direitos consolidados e crie um mercado de trabalho baseado na “institucionalização do bico”.

“É possível resistirmos aos ataques e é o que estamos fazendo. A reforma trabalhista vai se concretizar na mesa de negociação e os nossos sindicatos estão resistindo”, explica o dirigente.

Vagner se refere às negociações coletivas acordadas pelos sindicatos, sobretudo no último período, quando a nova legislação entrou em vigor.

Segundo levantamento do Dieese, do total de 366 reajustes analisados no segundo semestre deste ano, 221 ficaram acima da inflação, 109 conseguiram apenas a reposição do índice inflacionário, e somente 36 ficaram abaixo. “Esse resultado é fruto da resistência organizada dos trabalhadores e trabalhadoras nos seus sindicatos”, reforça Vagner.

Outro exemplo de resistência citado pelo presidente da CUT é a batalha jurídica em torno de pontos inconstitucionais da nova Lei Trabalhista. “Nós vamos disputar em todas as frentes e provar que o desmonte trabalhista fere direitos consagrados na Constituição e nas Convenções Internacionais sobre o mundo do trabalho.”

A fala de Vagner vai ao encontro da análise feita por diversos especialistas do Direito e da recente declaração da nova presidente do TRT-4, a desembargadora Vânia Cunha Mattos, que, ao assumir o comando, declarou: “a Constituição de 1988 introduziu um sistema de garantias e direitos individuais e sociais, com primazia dos valores imanentes ao trabalho. E sob esse prisma será interpretada a nova legislação, para que não se restabeleçam práticas de dominação em que o capital seja capaz de predominar sobre o trabalho, ou que sistemas muito próximos da escravidão sejam tolerados.”

Quem votou, não volta!

Tanto o presidente da CUT, Vagner Freitas, quanto a secretária de Relações do Trabalho, Graça Costa, resgataram a última pesquisa da CUT/Vox, realizada entre os dias 27 e 31 de outubro, que mostra a rejeição dos trabalhadores brasileiros aos parlamentares que votaram a favor do fim da CLT, para ressaltar a importância de os trabalhadores continuarem mobilizados durante o recesso parlamentar.

Segundo a pesquisa, 79% dos trabalhadores não votarão em deputados que aprovaram a reforma trabalhista.

“Este é o momento em que os deputados retornam para os seus estados e visitam suas bases eleitorais, por isso é fundamental nos mantermos organizados nos estados neste período, principalmente porque ano que vem é um ano eleitoral e já avisamos que ‘quem votar, não vota’”, alertam os dirigentes, em referência tanto à reforma trabalhista quanto à da Previdência, que ainda tramita na Câmara dos Deputados e não foi colocada em votação por falta de votos.