Marun relatará CPMI da JBS; escolha gera desistência de membros

Fiel escudeiro de Michel Temer, o deputado Carlos Marun (PMDB-MS) foi o escolhido para relatar a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga possíveis irregularidades nas operações entre o grupo J&F, controlador da JBS, e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Após decisão, os senadores Otto Alencar (PSD-BA) e Ricardo Ferraço (PSDB-ES) decidiram deixar o colegiado.

Marun - Billy Boss/Agência Câmara

“Dentro desta CPMI chapa-branca, estou pedindo a retirada do meu nome para não participar dessa farsa”, afirmou Alencar. O parlamentar disse ainda que o encontro de Ataídes Oliveira (PSDB-TO), presidente do colegiado, com o presidente da República, Michel Temer, no sábado (9), enfraquecia a condução dos trabalhos da CPMI.

Marun, no entanto, afirmou ter independência para o exercício da função. “Sei que a minha indicação desagradou alguns membros da CPMI e do Parlamento. Isso não me causa surpresa. A política tem dois lados e um muro. Sempre fiz questão de ter um lado”, disse ao assumir a relatoria.

O líder do PSol, deputado Glauber Braga (RJ), pediu, em vão, para a escolha de Marun ser reconsiderada. O parlamentar queria evitar que a CPMI fosse “transformada em quartel general de blindagem de Temer”.

Para tentar diminuir a influência do peemedebista na relatoria, Ataídes Oliveira nomeou dois sub-relatores. O deputado delegado Francischini (SD-PR) assumirá a sub-relatoria de contratos da JBS, que também tratará da delação do grupo, e o deputado Hugo Leal (PSB-RJ) ficará com a sub-relatoria de assuntos fiscais, previdenciários e agropecuários.

Criada em maio para investigar as operações da J&F com o BNDES ocorridas entre os anos de 2007 e 2016, a comissão só foi instalada depois que a Procuradoria Geral da República anunciou que revisaria as delações da JBS por suspeita de omissão de informações. Os depoimentos de Joesley Batista, um dos donos do grupo, e de executivos da empresa embasaram a denúncia contra o presidente Temer por corrupção passiva, que foi barrada pela Câmara em agosto.

Novas regras

Nos bastidores, os rumores são de que a CPMI deve se transformar em palco de vingança contra os delatores Joesley Batista e Ricardo Saud, e também contra o ex-procurador Marcelo Miller e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que denunciou diversos deputados e senadores agora ansiosos para “dar o troco”. Um fato novo dá força a esse discurso: a comissão passou agora a ter poderes além das habituais prerrogativas de quebra de sigilos e convocações.

Os parlamentares também poderão solicitar ao juiz competente medidas cautelares contra pessoas suspeitas, incluindo prisões e apreensões. O trecho foi incluído na lei há apenas nove meses, e foi proposto em 1996 pelo senador mato-grossense Júlio Campos, do antigo PFL, hoje DEM. A tramitação, que levou 20 anos, já teve como relator o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), preso em Curitiba, que se manifestou favorável à proposta. A lei vigente até o ano passado sobre CPMIs era de 1952, ainda do governo Getúlio Vargas.

Governistas dizem querer uma ação cautelosa na comissão, mas admitem que ela servirá a seus interesses: tentar fazer com que as investigações da reviravolta no caso JBS sejam efetivas. Temer tem alegado que Janot não tem a independência necessária para tocar investigações no Ministério Público. Nesse cenário, o próprio anúncio de uma provável revisão do acordo com os delatores é visto como um ato preventivo de Janot para que a sucessora, Raquel Dodge, não abra sindicância e faça apurações mais rigorosas que possam complicar o procurador.

Antes mesmo da escolha do relator, a CPMI já havia recebido 100 requerimentos, especialmente de convocação de Joesley e Saud, e de autoridades, como Janot, o ex-procurador Marcello Miller, a ex-presidente Dilma Rousseff, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os ex-ministros da Fazenda Antônio Palocci e Guido Mantega.

Parlamentares solicitaram ainda convocações para o operador e delator Lúcio Funaro e o ex-deputado Eduardo Cunha. Também estão na lista o presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro, e os antecessores Luciano Coutinho, Maria Silvia Bastos Marques e Demian Focca.